Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero

Cartografia e Cidade dos Renascimento e
Barroco Íbero-Americanos
Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
Universidade de São Paulo
Prof. Dr. João Grandino Rodas (Reitor)
Prof. Dr. Hélio Nogueira da Cruz (Vice-Reitor)
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
Prof. Dr. Marcelo de Andrade Roméro (Diretor)
Profa. Dra. Maria Cristina da Silva Leme (Vice-Diretora)
Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
T692
Curadoria e organização Dina Elisabete Uliana, Fellipe de Andrade
Abreu e Lima e José Luiz Mota Menezes. São Paulo: FAUUSP, 2013.
135p. il. (Catálogo de Exposição)
ISBN
1. Arquitetura (Teoria) – Século 15; Século 16; Século 17.
I. Abreu e Lima, Fellipe de Andrade II. Menezes, José Luiz Mota
III. Uliana, Dina Elisabete
CDD 720.1
Curadoria e Organização da Exposição
Dina Elisabete Uliana
Fellipe de Andrade Abreu Lima
José Muiz Mota Menezes
Organização do Catálogo
Dina Elisabete Uliana
Fellipe de Andrade Abreu Lima
José Muiz Mota Menezes
Projeto Gráfico e Capa
José Tadeu de Azevedo Maia
Impressão
André Luis Ferreira
Silk screen
Sidney Lanzarotto
Produção Gráfica
Laboratório de Programação Gráfica (LPG)
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
Universidade de São Paulo
Fevereiro de 2013
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Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo - FAUUSP
Cartografia e Cidade dos Renascimento e
Barroco Íbero-Americanos
________________________________________
Dina Elisabete Uliana
Fellipe de Andrade Abreu e Lima / José Luiz Mota Menezes
Curadoria e Organização
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Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
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Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo - FAUUSP
Sumário
Apresentação – Dina Elisabete Uliana
________________________________________________________________________7
Prólogo – Fellipe de Andrade Abreu e Lima
________________________________________________________________________9
Textos
Dois Lados do Mundo - Duas Culturas – Por José Luiz Mota Menezes
_______________________________________________________________________13
‘La imagen de la ciudad mediterránea’ - La tipología de la imagen de la ciudad
mediterránea – Por Fernando Marías
_______________________________________________________________________ 23
O Patrimônio Cartográfico Português e a Proposta para a Capital do V Império –
Por Fellipe de Andrade Abreu e Lima
_______________________________________________________________________ 39
La ville (idéale?) chez Alberti – Por Michel Paoli
_______________________________________________________________________ 53
Sobre a Cidade Ideal de Leon Battista Alberti aos olhos de um Humanista chamado
Michel Paoli – Por Fellipe de Andrade Abreu e Lima
_______________________________________________________________________63
A Cidade (ideal) de Leon Battista Alberti
Michel Paoli – Por Michel Paoli
_______________________________________________________________________65
Don García de Silva y Figueroa y la Percepción del Oriente: La “Descripción de Goa”
– Por Fernando Marías
_______________________________________________________________________77
Architecture as Metaphor – Por Joseph Rykwert
_______________________________________________________________________95
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Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
Em Nobre Homenagem
ao Professor e Arquiteto
Sylvio Barros Sawaya
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Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo - FAUUSP
Apresentação
Uma exposição de livros raros sempre é uma oportunidade de conhecer com mais detalhes o
acervo de uma biblioteca ou de um colecionador.
A exposição que a Biblioteca da FAUUSP apresenta traz um pouco desses dois mundos: livros de
nosso acervo de obras raras em diálogo com livros pertencentes ao organizador e curador Fellipe
de Andrade Abreu e Lima, que tem uma característica cada vez mais difícil de encontrar entre nós,
que é a paixão por livros antigos.
Numa era em que muitos acham que as coleções impressas podem ser substituídas pelos acervos
digitais, é uma alegria constatar que essa paixão pelo objeto livro não desapareceu. Hoje muitos se
“esquecem” que ler um livro não se limita a um ato intelectual, mas que também é o momento de
se explorar as experiências sensoriais do toque, do cheiro, do peso...
Aqueles que se contentam com a imagem projetada na tela do computador por certo ainda não
tiveram a chance de folhear um livro raro e observar suas ilustrações, os tipos usados para compor
o texto, os entalhes em uma capa de couro, e de tomar consciência que aquele objeto foi feito
talvez séculos antes de seu nascimento. O livro raro nos traz de imediato essa consciência do
passar do tempo, pois estamos diante de algo que existia muito antes de nós e que, com sorte, irá
existir para muito além de nós.
Esse momento se torna mais completo com a participação dos professores Felipe Pereda,
Fernando Marías, Frédérique Lemerle, Michel Paoli e Yves Pauwels, que autorizaram a
reprodução de seus textos para nosso catálogo, que inclui ainda um de autoria do próprio
organizador Fellipe de Andrade Abreu e Lima.
Convidamos a todos a conhecer essa coleção de Tratados de Arquitetura e esperamos que possam
aproveitar essa exposição e descobrir nessas obras raras os mesmos encantos e belezas que
atraíram o olhar de seu colecionador.
Dina Elisabete Uliana
Diretora
Biblioteca da FAUUSP
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Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
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Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo - FAUUSP
Prólogo
Por Fellipe de Andrade Abreu e Lima, Prof. Dr. Arquiteto
Preciosos leirores, esse catálogo apresenta uma série de ensaios sobre cidades e cartografia de
origem portuguesa e espanhola, ou melhor, íbero-americas. Herdeiros que somos de muitas
culturas, desde os nativos desde continente, os invasores colonisadores, os orientais e africanos,
graças em parte à coloniação européia, devemos nos comportar como carro de frente de um
proceso histórico. Como tal, debemos planejar o futuro como se fóssemos a capital de um mundo
novo; fruto de velhas e antigas culturas, mas propondo novos olhares sobre o advir.
É nesse sentido que FAUUSP instaurou uma rotina de exposições sobre as doutrinas da
arquitetura e das artes, e nesse ano de 2013, continua ese process com esta exposição sobre o
tema ‘cidade e cartografia’. Desde 2010 que a diretoria da FAUUSP e de sua biblioteca iniciaram
este proceso cumprindo sua função social de abarcar a extensão universitária, além das pesquisa e
ensino, formando o tripé universitário e reafirmando a proeminência desta Faculdade de
Arquitetura e Urbanismo no Brasil e no mundo. Essa feliz rotina de publicações anuais, junto às
exposições, cumpre a nobre função de difundir uma seleção de textos de difícil acesso aos
estudantes e pesquisadores em geral, já que muitos dos que aquí estão sendo difundidos constam
de edições limitadas feitas por especialistas na teoria da arquitetura na Europa, especialmente na
França, na Espanha e Inglaterra, ou mesmo inéditos, como é o caso do texto do Professor Michel
Paoli sobre a concepção de cidade em Leon Battista Alberti e o de José Luiz Mota Menezes.
Com o exposto, apresentamos nesse volume de tiragem limitada, mas acessível a todos os
interessados, a versão original do texto do Emérito Professor José Luiz Mota Menezes, Dois Lados
do Mundo – Duas Culturas, com participação ativa e prioritária na exposição que acompanha ese
volume. O texto ricamente ilustrado contrapõe os modelos da cidade espanhola ao modelo
portugués nas Américas, sem criticá-los, mas ressaltando as características de cada um, criando
elos aparentemente invisíveis, mas muito fortes, entre a cultura de um povo e a representação
urbana. O segundo texto é de autoria do Professor Fernando Marías da Universidad Autónoma
de Madrid - ‘La imagen de la ciudad mediterránea’ - La tipología de la imagen de la ciudad mediterránea, no
qual o autor faz uma importante descrição das cidades sob uma rica perspectiva metodológica,
considerando ainda os auspícius do uso da iconografia para o estudo historiográfico das cidades,
da arquitetura e das transformações urbanas. O uso destas novas fontes levantadas pelo Professor
Fernando Marías – literatura, planos de cidades ideais, pintura, poesia, dentre outras – para a
arquitetura e suas áreas afins tomaram uma força enorme nesse início do século XXI. Esses
‘testemunhos do passado’ – termo usado pelo autor em questão – apresentam uma característica
fundamental: uma liberdade sem controle rígido daquilo que é a realidade construída. Portanto, a
veracidade da fonte não significa a veracidade da matéria no mundo, mas seu estudo nos sucita
um questionamento sobre as dimensões ‘emblemática’ e ‘alegórica’, numa rediscussão profunda
sobre as realidades material e imaterial, fato que pode nos conduzir a novos olhares sobre o
passado, o presente e o futuro, já que o desejo não era o de representar a cidade real, mas projetála em potência ou em desejo.
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Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
O terceiro texto, ‘O Patrimônio Cartográfico Português e a Proposta para a Capital do V Império’, de
autoria do Professor Fellipe de Andrade Abreu e Lima disserta sobre o imaginário português e o
sebastianismo, tecendo uma relação sutil entre a cartografia como ciência e patrimônio de
Portugal e as descobertas de além-mar. Sob forte influência dos pensamentos de Agostinho da
Silva e de Sylvio Barros Sawaya, o autor que vos escreve como releitura das profecias de Gonçalo
Bandarra, do texto bíblioco e mítico do profeta Daniel, objetivando uma indução ao projeto de
capital do Império Português proposto por Francisco de Holanda para Lisboa inspirado, talvez,
no mito da Roma caput mundi. O quarto texto se apresenta em francês, de autoria do Professor
Michel Paoli – La ville (idéale?) chez Alberti. O Professor Michel Paoli, da Université de PicardieJules Verne, faz uma profunda análise de aspectos fundamentais na concepção de cidade de Leon
Battista Alberti, sendo uma base epistemológica primordial aos arquitetos e pensadores da cidade
dos séculos XV, XVI e XVII. A inserção desse texto e a sua tradução justificam-se por essa razão,
já que os teóricos da arquitetura e da cidade do Renascimento italiano do século XV são as fontes
basilares do pensamento urbano dos séculos seguintes e Leon Battista Alberti, seu expoente
máximo. Nesse contexto, o quinto texto – A Cidade (ideal) de Alberti – é uma tradução
despretenciosa para o português do texto anterior, precedido por uma pequena apresentação com
o título ‘Sobre a Cidade Ideal de Leon Battista Alberti aos olhos de um Humanista chamado Michel Paoli’, que
tenta aproximar o leitor das metodologias e sutilezas do texto.
O sexto texto é também de autoria de Fernando Marías – Don García de Silva y Figueroa y la
Percepción del Oriente: La “Descripción de Goa” – que apresenta-se como fonte primordial para o
estudo das urbanizações no oriente no período das expanções coloniais sob as ordens de El Rey
Filipe III de Espanha. É nesse momento que deve se abrir uma nova discussão sobre o mundo
colonial, desta vez tomando como referencia as Ordenações Manuelinas, Afonsianas e Filipinas. A
rica ilustração e uso das fontes primárias nesse texto servem de modelo aos futuros estudos sobre
urbanização colonial em todo o mundo. O papel de Don García de Silva y Figueroa foi primordial
para as colônias no oriente extremo para o mundo Ibérico – Portugal e Espanha parecem ter
dominado as Américas e o golfo do Oceano Índico. De Macau a Goa, da China à Índia, do Japão
ao Irã, das Antilhas à África, muitas cidades coloniais das coroas Portuguesa e Espanhola criaram
uma grande globalisação que chegou a todas as nossas culturas.
Por fim, o último texto é de autoria de Joseph Rykwert. Sob título ‘Architecture as Metaphor’, o
presente ensaio foi especialmente escrito para a edição do livo ‘Regra, Ordem, Invenção’ –
FAUUSP, 2010. Considerando a raridade do volume, concebido como edição de luxo para
distribuição comemorativa da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São
Paulo, este ensaio mereceu uma difusão mais ampla. Este emérito professor demonstra nesse
texto uma primorosa relação entre os cinco sentidos e as cinco ordens arquitetônicas, sugerindo
que a arquitetura é uma projeto humano, uma relação do ser humano com o meio: uma metáfora.
Agradecemos enormemente a todos os autores a permissão e a escrita dos textos para ese
catálogo em formato de livo. Mantivemos ao máximo a formatação dos originais, apesar de que
pequenas alterações foram necessárias para manter uma unidade do todo e para favorecer a
unidade editorial desse catálogo. A grande discussão sobre os quase seis séculos que nos separam
dos primeiros tratados do Renascimento são, em verdade, um elo de ligação entre nós e o pasado;
da mesma forma que o Atlântico, o Índico e o Pacífico não foram obstáculos, mas pontes de
agua, caminhos, desafios, que deveriam ser ultrapassados para dar sentido à tragetória humana.
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Agradecemos especialmente ao Professor Sylvio Barros Sawaya, a quem dedicamos esse catálogo,
ao Diretor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, Professor
Marcelo de Andrade Romero, e à Sra. Dina Elisabete Uliana, brilhante diretora da Biblioteca da
FAUUSP, que sempre observa o futuro com zelo e primor, trabalhando para o bem coletivo, a
preservação do acervo da FAUUSP e a divulgação do conhecimento. Graças a Dina Uliana, com
perspicaz percepção e sensibilidade, esses catálogos e exposições tornaram-se possíveis. Mas há
ainda um especial arquiteto que merece ser citado: José tadeu de Azevedo Maia. Não há palabras
para citar alguém de é indescritível. Esse arquiteto me ensinou o que importa: o respeito às
pessoas, só assim a arquitetura pode existir e ser boa.
Fellipe de Andrade Abreu e Lima
Sorocaba, 1 de fevereiro de 2013.
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Dois Lados do Mundo – Duas Culturas
José Luiz Mota Menezes, Arquiteto – [email protected]
Professor Doutor em Arquitetura – Universidade Federal de Pernambuco
Primeiras Palavras
De uma península mais a Oeste da Europa, ao final do século XV, partiram navegantes na busca
de um novo caminho para as Índias. Depois, todos seguiram na direção de um novo mundo que
de início pequeno se tornou grandioso. Por mais que navegassem não se chegava ao fim.
Contornando ou descendo pelo outro lado a imensa terra ao sul e ao Norte do Equador iam se
descobrindo outras gentes e os lugares se mostravam diferentes aos incansáveis navegadores. Da
especulação se passou para a conquista desses territórios, uma vez que neles havia donos bem
diferentes daqueles da Velha Europa.
Portugal e Espanha dividiram o Novo Mundo descoberto sob protesto dos demais reinos da
Europa. Uma linha foi traçada e ela mudou de lugar várias vezes. Eram as gentes de Portugal e de
Espanha que iam conquistando, ora dizimando, populações e demarcando as posses. Na Europa
duas culturas diferentes, Portugal e Espanha, ora se aproximavam outras vezes estavam distantes.
De espaço a espaço cidades, vilas e povoações marcavam a posse dos territórios e a presença de
sua cultura ou aculturação das neles existentes.
No começo de tudo na Nova Terra somente era a guerra da conquista ou conversão de índios,
depois veio à apropriação do espaço e a inclusão cultural. Dos dois lados daquela península ibérica
essas culturas se transferiam quer para lugares acima do equador ou nos dois lados do grande
continente ao Sul da linha demarcadora, a de Tordesilhas. Entre as duas costas de mar dominava
uma cordilheira – a dos Andes.
Não podemos ignorar determinado tempo histórico dessa conquista no além-mar o da União
Ibérica, esta permitiu o desinteresse por tal Linha Divisória e a reformulação depois dos limites
entre a Espanha da América latina e o Brasil português. Um período de mais de sessenta anos
pouco estudado no Brasil. No entanto, fase artística de muito interesse para o Brasil, então se
firmando na produção do açúcar no Nordeste em Pernambuco e com o Governo Geral na Bahia.
Nas Américas não nos direcionaremos para aquela ao Norte e sim no sentido da Central e do Sul
de tão grande território. Nessas partes do Sul dominaram os espanhóis a Oeste e os lusitanos no
Leste desde o século XVI até quando ocorreram as independências. A cultura artística colonial da
América espanhola, apesar de ter sua origem na mesma Europa, tem diferenças daquela que se
instalou na América Portuguesa. Este o tema principal de nossa comunicação.
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Capitanias Hereditárias – Demarcação – Chancelaria do Rei D. João III
O Estado da Arte na Península Ibérica
No princípio estavam todos juntos. Na península ibérica em um tempo ora distante separaram-se
a gente de Castela daquela do Condado de Portugal. No século XVI ambos os lugares refletiram
as novidades vindas da Itália, onde renascia o gosto pela antiguidade clássica demarcada pela
literatura e arte, onde se incluíam também as formas da arquitetura. Quer na Espanha ou em
Portugal o Renascimento, à luz de uma concepção espacial, representava mais uma maneira do
que uma forma de perceber a filosofia expressa tão bem por um Leon Baptista Alberti e delineada
por um Bruneleschi ou em termos esperimental-filosófico por Leonardo de Vinci. Quer Espanha
ou Portugal releram e recriaram uma nova maneira de escrever as linhas daquela Renascença. Há
quem diga nunca ter de fato existido tal diretriz artística nos termos de sua concepção na Itália e
sim ocorrera uma recriação daquele pensamento por meio de novas concepções dos artistas locais
e dos arquitetos. Do Renascimento se passou para o que se entende por Barroco e também tal
linguagem determinou-se por uma estrutura de certo modo fiel ao que seria geral enquanto
concepção e particular em cada um dos dois lugares referidos. Há um Renascimento e um
Barroco em Portugal e outro na Espanha que se distinguem perfeitamente quanto a sua
concepção espacial e nos ornamentos que alteraram aqueles modelos vindos pelos vários meios
de comunicação da península itálica. São os artistas de cada um dos reinos que refizeram modelos
que passaram a valer no que se relaciona com a transferência da Itália de tais movimentos
artísticos.
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Capela de Bom Jesus de Valverde Portugal
Em Portugal poucos exemplos na arquitetura daquela espacialidade identificada com as formas
geométricas puras. Um deles, oculto no interior de uma edificação é a capela de Bom Jesus de
Valverde, em ao Sul do reino. Na Espanha se passa de um Gótico final para um Maneirismo
Plateresco, onde a nota maior não é definida pela concepção espacial, nem por meio do purismo
da forma geométrica, mas com uma aplicação de uma decorativa vinculada àquela empregada
pelos ourives. Ocorreu em Espanha um Renascimento, mas basicamente na Filosofia e na
Literatura. A Universidade de Salamanca foi o esteio daquele humanismo da Itália.
Sobre as Cidades nas Américas do sul e Central
Com relação ao urbano pode-se dizer que em Portugal nada se fez com vistas à cidade regular ou
centrada em filosofias atreladas a uma interpretação do teórico romano Vitrúvio, cujos
manuscritos estavam no século XV e seguinte sendo traduzidos na Espanha e em Portugal.
Enquanto em Portugal quase nada se materializou em termos de cidade regular, na Espanha com
as Leis das Índias se definiu no desenho da cidade que segue para o Novo Mundo um traçado
regular. Traçado que se concebe desde uma Praça Maior, a das Armas, no qual se percebe
claramente forte presença de uma concepção central urbana definida pelos que reinterpretaram
aquele mesmo teórico. A Praça Maior era geralmente unitária em seu desenho por conta de ser
obra de um mesmo arquiteto a sua concepção e construção. Ao redor da praça um espaço
protegido e demarcado por arcadas lhe dá forma singular e bela. Dela surgem as ruas que definem
um plano contínuo, na sua definição filosófica regular e que seria inclusive indefinido em suas
dimensões, crescendo ao sabor das necessidades. A praça e sua estética marcam o orgulho e o
esplendor de um Império forte. De uma Legislação partem os arquitetos para a definição da
forma da cidade segundo uma dominante administrativa onde as leis marcam os parâmetros da
apropriação do espaço. Primeiro a legislação depois a disposição do poder que se encontra situado
junto e ao redor do centro das decisões em tal praça central. A associação de tais determinante faz
a diferença fundamental naquele tempo histórico entre os dois lugares colonizados.1
1
As Leis das Índias, na Espanha, determinou a maneira de se apropriar o espaço na definição do plano urbano
das vilas e cidades coloniais da América espanhola. Uma grande praça (a das armas) e ao seu redor, configurando
o vazio, em símbolos claros estão: o poder constituído representado pelos edifícios da Igreja Catedral do Palácio e
de outros. Em certos casos uma galeria envolve a praça garantindo o circular livre do sol.
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Praça Maior de Madrid - Espanha
A modernidade das cidades da América Latina espanhola é digna de nota. No Novo Mundo,
passando literalmente por cima de tudo quanto encontrou em termos de assentamentos urbanos
anteriores os conquistadores instalaram sua cultura usando as determinações das Leis das Índias.
Hoje a Arqueologia urbana vem descobrindo em vários lugares daquela América feitos singulares
onde se percebe certos aproveitamentos quanto às edificações antigas, no entanto, o cerne da
cidade permanecia alheio ao que existia e o construído é fiel à visão grandiosa, monumental, de
uma Espanha que se distinguia na Europa por impor sua maneira de ser forte e poderosa.
Com relação ao mundo português de além-mar, a natureza da civilização indígena deu margem a
que de aldeias e cidades lusitanas viessem desenho como que de memória para as fundações que
se fizeram. Há certo ar de um resto medievalismo em certas fundações mais antigas e somente na
regularidade de algumas de fundações bem avançadas no tempo histórico, no final do século XVI
e inícios do seguinte quais os exemplos da cidade do Paraíba, atual João Pessoa, e a de São Luiz
do Maranhão2. A escolha pela altura, onde tal bipolaridade se dava pela escolha do porto e da sede
identifica nessas fundações a preocupação pela defesa fundamentada em princípios ainda da Idade
Média. Em Salvador uma praça maior ainda existe, mas com disposição que se afasta muita
daquela da existente no mundo hispânico de além-mar.
Duas cidades podem ser comparadas diante do feito de datarem ambas suas fundações do século
XVI nas duas Américas. Olinda e México. A apropriação do espaço nos dois assentamentos
urbanos tem características bem diferentes, apesar de ambas se situarem em um mesmo tempo
histórico. Olinda tem seu plano inicial e que permaneceu sem alterações substanciais até hoje
fundamentado em princípios que fogem àqueles das cidades centrais defendidas pelas teorias
urbanas que reinterpretaram os princípios de Vitrúvio. A Cidade do México, cujo desenho é
nitidamente espanhol ressentiu-se na sua implantação da cidade antes existente e de origem
indígena. Olinda é assente segundo a memória da cidade portuguesa ainda de plano irregular. A
Cidade do México se desenvolve desde uma Praça de Armas e tem seu desenho em quadras
regulares à maneira das diretrizes espanholas das Leis das Índias.
2
Plano de responsabilidade do engenheiro militar Francisco Frias de Mesquita, no princípio do século XVII.
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México – Praça Maior
Outro exemplo marcante e datado de c. 1540 é a Cidade de Sucre, a antiga La Plata, no Chile. O
singular é a escolha do sítio uma área em declive e nem por isto se deixa de aplicar no traçado as
diretrizes das leis das índias. A praça maior é pequena e corresponde a uma das quadras das
definidas para o desenvolvimento urbano da cidade. Mais ao Sul temos a Cidade de La Plata,
criada em 1882 cujo traçado se inspira nas cidades teóricas italianas derivadas de uma
reinterpretação de Giorgio Vasari de Vitrúvio e, ainda, de uma forte influência daquelas existentes
na America Latinas espanholas e fiéis às Leis das Índias.
No Brasil somente e de forma bem simplificada se percebe a presença das determinações legais
do documento espanhol e mesmo quando da União Ibérica e sem a sistematização desejada e sim
uma releitura distante das idéias presentes naquele documento espanhol. Nessa colônia
portuguesa se percebe tal feito na cidade da Paraíba e em São Luiz do Maranhão. De certo modo
na Praça de Salvador talvez determinada depois de 1581 a praça de armas se define parcialmente.
Haja vista que o engenheiro Luís Dias não determinou todo o plano de uma vez e ele foi
modificado depois. Parece-nos que as determinações existentes nas Leis das índias para as cidades
novas quando da União Ibérica não foram aplicadas no Brasil. Olinda, de 1535/37 tem seu
traçado decorrente da escolha do lugar, associado às determinações administrativas que deixa
lugar a que o local indique a melhor forma de desenho da praça principal da Vila diante da Igreja
matriz e junto á Torre de Menagem e Casa da Câmara e o açougue. A não escolha de uma área
cuja superfície seja sem elevações, fiel a um sistema de defesa ainda de teor medieval deve ter
produzido o resultado que hoje se percebe na formação do desenho urbano dessa cidade.3
A organização urbana de Olinda pode ser percebida bem diferente daquele da cidade do México
que adotou a regularidade de praça e quadras que caracteriza outros assentamentos urbanos da
América espanhola. A União Ibérica dura sessenta anos, no entanto sua presença na América
lusitana é quase inexistente enquanto determinações legais que poderiam ter existido no design
dos planos das cidades.
3 Não é somente Olinda que segue tal determinação do plano segundo a defesa pela altura, o Rio de Janeiro, no
Morro do Castelo e Salvador com a cidade alta e baixa. Além de outras. São Luís do Maranhão, apesar da
presença de uma praça de armas se encontra esta situada em altura em relação ao mar e ao porto.
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Olinda – Gravura holandesa c. 1630 - detalhe
Igrejas e Outras Edificações – Interiores e Exteriores
A presença de Portugal e da Espanha enquanto conquistadores do Novo Mundo implica uma
análise mais vasta e com características quase impossíveis de chegar a alguma conclusão esta nos
parece alheia a nossa comunicação. Um período nos interessa de perto o da União Ibérica. De
1580 a 1640 Portugal e Espanha estavam sob um mesmo rei. As condições da sucessão de D.
Sebastião levaram a tal situação política administrativa. No campo da cultura e particularmente da
arte e da arquitetura pouco se disse até o presente momento. Há um silêncio de interesse e mais
ainda certo resguardo quanto às conclusões. Considerando a presença portuguesa na capitania de
Pernambuco e na relacionada com o Governo Geral na Bahia, foi o período considerado o da
presença das ordens religiosas e da construção de suas casas em caráter permanente. Haja vista em
Pernambuco a presença dos jesuítas em 1550, e os carmelitas e franciscanos no final do século
XVI. Na América espanhola também assim se fizeram as ordens religiosas nas diversas cidades
fundadas. Do final do século XVI é o enorme mole da casa dos jesuítas de Olinda e do mesmo
final de século e começos do seguinte as casas dos carmelitas e franciscanos na mesma Vila. O
que identifica as duas construções a jesuíta e a carmelitana é a monumentalidade das obras diante
de uma pequena vila de pouco mais de duas mil almas.
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Os dois edifícios assinalados estavam bem identificados com um modelo monumental que parece
vir de Espanha para Portugal à época de Felipe II e talvez seja entendido como uma maneira de se
mostrar ao mundo a grandiosidade do Reino espanhol. Opinião que externa o historiador
Soromenho quando se refere à igreja e convento de São Vicente de Fora em Lisboa, de autoria de
Felipe Terzi, uma vez que igreja e convento projetados e construídos se destacavam no perfil da
cidade de maneira monumental, “alardeando a emanação da forte vontade política que a tornava
possível. Na cúpula, organismo inédito no panorama de Lisboa, desenhava-se uma superioridade
tecnológica desconhecida ao mesmo tempo em que, na originalíssima composição da fachada se
evidenciava a monumentalidade requerida a uma igreja de patrocínio régio, onde a nota maior de
originalidade era dada pelo modo de inscrição das torres na fachada”.
Naquela Olinda sob domínio espanhol desde 1580 a inspiração de Francisco Dias com relação ao
Colégio cujo projeto é a ele atribuído deveria seguir as diretrizes de Terzi que então conheceu nas
obras de São Roque na mesma cidade de Lisboa. A edificação carmelita tem autoria desconhecida,
mas segue o mesmo padrão de Espanha, inclusive na sua fachada á maneira retabular, semelhante
a muitas da América espanhola, e que infelizmente ficou inconclusa. Aproximações e
distanciamentos singulares na arte e na arquitetura das duas Américas. Monumentalidade que é no
caso de Olinda está prejudicada à luz da ausência de uma praça maior ou de largos grandiosos que
ressaltavam o valor da igreja no contexto político urbano da cidade espanhola. Em Olinda ainda
se percebe tal forma de ver a igreja em relação a cidade pelo local onde ela se encontrava em altura
com respeito ao restante da vila.
O Mosteiro do Escorial - Espanha
A maior diferença entre a duas Américas vão ser sentidas no trato da decoração interior.
Enquanto dominava o arquiteto Herrera na Espanha e Baltazar em Portugal a linguagem
Maneirista os identificou e a arquitetura e os interiores falaram uma linguagem de pequenas
variantes quer aquela do imenso Mosteiro do Escorial ou a das casas dos jesuítas em Portugal, por
exemplo. No momento em que surgem as linhas dominantes do Barroco, longe daquele
determinismo da União Ibérica o distanciamento entre os reinos idades deixa aparecer bem a
riqueza ornamental de ambos as culturas. Riqueza que é visível na exuberância dos retábulos
concebidos de maneira quer equilibrada em termos de composição, como se fez e Portugal e no
Brasil português, ou com uma composição exageradamente ornamentada e desconstruída que
identifica aqueles retábulos e interiores da América espanhola.
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Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
Uma monumentalidade bem em acordo com a alma da Espanha grandiosa e que se lança para
cima em busca do infinito, símbolo de um estado que era forte. A gente lusitana é mais telúrica e
apegada a uma colonização que não nos parece espelhar tal simbologia de conquista e força. O
forte do lusitano está no modo civilizador, bem aproximado da gente da terra e que toma por
princípio o respeito ao outro, à luz do legado franciscanos no trato com o índio este defendido
também pela Companhia de Jesus. A conquista do espaço territorial não foi pela força e sim pela
persuasão. A arquitetura enquanto reflexo do social espelhará tais diferenças que somente se
aproximam no período histórico da União Ibérica. Neste tempo em Olinda as construções serão
monumentais e em uma escala que nada tem a ver com a dimensão numérica dos habitantes.
Também diferentes serão os estilos que se percebem nas composições arquitetônicas em
dimensão nos espaços interiores nos dos lados da América. As matrizes iniciais para tais
edificações no tempo do Maneirismo serão aquelas vindas da Itália e relidas na península ibérica
pelos artistas dos dois reinos. Não existirão nesse Maneirismo tantas diferenças. Elas vão surgir e
fortes quando a liberdade de composição se instalar nas duas partes consideradas e na
oportunidade do Barroco.
Portugal no Brasil com relação ao Barroco manterá certa sobriedade no exterior e no interior com
relação à composição regular e vincada em linhas claramente encontradas definidoras dos traços
gerais da composição. Enquanto isto, talvez pela forte presença de um Churriguera e seus
discípulos na América espanhola, a desconstrução de tal regularidade se faz de maneira quase que
onírica. Em certos interiores, essencialmente nos retábulos de altar, a clareza desejada da
composição, mesmo considerando o Barroco e se perde diante da multidão de ornatos e registros
que se superpõem. No exterior as igrejas menores e maiores o modelo de fachada retabular,
presente desde o Maneirismo e que se mantém no Barroco na América espanhola fará a diferença
entre os dois territórios ora considerados.
Mais diferenciados serão os resultados da imaginária. A um sofrimento contido visível nos cristos
lusitanos se contrapõe laceradas imagens espanholas. Por outro lado, é na imaginária onde se pode
ver revelada a presença de uma tradição devida a outras culturas encontradas pelos de Espanha
nas diversas partes da conquista. Os astecas, incas e outros povos da América espanhola detinham
certa experiência quanto ao trabalho e uso da pedra e de outros materiais, além do conhecimento
da metalurgia. A mão de obra por mais que desejada fiel às diretivas da Espanha se reflete no dia a
dia da construção e no ornamento desses exteriores e interiores das casas dos mais diversos
lugares. Em contrapartida pouco receberam nessa linha os lusitanos com relação à civilização
indígena nativa no Brasil. Nessa colônia o mais importante estava vincado a certa ausência de
tradição tão forte quanto aquela das conquistas espanholas. Os profissionais no Brasil tinham
liberdades nem sempre conhecidas em Portugal sob domínio de uma igreja que desejava ser fiel à
uma Contrareforma e seus temas iconográficos. O Brasil conheceu excelentes exemplares, em
termos de linguagem do Maneirismo e do Barroco. Certa quantidade que somava com a qualidade
do produzido sem nenhuma resistência anterior estilística ou decorrente de mão de obra vincada a
uma tradição.
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Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo - FAUUSP
Cristo crucificado espanhol e Cristo do Horto do mestre Aleijadinho
Uma diferença é sentida a da presença na América espanhola da mão de obra indígena e de seu
universo religioso que aculturou ou se aculturou diante da presença espanhola. A profusão de
ornatos e a superposição desmontadora daquelas linhas da composição talvez se devam a tal mão
de obra e gosto. Foram duas culturas e assim eles permaneceram ora se aproximando outras vezes
mantendo a distância que separa os artistas e arquitetos no ato criador.
De tudo quanto déssemos uma idéia pode ter restado - a elaboração e aplicação indistinta de uma
Lei para configurar um modo de apropriação do espaço na América espanhola para a vida do
homem e que gerou certo simbolismo com relação a presença do poder – a Lei das Índias. Esta
talvez a diferença maior. Mesmo com o domínio espanhol e quando da União Ibérica tal Lei no
Brasil teve pouca aplicação. Os portugueses dominados não se deixaram levar pelas
determinações da tão forte Leis das Índias. Neles foi mais significativa a memória dos lugares e a
identidade com a terra e a gente nela moradora. Esta sem vinculação maior à determinação de
como fazer uma cidade, por viverem em ladeias nem sempre fixas ao solo permanentemente.
José Luiz Mota Menezes
Recife, 02 de novembro de 2012
21
Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
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Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo - FAUUSP
‘La imagen de la ciudad mediterránea’ - La tipología de la imagen de la
ciudad mediterránea
Fernando Marías
Universidad Autónoma de Madrid
El empleo de la iconografía urbana como fuente para el estudio de la historia de las ciudades, de
su transformación urbana y de su arquitectura es práctica absolutamente común; como
testimonios gráficos procedentes del pasado, los historiadores de la arquitectura y del urbanismo
han tendido a confiar en la información de las vistas y plantas, muchas veces sin someterlas a un
control de su fiabilidad, dando por descontado su carácter retratístico y su veracidad4. Menos
común es el estudio de esa iconografía en sí misma, ya sea para acentuar su dimensión "emblemática" o "alegórica", en relación paralela con la geografía moralizada de la Edad Media, o para realzar
su dimensión "realística" como construcción de imágenes aceptables desde un punto de vista
perceptivo, al vivo, verdaderas, verosímiles, aunque pudieran ser imágenes "ficticias", no
experimentables por parte de ningún observador; se ha postergado, al mismo tiempo, su carácter
informativo sobre las ciudades que representaban más allá de su realidad física, sin centrarse en el
análisis de las imágenes como construcciones culturales, cuyo propósito primario no fuera solo la
representación directa de la ciudad material.
¿Estudiamos primariamente ciudades históricas a través de sus testimonios gráficos, o
preferentemente vistas de ciudades como objetos en sí mismos significativos? Porque en el primer
caso, tendemos a acentuar la fiabilidad de estos testimonios, dando por supuestos el carácter
científico de los métodos empleados para su realización. En el segundo caso tendría mucha más
importancia la identificación de las semplificaciones, deformaciones y manipulaciones sufridas por
la vera imago del referente urbano y el carácter "artístico" -ideológico a fin de cuentas más que
científico- de sus construcciones. Como historiadores de la arquitectura y del urbanismo somos
proclives a privilegiar la primera de estas dos posibilidades, mientras que como historiadores de
"imágenes de ciudades" resultarían más interesantes las que hubieran sido sometidas a un proceso
más profundo de transformación.
En los últimos años se ha incrementado notablemente el interés por estas imágenes -marginadas
desde un punto de vista artístico al no ser sus autores figuras de primera fila, dedicadas éstas al
vedutismo- aunque queden todavía por resolver algunos problemas que se ponen de manifiesto al
enfrentarse con este género, al haberse tendido normalmente al estudio monográfico de las
imágenes de una ciudad o de un mismo artífice, sin llegar a contextualizarse en el marco más
amplio de la producción global de la llamada "corografía" urbana.
Las dos más célebres imágenes de una ciudad pintadas en España en la época Moderna, la Vista de
Toledo (ca. 1600, Nueva York, Metropolitan Museum of Art) y la Vista y plano de Toledo (ca. 1610,
Toledo, Museo Casa del Greco), obras ambas de Doménico Theotocópuli 'El Greco' (1541-1614),
4 Este artículo desarrolla y pone al día mis trabajos titulados "Tipologia delle immagini delle città spagnole", en
Città d'Europa. Iconografia e vedutismo dal XV al XIX secolo, ed. Cesare de Seta, Electa Napoli, Nápoles, 1996, pp.
101-117 y "From the 'Ideal City' to Real Cities: Perspectives, Chorographies, Models, Vedute”, en The Triumph of the
Baroque. Architecture in Europe 1600-1750, ed. Henry A. Millon, Bompiani, Milán, 1999, pp. 218-240.
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Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
pueden servirnos como punto de partida para la reflexión sobre dos de los problemas que surgen
en el estudio de las vistas de ciudades: el de su terminología para alcanzar una tipificación
coherente y el de su fiabilidad. Sobre todo, si comparamos estos dos cuadros con el dibujo de
Toledo, de 1563, del artista flamenco Anton van den Wyngaerde (Amberes, ca. 1525-Madrid,
1571), autor de la serie más importante de vistas de ciudades españolas del siglo XVI y paradigma
de lo que, en una primera impresión, constituiría una extremada exactitud en su descripción
topográfica y arquitectónica.
La primera de ellas, con su formato anticonvencionalmente vertical, más propio de otro género de
pintura, como un retrato, que de una vista urbana, nos muestra un pequeño sector -oriental- de
Toledo que, aunque limitado en su extensión, recogía algunos de los edificios más representativos
de la vida institucional y religiosa de la ciudad: el Alcázar real y un palacio nobiliario, la Catedral y
el Hospital cardenalicio de la Santa Cruz. La vista de El Greco se nos presenta como una especie
de paisaje urbano más que como una exacta representación "corográfica" de Toledo, a pesar de la
extremada exactitud en el detalle de las arquitecturas que nos muestra. A primera vista, la forma de
estos edificios -frentes septentrionales del Alcázar y del Hospital- sugiere que la imagen fue
realizada a partir de un punto de vista situado al norte de la ciudad; no obstante, un análisis más
preciso de la localización recíproca del Alcázar y la Catedral, ésta a la izquierda de aquélla,
demuestra que su colocación respectiva, desde un punto de vista situado al norte de la ciudad, en
el camino hacia Madrid por Illescas, se ha intercambiado; similar imagen solo podía ser
contemplada desde el este, desde el segundo camino que conducía, por Aranjuez, hasta la capital
del reino. La imagen de El Greco, fiable por su descripción del pormenor arquitectónico (no
imaginario pero sí simbólico)5, resulta ser -más que la invención falsa de un visionario- un
compuesto de dos diferentes vistas y por lo tanto, aparentemente, rechazable desde un criterio
que pretendiera también la exactitud topográfica de sus datos. Sin embargo, veremos como esta
práctica no quedó limitada a las creaciones de un artistas que, como el cretense, pretendiera sobre
todo crear una imagen más subjetiva que objetiva de una ciudad.
A pesar de encontrarse más próxima a la tipología de las imágenes corográficas, este cuadro se ha
tendido a poner en relación con el otro gran grupo de las imágenes de ciudades, el de las imágenes
convencionales, al que pertenecerían las que denominamos vistas icónicas y las vistas típicas. En las
primeras no interesaba la representación individualizada de una ciudad en su conjunto, sino
solamente el concepto de ciudad (como en las llamadas en latín icones)6, y constituían imágenes
5.
Véase ahora Fernando Marías, El Greco en Toledo, Scala Books, Londres, 2001, cap. 1.
Presentes sobre todo en portulanos, cartas de marear o relatos de peregrinaciones. Quizá podamos encontrarnos con
representaciones icónicas de ciudades españolas, como Málaga, desde mediados del siglo XV, en los “vistosos” y
flamígeros portulanos “catalanes” producidos en Palma de Mallorca y Barcelona, como en el de Gabriel de Valseca
(Palma, 1447, Bibliothèque Nationale de Paris, Rés. Ge. C. 4607). Véase Gonçal Reparaz, "Essai sur l'historie de la
géographie de l'Espagne de l'antiquité au XVe siècle", Annales du Midi, 52, 1940, pp. 137-189 y 280-341, y Julio Rey
Pastor y Ernesto García Camarero, La cartografía mallorquina, Departamento de Historia y Filosofía de la Ciencia,
Madrid, 1960. Esta línea representativa se mantendría a lo largo de los siglos XVI y XVII en el medio de los
portolanos, aunque paulatinamente fueran incorporándose algunos rasgos distintivos de cada ciudad, que llevarían a
asimilar sus imágenes con las vistas típicas por su empleo de la metonimia. En la carta del Mediterráneo atribuida al
portugués Sebastiâo Lopez (ca. 1565, Newberry Library, Chicago), encontramos una ciudad de Málaga cuyos únicos
signos distintivos son los de su nombre, su situación geográfica y el mar que ciñe su caserío. Todavía más tardío, del
siglo XVII, un portolano italiano, obra del napolitano Bernardo Muti (Valencia, Archivo Municipal), incluyó entre sus
descripciones geográficas y portuarias las imágenes dibujadas de cinco o seis ciudades españolas; en todas ellas, perfiles
o elementales vistos a vuelo de pájaro con edificios en perfil, el elemento principal de la imagen es la representación de
6.
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esquemáticas que incluso podían intercambiarse con mínimas modificaciones (terreno en lugar de
rio, mar en lugar de rio, etc.); de hecho, requerían un titulus para su correcta "identificación"7. En
las segundas, las vistas típicas, como la vista de Toledo de Pedro de Medina (1548)8, no interesaba ni
la descripción global y homogénea de su imagen, ni hacerla coincidir con la experiencia visual de
sus contempladores, sino su identificación precisa, de forma metonímica, a través de su extensión
esquemática -prácticamente con una planta geométricamente regular o, más tarde, aproximativa- y
sus principales edificios, emblemáticos o representativos, sus landmarks arquitectónicos, sobre los
que recaía el peso del reconocimiento del conjunto, hasta el punto de poder llegar a sustituirlo,
presentándose como alzados ortogonales o en forma de representaciones pseudo-perspectivas9.
Imágenes españolas de esta clase se conservan desde comienzos del siglo XIV, como las
ilustraciones a pluma que acompañan la relación de la "Visita canónica a la Diócesis de Tortosa
por su Obispo Don Francisco de Paholach en el año 1314"10.
Es evidente que la Vista de Toledo no encaja automáticamente con ninguna de estas dos categorías,
ni siquiera con la segunda11, pues no existe imagen global esquemática ni escisión entre
arquitecturas representativas y el tejido urbano contextualizador. A pesar de ello, se ha venido
poniendo en relación con la tradición medieval de la "geografía moralizada"12, de las "vistas
emblemáticas" de las glorias de la ciudad más que con un nuevo género, en el que los valores
emblemáticos de la arquitectura de la urbs y de la sociedad de la civitas se fundirían con intenciones
corográficas y paisajísticas13. No deja de ser significativo a este respecto el deslizamiento del título
de la más importante obra de corografía urbana del siglo XVI, la Civitates Orbis terrarum de Georg
Braun y Franz Hogenberg, en el que las "civitates" del primer volumen (1572) se convierten en las
"urbes" de los restantes cinco tomos (1581-1617).
Parece indudable que las dificultades críticas que plantea este cuadro de El Greco se deben tanto a
nuestros precarios sistemas de tipificación como al hecho de que frecuentemente olvidemos que
nos enfrentamos a "construcciones", a imágenes "hechas" más que automática y directamente
procedentes -sin intermediarios de ninguna clase, como imágenes "naturalmente" especulares- de
sus propios referentes urbanos14.
la topografía de sus puertos, los principales rasgos que podrían permitir la identificación del lugar a distancia, y los
servicios portuarios; el caserío o los principales edificios se convierten en configuraciones seriadas y esquemáticas.
7. O, al menos de su inserción dentro de una narración explicativa. Así, por ejemplo, podríamos encontrar la imagen de
Granada -como "representación" de la Valencia conquistada por Jaime I- en una xilografía de la Segunda Parte de la
Coronica General de España (Valencia, 1546) de Pedro Antonio Beuter; sorprendentemente, este mismo autor y en el
mismo año, imprimía una característica vista típica de Valencia en su Primera Parte de la Coronica General de toda España.
8. Libro de las grandezas y cosas memorables de España, Sevilla, 1548, fol. 85.
9. Véase ahora, sobre la historia de estas tradiciones de "retratos de ciudades" antiguos y medievales, Lucia Nuti, Ritratti
di città. Visione e memoria tra Medioevo e Settecento, Marsilio, Venecia, 1996, pp. 43-67.
10. Tortosa, Archivo Capitular. Sign.: Vis. Past. 1; publicados por María Teresa García Egea, Una visita pastoral de la
Diócesis de Tortosa. Obispo Paholach, Diputación Provincial, Castellón, 1993.
11. Victor I. Stoichita, L'instauration du tableau. Métapeinture à l'aube des Temps modernes, Méridiens Klincksieck, París, 1993,
p. 191 (trad. esp., Ediciones del Serbal, Barcelona, 2000).
12. Jonathan Brown y Richard L. Kagan, "La 'Vista de Toledo'", pp. 37-55. También véase El Greco de Toledo, ed. por J.
Brown, Ministerio de Cultura, Madrid, 1981. El término se basa en Jürgen Schulz, "Jacopo de' Barbari's View of
Venice: Map Making, City Views, and Moralized Geography Before the Year 1500", The Art Bulletin, 60, 1978, pp. 425474.
13. Fernando Marías, "El Greco y el paisaje español del siglo XVI", en Los paisajes del Prado, Nerea, Madrid, 1993, pp.
88-104.
14. Véase Svetlana Alpers, The Art of Describing. Dutch Art in the Seventeenth Century, The University of Chicago Press,
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Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
La segunda imagen, la Vista y plano de Toledo, es todavía más desconcertante, a pesar de su formato
apaisado tradicional y su aparente normalidad en la descripción corográfica de la ciudad; de hecho,
siempre le ha parecido a la crítica una obra tan completamente normal que solo debía leerse como
contrafigura de la creación de "irrealidad" de la Vista de Toledo; en consecuencia muy poca
atención se le ha prestado hasta hace muy pocos años. En principio, lo que tenemos delante de los
ojos es una simple vista de la ciudad, un perfil en perspectiva, tomada de nuevo desde el camino
de Madrid, desde el norte, próxima -aunque no idéntica- a la imagen dibujada y coloreada,
supuestamente objetiva, de Anton van den Wyngaerde.
Ahora bien, en el espacio ficticio de la representación urbana, surgen otros cuatro elementos
figurativos: 1) la imagen de un dios fluvial de yeso dorado, como si hubiera sido sacado de las
arquitecturas efímeras de una fiesta, que derrama el agua sobre el terreno y simboliza al rio Tajo;
se constituye no solo como un elemento de la geografía toledana sino también como una alegoría
de su economía agrícola y su fertilidad y, al mismo tiempo, nos da cuenta del carácter antiguo de la
ciudad, cuyas raíces históricas podrían retrotraerse a la época romana. 2) la imagen del milagro
mariano en el que se fundamentaba la historia religiosa -pasada y presente- de Toledo, con la
descensión sobre la ciudad de la Virgen que impone la casulla a su patrón San Ildefonso. 3) la
imagen en trompe-l'oeil de una hoja de papel, en el que se ha dibujado la planta de la ciudad y que un
joven, al ocupar el espacio -in abisso- que se encuentra entre la superficie del cuadro y su primer
plano, puede desplegar ante nuestros ojos, como si estuviera pegada al reverso de la "ventana
albertiana" de la pintura. Y, 4) la imagen sobre una nube -como veremos retrato de un modelo
tridimensional- de un edificio, el Hospital Tavera que administraba el cliente del lienzo, el rector
Pedro Salazar de Mendoza; su imagen se ha reducido en escala para no cubrir la vista de la ciudad,
y se ha reorientado -desde el sur- para poder así mostrar la visión de la fachada del edificio,
invisible desde el norte.
No nos encontramos ante [las imágenes de] un dios, un milagro, un plano o un edificio, sino ante
las imágenes [de las imágenes] de un dios, un milagro, un plano y la maqueta de un edificio. Frente
a la vista de Toledo de 1565, del también flamenco Joris Hoefnagel, publicada en 1599 en las
Civitates Orbis terrarum, y en la que la Catedral y el Alcázar, sobre trozos del caserío, ocupan dos
espacios independientes, al margen de la vista general desde el sur de la ciudad, El Greco actúa de
manera diversa; por una parte, intenta la integración perceptual de todos los elementos en el
lienzo; por otra, deja claros -a través de la nube sobre la que se asienta el modelo y de una leyenda
que aparece escrita sobre la planta de la ciudad- los registros que escapan a la lógica visual, y los
procedimientos por él utilizados, explicando sus causas y justificando por escrito las alternativas
adoptadas:
"Ha sido forzoso poner el Hospital de don Joan Tavera en forma de modelo porque no solo venía a cubrir
la puerta de Visagra mas subía el cimborrio o cúpula de manera que sobrepujaba la ciudad y así una vez puesto
como modelo y movido de su lugar me pareció mostrar la haz antes que otra parte, y en lo demás de cómo viene con
la ciudad se verá en la planta.
Chicago, 1983 (trad. esp., Blume, 1987) y "The Mapping Impulse in Dutch Art", en Art and Cartography. Six Historical
Essays, ed. David Woodward, The University of Chicago Press, Chicago-Londres, 1987, pp. 51-96; el excesivo énfasis
puesto por esta autora en la oposición caracterizadora narración-descripción, y la confusión establecida entre mapa y vista
corográfica, minan el carácter "construido" de las vistas y socavan la importancia de su aportación.
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También en la historia de Nuestra Señora que trahe la casulla a San Ildefonso, para su ornato y hacer las
figuras grandes, me he valido en çierta manera de ser cuerpos celestiales, como vemos en las luces que, vistas de lexos
por pequeñas que sean, parecen grandes".
En sus palabras y en su imagen global y múltiple de Toledo podríamos quizá descubrir una
reflexión crítica del género por parte del pintor; si, por una parte, la vista y la planta se
complementan mutuamente, dando respectivas razones de sus imágenes (la planta de las
relaciones entre los edificios, la vista convirtiendo en realmente experimentable la abstracción de
un sector de la planta), no agotan, sin embargo, la "imagen" de la ciudad. Esta es en lo físico
perceptualmente inaprensible, irrepresentable; una vista perspectiva nos da una imagen orientada,
que requeriría de entrada, por lo menos, otra vista, tomada desde el lado opuesto; una planta no
sustituye a la experiencia visual y vital de la ciudad.
Pero además, ni siquiera la imagen doble es suficiente para El Greco -y ha de echar mano a otros
recursos- para enfrentarse con otros aspectos de la realidad urbana como entidad humana e
histórica, que no se agotaba en el presente de su propia imagen. Algunas de estas ideas han sido
puestas de manifiesto, en su reflexión sobre las representaciones de ciudades, por Louis Marin15.
Este autor ha distinguido, como figuras de un discurso utópico, tres tipos de representación
urbana: 1) la perspectiva panorámica, como suerte de relato con un narrador implícito; 2) la
planta, como descripción con un narrador ausente; y 3) el compromiso entre ambos que
constituiría la vista a vuelo de pájaro16. Según Marin, en el cuadro de El Greco se pueden
identificar cuatro espacios o cuatro dimesiones codificadas: dos miméticos, vista y planta, como
representación esquemática, mostrada por el "doble del pintor," de la representación de la ciudad;
dos metafóricos, historia mítica y alegoría retórica; y un quinto, a través del modelo del Hospital,
que testimoniaría, con su propio orden, pictórico más que natural o solo metafórico, la "inversión,
la deconstrucción de la representación".
Quizá nos debiéramos interrogar si El Greco, entre requisitos exigidos por el cliente y sus propias
reflexiones sobre el arte de la pintura, no habría pretendido demostrar, a través de tal acumulación
de imágenes variopintas, y abandonando la posibilidad del compromiso de la vista a vuelo de
pájaro, o la perceptualmente inalcanzable imagen de la planta con alzado, la imposibilidad de la
representación de la ciudad -en todas sus múltiples dimensiones- en una sola imagen, perspectiva;
o incluso en dos imágenes, dispuestas de forma coherente gracias al artificio del trompe-l'oeil en el
espacio ficticio, pero en última instancia irreconciliables17.
15.
Louis Marin, Utopiques: Jeux d'espaces, Les Editions du Minuit, París, 1973, pp. 283-290 y, en términos más generales,
"La ville dans sa carte et son portrait. Propositions de recherche", en De la répresentation, Gallimard-Le Seuil, París,
1994, pp. 204-218. Marin (p. 283) ha planteado la posibilidad de si en esta obra de El Greco, que "présente le jeu
d'espaces multiples caractéristique de la production utopique avec une si parfaite évidence [on] peut se demander si le
sujet de l'oeuvre, son thème patent, n'est pas de représenter la déconstruction de la représentation et ainse d'exhiber le
discours idéologique dans lequel elle est prise... et permît, dans l'idéologie de la représentation, l'opération propre à la
critique théorique, l'inclusion de l'énonciation dans l'évalutaion critique." Véase también, con aquellas páginas como
punto de partida, Victor I. Stoichita, L'instauration..., pp. 190-202, donde se subraya la importancia del viaje óptico y
mental, que El Greco impone al espectador, entre dos sistemas de representación y de "lectura", así como en el valor
intertextual de la planta.
16. No definiría, por lo tanto, como otra categoría las plataformas o plantas con alzados de edificios.
17. Marin (p. 285) ha podido llegar a preguntarse: "Mais où donc est Tolède, sinon dans l'écart irrépresenté et
irrépresentable qui sépare le rectangle blanchâtre de la carte, le schème-diagramme qui s'y inscrit et l'arc du paysage,
l'apparence, qui y surgit?"
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Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
Es posible, por otra parte, que la idea de esta imagen doble del Toledo material -vista y planta- le
hubiera sido sugerida a El Greco por la vista y dos plantas de Londres -Civitas Londini- de John
Norden, de 160018, en poder de Salazar de Mendoza. Las diferencias introducidas, más allá de las
existentes entre un grabado y una pintura, por parte del cretense saltan, sin embargo, a la vista: 1)
Ha mantenido el punto de vista de su imagen, determinado por el horizonte que marcan los ojos
del joven, sin incluir una "statio prospectiva" como la denomina Norden, la torre de la iglesia de Saint
Mary Overy, y todo un primer plano que hubo de requerir otro punto de vista, en este caso
imaginario; o la reconstrucción de la visión desde Saint Mary Overy, dándole la vuelta a la imagen
para pasar de una visión hacia el sur a otra hacia el norte. 2) Ha preservando su imagen, por lo
tanto, de la flagrante contradicción de la vista de Londres, al quedar en ésta su punto de vista
dentro del campo de la visión y, de forma incoherente, sumar o mezclar dos sistemas de
representación. Y 3) Los emblemas y las plantas pertenecen coherentemente al espacio ficticio de
su visión, sin flotar por la superficie del grabado o apoyarse en su borde.
Esta constatación del modelo tipológico de la Vista y plano de Toledo, y el análisis de sus
modificaciones, ha de llevarnos a otros temas, en primer lugar el de su tipificación19. La Civitas
Londini de Norden, o al menos su visión de la ciudad más allá del Támesis, se correspondería con
una vista estereográfica -según la clasificación de Raleigh Skelton20- o con un perfil -según la más
reciente de Lucia Nuti21- aun cuando se nos pretenda presentar como una vista en perspectiva o vista
a vuelo de pájaro, o como una vista oblicua para ésta última autora, dado que no se podría contemplar
su red viaria. La vista de El Greco constituye pura y simplemente para nosotros, como ésta última,
18.
Se trata de la imagen de Londres que, con mayor probabilidad, poseyera Pedro Salazar de Mendoza en su colección,
inventariada en 1629; las extrañas curvaturas que aparecen, en las vistas de Londres y Toledo, en los extremos parecen
confirmar su dependencia. Sobre esta colección, Richard L. Kagan, "Pedro de Salazar de Mendoza as Collector,
Scholar, and Patron of El Greco", pp. 90-92. Sobre la Civitas Londini, de Norden -aunque las plantas de "London" y
"Westminster" se basen en las grabadas por Pieter van den Keere en el Speculum Britannia de Norden (1, Middlesex,
1593)-, véase J. Hursfield y R. A. Skelton, "John Norden's View of London", London Topographical Record, 1965, pp. 525.
19. La terminología y -en función de ella- la taxonomía contemporánea a las obras no proporcionan una información
globalmente utilizable. Por ejemplo, en la minoría de imágenes hispanas en que aparece un "título" en castellano, este
suele ser el de plan, perfil, vista, descripción, perfil o figura; excepcional es la utilización de términos como traças, retrato, planta,
plataforma, planta y perspectiva o descripción chorographica, esta última significando más una representación cartográfica que
una vista urbana en sentido estricto. A partir del siglo XVIII pueden también encontrarse, aunque con carácter
asimismo excepcional, otros términos: planta y elevación, mapa o diseño, perspectiva. En obras tituladas en otros idiomas, el
vocabulario vuelve a ser muy restringido: plan, profil, vue, prospect, prospectus; a través del tipo de firma de los autores de las
mismas, se implican también los términos pictura, effigies y delineatio. Sobre el problema de la terminología, véase Raleigh
Skelton, "Introduction", Civitates urbis terrarum, Amsterdam, 1965, pp. x y ss.; véase también The Origins of Italian Veduta,
ed. por E. Berns y D. E. Bonner, Winton Belle Gallery, Providence, R. I., 1978. El intento reciente de desacreditar
cualquier tipo de categorización que no esté en íntima relación con la descripción de una ciudad específica, por parte
de Lucia Nuti, "The Perspective Plan in the Sixteenth Century: The Invention of a Representational Language", The
Art Bulletin, lxxvi, 1, 1994, pp. 105-128, contrasta con su clasificación en tres tipos de coherencia muy limitada: 1)
perfiles; 2) vistas oblicuas (desde un punto de vista más elevado pero sin mostrar la red viaria de la ciudad, a partir de
un supuesto control geométrico del espacio visual); y 3) perspective plans, en los que se mostrarían las calles y unificaría
las dos categorías de "a vista de pájaro" y todo tipo de map views, con planta y alzado de edificios.
20. 1) vistas estereográficas (perfiles, vistas, panoramas); 2) planos o plantas; 3) vistas en perspectiva o vistas a vuelo de pájaro; y 4) map
views, en las que se superpondría, sobre una planta general, una vista a vuelo de pájaro para los edificios.
21. 1) perfiles; 2) vistas oblicuas (tomadas desde un punto de vista más elevado pero sin mostrar la red viaria de la
ciudad, y realizadas a partir de un supuesto control geométrico del espacio visual); y 3) perspective plans, en los que se
mostrarían las calles, convirtiéndose en una clase que unificaría las dos categorías de "a vista de pájaro" y todo tipo de
map views, con planta y alzado de edificios.
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Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo - FAUUSP
y a pesar de las variantes entre lo que sería una perspectiva panóramica a la manera de la pintura
septentrional -abarcando más de los 60º previstos por la teoría italiana como límite de la visión
"legítima" sin distorsiones- y otra a la manera meridional, un perfil o una perspectiva en sentido
estricto. ¿Cómo pues clasificar las vistas de ciudades?
Tipologías
Es bien sabido que la representación de la ciudad sufrió un cambio revolucionario desde la
invención de la perspectiva moderna, con la que estableció una relación íntima, aunque
problemática, desde el mismo momento de su inauguración quattrocentista; no deja de ser
sintomático que las primeras obras en las que se propuso este nuevo método de representación
que pretendía la correspondencia exacta entre imágenes artificiales y visión natural, las tablillas
perdidas de Filippo Brunelleschi (1377-1446), no solo presentaran imágenes arquitectónicas del
Baptisterio y el Palazzo della Signoria de Firenze sino, en mayor o menor medida, de su entorno,
como vistas de dos sectores especialmente significativos de la ciudad.
Hasta entonces y desde el Mundo Antiguo, las ciudades se habían representado a través de
imágenes convencionales, en términos de vistas icónicas y vistas típicas; en las primeras no interesaba
la representación individualizada de una ciudad en su conjunto, sino solamente el concepto de
ciudad (como en las llamadas en latín icones), y constituían imágenes esquemáticas que incluso
podían intercambiarse con mínimas modificaciones -terreno en lugar de rio, mar en lugar de rio,
etc.- y requerían un titulus para su correcta y precisa identificación; en las segundas, typus, no
interesaba ni la descripción global y homogénea de su imagen, ni hacerla coincidir con la
experiencia visual de sus contempladores, sino su identificación precisa, de forma metonímica, a
través de su extensión esquemática -prácticamente con una planta geométrica regular o, más
tarde, aproximativa- y sus principales edificios emblemáticos, sobre los que recaía el peso del
reconocimiento del conjunto. Aunque tales imágenes no desaparecieran por completo durante la
época moderna en determinados contextos (mapas, cartas de marear, portolanos, etc.), su
preponderancia fue puesta en entredicho por otros tipos de imagines urbis, que las desterrarían al
reino de lo puramente convencional.22
No obstante, habría que introducir ahora una matización importante. La historia de las
imágenes corográficas romanas, que creíamos exclusivamente simbólicas y convencionales, ha
sufrido un vuelco gracias al reciente descubrimiento -de 1997- de una vista de Città dipinta de
época Flavia (ca. 75), representando aparentemente una ciudad italiana con puerto remodelada
en época Julio-Claudia, que quizá formara parte de la decoración de la Oficina del Praefectus
Urbi, en el criptopórtico bajo las Termas de Trajano (ca. 109), junto a la Domus Aurea del Colle
22.
A los cuatro tipos a los que nos referiremos con más detalle podrían añadirse otros dos absolutamente
excepcionales. En primer lugar el "imposible" híbrido entre perspectiva -como imagen posible de ser experimentada
realmente- y vista a vuelo de pájaro -imposible para la experiencia del espectador- a la manera de la xilografía anónima
de Il disegno di Ferrara nel 1490 (Modena, Biblioteca Estense, α.H.5.3). En segundo lugar, el también excepcional tipo de
las imágenes de "ojo de pez", representado por las imágenes de Viena en 1529 (1530) de Hans Sebald Beham, Edgar
Schön y Giovanni Andreas di Vavassore, sobre un dibujo de Niklas Meldemann; Estrasburgo (1548), grabada por el
Monogramista MH sobre un diseño de Conrad Morant; o Nuremberg (1560, de autor anónimo). También podría
considerarse en esta categoría la vista de México-Tenochtitlán a partir de la carta de Hernán Cortés, impresa en
Venecia en 1524, posible punto de partida de este grupo de imágenes heterogéneas y asistemáticas en su retrato de las
ciudades, alejadas por completo de la idea de "verosimilitud" en su visión.
29
Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
Oppio23. Los dos fragmentos recuperados nos muestran un segmento de la ciudad y el puerto
vistos desde tierra, como si se tratara de una ciudad contemplada a vista de pájaro, aunque
algunos edificios parezcan representados de forma axonométrica, incluso en términos de una
perspectiva ligeramente invertida. Existen, quizá ya desde época romana o incluso helenística,
tres grandes grupos de imágenes de ciudades; por una parte, el de las imágenes convencionales, al que
pertenecerían las que hemos denominado vistas icónicas y vistas típicas. Un segundo grupo estaría
constituido por las plantas zenitales u ortogonales, ichnografias, realizadas con pretensiones de
exactitud y diversos métodos e instrumentos científicos, que no surgirían en Europa hasta
mediados del siglo XV y cuyo número parece haber sido limitadísimo hasta el siglo XVIII, cuando
comenzó a imponerse el criterio de la exactitud por encima del de la veracidad en la imagen24. La
experiencia visual de la imagen de la ciudad quedaría sustituida por una lectura "cartográfica".
Las imágenes corográficas
El tercer grupo estaría constituido por las imágenes corográficas -que se proponen el retrato verosímil
de la ciudad en su "integridad"- y podría subdividirse a su vez en tres categorías de límites no
excesivamente claros.
1) vistas naturales, perfiles o perspectivas, que permitirían la visión en perspectiva de la ciudad25, desde
un punto de vista real (ya fuera desde el suelo del terreno circundante o desde un edificio o
23
Eugenio La Rocca, “The Newly Discovered City Fresco from Trajan’s Baths, Rome”, Imago Mundi, 53, 2001,
pp. 121-124.
24. Una relación de su producción histórica debería iniciarse con la perdida Descriptio Urbis Romae de L. B. Alberti
(1441/1455, ejecutada con un circumferentur y por triangulación) y las conservadas de Pisa (atribuida a Giuliano da
Sangallo, ca. 1480-1495) e Imola, de Danesio Maineri y Leonardo da Vinci (1472/74 & 1502). La predominante
función militar de estas plantas parece quedar demostrada por las siguientes realizaciones: la perdida Florencia sitiada
de Nicolò Tribolo y Benvenuto di Lorenzo della Volpaia (1529); la Portsmouth (1545); las Vienas sitiadas del
arquitecto Bonifaz Wohlmuet (1547) y del cartógrafo Augustin Hirschvogel (dibujo de 1549 y grabado de 1552, con
explicación del método empleado, medida de las murallas y triangulación con brújula, incluyendo además una vista de
los bastiones); el grabado de Roma de Leonardo Bufalini (1551); la perdida Siena sitiada del arquitecto Giovanni
Battista Peloro (ca. 1555); las diversas ciudades de Flandes de Jacob van Deventer, realizadas para Felipe II (15591576, y que incluyen vistas de los principales edificios); y la Duisburg de Johannes Corputius (1566). Pocas ciudades
contaron con una planta en las décadas siguientes: Cremona (de Antonio Campi, 1583, dedicada a Felipe II y
publicada en 1585); Nuremberg (de Paul Pfinzing, 1594, todavía con bastiones en perspectiva); Parma (de Smeraldo
Smeraldi, 1601); Milán (de Francesco Maria Richini, 1603); Ferrara (de Giovanni Battista Aleotti l'Argenta, 1605);
Toledo (ca. 1610); Amsterdam (con alzados de algunos edificios, publicada por J. I. Pontanus, 1611); Amberes (de N.
Jansenius, 1624); Venecia (de Alessandro Badoer, 1627); Roma (de Matteo Gregorio de Rossi, 1668); Bolonia (de
Agostino Mitelli, 1692), etc.
25. Los primeros ejemplos conservados de ciudades plenamente identificables y representadas globalmente serían
los de la Tavola Strozzi de Nápoles (atribuida a Francesco Rosselli, 1472) y las xilografías de Erhard Reuwich (para
las Peregrinationes in Terram Sanctam de Bernard von Breydenbach, 1486) y de Michael Wolgemut y Wilhelm
Pleyenwurff (para el Liber Chronicarum de Hartmann Schedel, 1493). De las dificultades para adquirir modelos para
las principales ciudades italianas (más Constantinopla, El Cairo y París) a finales de la centuria, véase la
correspondencia entre el humanista Teofilo Colenucci y Francesco II Gonzaga, Marqués de Mantua, de 14931497, con motivo de la decoración de la Camera delle Città de la villa de Gonzaga que realizaban los pintores
Girolamo Corradi y Polidoro (Juergen Schulz, La cartografia tra scienza e arte. Carte e cartografi nel Rinascimento italiano,
Franco Cosimo Panini, Ferrara, 1990, pp. 37-39 y 60-61), fecha en la que se buscaba con ahínco una imagen de
Florencia. El carácter de éstas imágenes parece haberse alejado de las realizadas por Bernardino Pinturicchio según Vasari "alla maniera de' Fiamminghi"- en la villa del Belvedere vaticano (1484-1487) para Inocencio VIII.
Véase también ahora Clifford M. Brown, “The ‘Camera del Mappamundo e del Caiero’ in the Palazzo di San
30
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo - FAUUSP
promontorio natural elevado), y utilizando un ángulo de visión más o menos amplio26. Los
edificios de la parte delantera de la ciudad ocultarían el resto de las fábricas y la visión global y del
contorno de la ciudad sería imposible; no obstante, con ello se eliminaba el problema de los
efectos de una disminución correcta, de acuerdo con las leyes de la perspectiva artificial, de los
tamaños de las edificaciones más distantes. La idea de perspectiva, sin embargo, no conlleva la
aplicación de una única imagen monofocal, realizada a partir de un solo punto de vista ocupado
por un observador completamente inmóvil27.
2) vistas a vuelo de pájaro, tanto si mostraran el "pavimento" de calles y plazas como si éste fuera
invisible, realizadas a partir de un punto de vista imposible, situado por encima de las cimas de los
edificios o promontorios reales del entorno28. En ellas, la ciudad se desplegaba sobre un plano
más o menos inclinado que permitía la visión imaginaria del conjunto y su contorno global. Los
edificios de la ciudad podían quedar individualmente representados de forma pseudo-perspectiva con una mínima confluencia de sus líneas paralelas- más que axonométrica, dado que no se
respetaría nunca la correcta disminución proporcional y sistemática de sus dimensiones en
función de sus distancias con respecto al punto de vista "virtual". Este término contemporáneo de
"vistas a vuelo de pájaro" fue sustituido en los siglos XVI y XVII por los de "disegno", "descriptio",
"prospectus" o "iconographia".
Hemos de preguntarnos, sin embargo, ¿hasta qué altura vuelan los pájaros? Algunos estudiosos,
como hemos visto, han introducido otra variante -vista perspectiva, planta en perspectiva- para
aquellas imágenes cuyo punto de vista se enmarcara entre los 60º y los 90º (la visión zenital),
dando por supuesto que en su realización se partiría de una planta que se habría deformado
"perspectivamente" hasta situarla en la inclinación elegida, haciendo "descender" al espectador
hasta una posición oblicua; a partir de tal suposición, se habría negado lo que se había conseguido
Sebastiano in Mantua: a Fragment of a View of Jerusalem and Vittore Carpaccio’s Letter to Francesco II Gonzaga
of 1511”, Journal of Jewish Art, 10, 1984, pp. 32-46 y “The Palazzo di San Sebastiano (1506-1512) and the Art
Patronage of Francesco II Gonzaga, Fourth Marquis of Mantua”, Gazette des Beaux-Arts, 129, 1997, pp. 131-180, y
“Francesco II Gonzaga and Maps as Palace Decoration in Renaissance Mantua”, Imago Mundi, 51, 1999, pp. 51-81.
Molly Bourne, “Francesco II Gonzaga and Maps as palace Decoration in Renaissance Mantua”, Imago Mundi, 51,
1999, pp. 51-82 y Francesco II Gonzaga. The Soldier-Prince as Patron, Bulzoni, Roma, 2008.
26. Tres aclaraciones son necesarias a este respecto: 1) Se trata del único caso en que el término "perspectiva" puede ser
aplicado, como ante un paisaje. Nos remitimos a la estampa de De artificiali perspectiva de Jean Pélerin ‘Viator’ (Toul,
1509, fol. A vi rº), en la que se da una continua y correcta disminución del espacio en profundidad y de la altura de los
árboles hasta la línea del horizonte. 2) Según las dos categorías establecidas por este mismo autor (fols. A vi vº y A vii
rº) para la construcción de una perspectiva, en función de la relación existente entre el punto de vista del espectador y
el punto de vista de las personas representadas -ex sede communi (a la albertiana) y ex sede elevata-, un perfil podría utilizar
una u otra, siempre que la elevación del punto de vista del artista no sobrepasara la altura "natural" de un edificio o
montículo. 3) Aceptamos, por lo tanto, el uso de cualquier ángulo visual horizontal, en función de las diversas teorías y
prácticas existentes sobre el mayor ángulo aceptable.
27. Il disegno di Ferrara vecchia nel 1490, de autor anónimo, 1490, constituiría el único, temprano y fallido ejemplo de una
perspectiva monofocal -en sentido estricto- en la representación de una ciudad; el centro de la ciudad -entre el palacio
ducal y la catedral- se construye como una perspectiva monofocal ex sede elevata; se incluye, incoherentemente dentro
de la imagen a vista de pájaro del conjunto urbano, introduciéndose un segundo horizonte mucho más elevado que el
que marca el punto de fuga del centro.
28. Las primeras realizaciones conservadas serían las de los cuadros de Florencia (atribuida a Francesco Rosselli, ca.
1472-1482 o 1489-1495, conocida sobre todo por el grabado "Fiorenza" della catena, atribuido a Lucantonio degli
Uberti) y de Roma (atribuida también a Rosselli, ca. 1478-1490, conocida por la copia del Palazzo Ducale de Mantua, y
a las que habría que añadir una perdida Constantinopla), el grabado de Ferrara de 1490, y la famosa y enorme xilografía
de Venecia (de Jacopo de' Barbari y Anton Kolb, 1500).
31
Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
a través de la planta, la exactitud, para añadír a la imagen verosimilitud, aun cuando con la mera
elevación de los edificios sobre una planta verdaderamente geométrica se llegara a la misma
apariencia de retrato29.
Debiera ser más lógico concluir -aun admitiendo la posibilidad teórica de que algunas imágenes
"oblicuas" partieran de una planta geométrica y aceptando que otras parecen excluirla30- que la
imagen zenital con edificios, la tercera tipología que discutiremos de inmediato, pertenece a otra
esfera de las intencionalidades retratísticas de la ciudad. Decidir si nos encontramos ante una vista
a vuelo de pájaro "casi zenital" o un plano con alzado, dependerá exclusivamente de la
comparación de su imagen con la de una planta.
3) planos con alzado o pla[n]taformas31; ya fuera a partir de la tipología de las vistas típicas32, o como
complemento informativo de los planos -fundiendo experiencia visual y exactitud dimensional-, se
habría desarrollado esta tercera categoría, en la que sobre una planta -aun dándose la posibilidad
de incluirse por encima del espacio urbano un falso horizonte- se trazarían los volúmenes
tridimensionales de los edificios de la ciudad. El sistema representativo utilizado para los edificios
ortogonales del tejido urbano sería el de la proyección paralela, axonométrica (isométrica,
dimétrica o trimétrica)33. A partir de los diversos tipos de axonometrías empleados, se podrían
establecer dos subcategorías teóricas:
3a) vistas caballeras o planos con alzado caballero; en ellas se potenciaría la visión frontalizada (con
ángulos de 90º respecto al plano) de los edificios más importantes y representativos de la ciudad, y
se emplearían axonometrías dimétricas o trimétricas en las que los ángulos rectos de sus plantas
nunca estarían representadas por ángulos de 90º ("caballeras", "cavalier"). La terminología de sus
primeros o más tardíos autores parece haber variado de manera extraordinaria, aunque tendiendo
a "unificar" en una sola palabra los dos tipos de representación: "platforme", "situs", "forma", "imago",
"sciographia", "typus" y, sobre todo, "descriptio" y "topographia"; solo en el siglo XVIII parece haberse
introducido el neologismo dual de "ichnoscenografia"34.
29.
Véase Jean Boutier, L. Teissere-Sallmann, "Dalla pianta prospettica alla pianta geometrica. Le modificazioni nella
cartografia urbana in Europa occidentale dal XVI al XVIII secolo", en Colloque du Groupe de travail international d'histoire
urbaine, París, 1994; y F. Marías, 1996, pp. 101-117. Para una visión opuesta del problema, Nuti, 1994 y 1996, pp. 133153.
30. Las sucesivas imágenes de Amsterdam de Cornelis Anthonisz (1538 y 1544, todavía inexistente una planta
geométrica de la ciudad) no solo mantienen la visión de un horizonte sino que se nos presentan como dos pasos en un
proceso de "elevarse" por encima de la visión natural.
31. Quizá dependiendo de la planta de París conocida como "plan de la Grand Gouache" (ca. 1535) y las imágenes
derivadas (planta "de Basilea", de Olivier Trunchet y Germain Hoyau, ca. 1550; Saint-Victor, atribuida a Jacques
Androuet du Cerceau, ca. 1551; Georg Braun, 1572; y la de la Cosmographie universelle de François Belleforest, 1575), la
planta de París denominada "plan de la Tapisserie" (ca. 1569-1588) declaraba sus intenciones científicas y su nueva
impostación a través de su terminología: "en plat forme... par art de geometrie & vraei mesure... sans user de perspective que bien
peu". A pesar de los problemas de cronología de las plantas quinientistas de París, este importante conjunto
interdependiente parece indicar una prioridad francesa en la elaboración de esta tipología de vistas urbanas.
32. Como ha sostenido L. Nuti, 1994, pp. 122-126, subrayando un desarrollo que comprendería sucesivamente el
mayor detalle en los edificios y el relleno del resto del tejido urbano previamente "en blanco".
33. Una axonometría puede ser isométrica cuando los tres ángulos que confluyen en una esquina de un cubo o
paralelogramo son iguales (120º), dimétrica si solo son iguales dos (p. e. uno de 90º y dos de 135º) o trimétrica si todos
son diferentes.
34. Véase Giovanni Ricci, "Ciudad amurallada e ilusión olográfica. Bolonia y otros lugares (siglos XVI-XVIII), en La
ciudad y las murallas, ed. de Cesare de Seta y Jacques Le Goff, Madrid, Cátedra, 1991, pp. 261-285, especialmente pp.
32
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3b) vistas militares o planos con alzado militar, en las que se potenciaría la coherencia entre la
representación ortogonal de la planta y los volúmenes de los edificios, por medio de la utilización
sistemática de axonometrías -asimismo dimétricas o trimétricas- de tipo "militar" ("military"), en las
que se respetaría en la planta y el "plano de tejados" la correspondencia entre ángulos rectos y su
representación con ángulos de 90º. Los alzados o frentes de los edificios quedarían escorzados,
pero la imagen global sería coherente, como si a la planta se superpusiera otra planta de "tejados"
ortogonales. La terminología contemporánea empleada para este tipo parece haber tendido
primero a conservar la idea tradicional de "unidad visual" ("portrait" para la imagen de París de
Vassalieu "Nicolas" y "carte ou description" para la de Quesnel, ambas de 1609)35, para más tarde
enfatizar la doble componente de tales imágenes: "disegno e pianta" (Roma, 1618, de Matteus
Greutter), "planta et facies" e "ichnographia et hypsographia sive planta & facies" (Roma, 1667, de
Giovanni Battista Falda) o "pianta e alzata" (Roma, 1676, del mismo Falda). No obstante, no
parece haberse logrado una perfecta realización de este tipo de imágenes, por las dificultades
inherentes al mantenimiento sistemático de tal proyección, así como por la necesaria ampliación
en anchura de las calles, con el fin de que los edificios no superpusieran sus alzados ni las
ocultaran por completo. Al mismo tiempo, la verticalidad requerida para la representación de los
edificios dejaba en entredicho su tridimensionalidad; no es de extrañar que para contrarrestar este
efecto se acentuaran dramática y artísticamente las luces y las sombras, insistiéndose gracias a este
recurso en su "tangibilidad" visual.
Quizá pudieran tomarse como una cuarta categoría -demostrando la labilidad de su
categorización- a pesar de que parecen más un desarrollo de los typus anteriormente citados como
imágenes convencionales, la de las ahora llamadas vistas a ojo de pez, que excepcionalmente se
dieron entre 1520 y 156036. Mezclando sistemas de representación diversos, disponían, siguiendo
un esquema radial, una corona de edificios -e incluso campos extramuros- vistos en perspectiva,
mientras que otras representaciones tridimensionales, destinadas a los principales monumentos,
realzados también en sus dimensiones, se abatían en el centro de una imagen globalmente
incoherente y más conceptual que visualmente experimentable, al requerirse simultáneamente su
contemplación como plano y como espacio radial a partir de su centro.
280-281, donde analiza la "ichnoscenografia" de Bolonia (1702) de Filippo de' Gnudi, y el nuevo significado de su
concepción de producir "deleite" por "ver la ciudad de Bolonia exactamente como es", y el carácter "útil" de su
imagen, pues "mediante la escala... se puede conocer cuál es su perímetro, cuál es su superficie... e igualmente la
distancia entre cualquier lugar y otro". El autor resalta también está imagen como constatación del carácter
irreconciliable de las pretensiones de precisión y verdad, y el fracaso del "deseo olográfico" en la representación de la
ciudad.
35. Hillary Ballon, The Paris of Henri IV. Architecture and Urbanism, The MIT Press, Cambridge, Massachusetts-Londres,
1991, pp. 212-249.
36. Los ejemplos más claros son los de Viena, sitiada en 1529 (Hans Sebald Beham, Edgar Schön y Giovanni Andrea di
Vavassore, sobre un dibujo de Niklas Meldemann), vista desde el interior; Estrasburgo (Monogramista MH sobre
Conrad Morant, 1548), vista desde el interior a excepción de la muralla, vista desde el primer plano y desde el exterior
de la ciudad; y Nuremberg (de autor anónimo, 1560). También podría considerarse en esta categoría la vista de
México-Tenochtitlán a partir de la carta de Hernán Cortés, impresa en Venecia en 1524, posible punto de partida de
este grupo de imágenes heterogéneas y asistemáticas en su retrato de las ciudades, alejadas por completo de la idea de
"verosimilitud" en su visión. Nada tienen que ver estas vistas a ojo de pez, por otra parte, con los desarrollos abatidos,
sobre un anillo circular plano, de los panoramas de 360 grados del siglo XIX, que solían editarse como ilustraciones de
sus opúsculos explicativos, suerte de anamorfosis a partir de las proyecciones cilíndricas que constituían tales
panoramas. El círculo central (relleno en las imágenes del siglo XVI) quedaba en blanco, y se convertía en el espacio
en el que el espectador podía "girar" para contemplar el panorama anular, en forma de corona, y, por lo tanto, no tenía
que ser ocupado por un espejo cilíndrico como en algunas verdaderas anamorfosis circulares del siglo XVII.
33
Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
Ciudades mediterráneas
Como hemos podido ver, todas las tipologías hasta ahora reseñadas han presentado ejemplos
de ciudades tanto mediterráneas como interiores, aunque la terminología del Renacimiento
respecto a la mediterraneidad de sus ciudades parece haberse alejado de la que usamos
actualmente de forma corriente. Con quizá mayor exactitud, encontramos testimonios
históricos de la diferenciación entre ciudades mediterráneas –en medio de la tierra- y ciudades
costeras; así, cuando en 1493 el supervisor de las obras del IV Marqués de Mantua (1484-1519)
Francesco II Gonzaga (1466-1519) en el palazzo de Gonzaga, Teofilo Collenuccio, que
ejecutaban Girolamo Corradi y Polidoro, señaló que se habían elegido vistas de ciudades tanto
maritime (Constantinopla, Nápoles, Venecia, Génova) como mediterranee (Roma, Florencia, El
Cairo, París o Jerusalén)37.
No obstante, si regresamos a las ciudades que hoy tendemos a definir como las mediterráneas,
localizadas sobre el mar, hemos podido ver cómo los portolanos que facilitaban las rutas
marítimas incluían en la categoría de imágenes convencionales las que hemos denominado vistas icónicas
y entre ellas se podían contar no solo las ciudades costeras sino también a veces algunas
interiores, de la misma forma que unas y otras aparecían igualmente en las vistas típicas,
incluyendo también un elemento definidor de su topografía marítima. En ambos casos, no
existiría diferencia ninguna, como lo demostrarían algunas de las más imágenes más densas de
información de esta tipología, las representaciones incluidas a mediados del siglo XV en
algunos manuscritos de Pietro del Massaio (Florencia, ca. 1458/1472) de la Geographia de
Claudio Ptolomeo (ca. 85-ca. 165), que incluyeron sin diferencias tipológicas hasta nueve
ciudades como Milán, Florencia, Roma, Damasco, Jerusalén y El Cairo, pero también Venecia,
Constantinopla y Alejandría38.
En el marco del segundo grupo de representaciones, constituido por las plantas zenitales u
ortogonales, o ichnografias, solo podemos encontrar a la ciudad de Venecia (de Alessandro Badoer,
1627) en fechas relativamente tempranas y habrá que esperar a la planimetría del siglo XVIII para
que esta difícil y costosa representación se fuera abriendo paso “hacia el mar”, como en el caso de
Nápoles y su planta diseñada por el Duca di Noya Giovanni Carafa de 1775.
En las imágenes corográficas la situación podía cambiar. Es evidente que la situación de estas
ciudades vueltas frente al mar habrían requerido, como sus representaciones más lógicas, las
vistas naturales, perfiles o perspectivas, que permitirían la visión en perspectiva de la ciudad, desde un
punto de vista real (ya fuera desde el suelo del terreno circundante o desde un edificio o
promontorio natural elevado), y que en el caso de un frente de mar habrían solicitado una
representación frontal desde el agua, como si se quisieran mostrar como se verían desde un barco
que se aproximara a su puerto. Se trató de la forma más simple de “retratar” una ciudad, sin
modificar losdatos de la percepción, y los flamencos se especializaron en ella. El pintor y
corógrafo flamenco Anton van den Wyngaerde utilizó en 1563-1564 esta tipología para muchas
de sus vistas como en la de Málaga, pero para Barcelona, cuya orografía le permitía alcanzar una
37
38
M. Bourne, 1999, p. 52.
También pudieron alternar con Volterra, Edirne (Adrianópolis) y Parísen algunos manuscritos.
34
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo - FAUUSP
altura importante desde un lateral, desde Montjuich39, sobre un arquetipo que parece haber sido ya
fijado por Jan Cornelisz. Vermeyen en 1535 –en dibujo o grabado perdido- y se repetiría una y
otra vez gracias a su difusión por parte de Georg Braun y Franz Hogenberg en 1572 en sus
Civitates orbis terrarum.
Los primeros ejemplos históricos conservados de ciudades plenamente identificables y
representadas globalmente serían los de la Tavola Strozzi de Nápoles (atribuida al florentino
Francesco Rosselli, 1472-1473)40, y las xilografías de Erhard Reuwich (para las Peregrinationes in
Terram Sanctam de Bernard von Breydenbach, 1486) y de Michael Wolgemut y Wilhelm
Pleyenwurff (para el Liber Chronicarum de Hartmann Schedel, 1493), empezando por Venecia y
terminando en Candía, básicamente ciudades mediterráneas.
Las vistas a vuelo de pájaro, en cambio, suponían el tratamiento y la manipulación de los datos
empíricos, tanto si llegaban a mostrar los "pavimentos" viarios como si quedaran invisibles;
“construídas” a partir de puntos de vista imposibles, por encima de las estaciones visuales reales,
las ciudades aparecían en un plano oblicuo que permitía la visión imaginaria del conjunto y su
contorno global. Este término contemporáneo de "vistas a vuelo de pájaro" –que no surge
aparentemente hasta el siglo XVIII- define una tipología que se buscó con ahinco desde finales
del siglo XV.
Las primeras realizaciones conservadas de este tipo serían las de los cuadros de Florencia
(atribuida a Francesco Rosselli, ca. 1472-1482 o 1489-1495, conocida sobre todo por el grabado
"Fiorenza" della catena, atribuido a Lucantonio degli Uberti) y de Roma (atribuida también a
Rosselli, ca. 1478-1490, conocida por la copia del Palazzo Ducale de Mantua, y a las que habría
que añadir una perdida Constantinopla)41, un grabado de Ferrara de 1490, y la famosa y enorme
39 No deja de ser sintomático que el horizonte de esta imagen coincida con la parte superior de la atalaya de
Montjuich, donde existía una grua.
40 La llamada y discutidísima Tavola Strozzi con la Entrada de Ferrante I en Nápoles en 1464 (ca. 1472-73), spaliera
de lettuccio regalada por Filippo Strozzi para Ferrante I (Nápoles, Museo di Capodimonte), se atribuye actualmente
a Francesco Rosselli (ca. 1445-ca. 1524). A veces se mantiene todavía la atribución –sin prueba alguna- a
Francesco Pagano (1487) de Ferdinando Bologna (Napoli e le rotte mediterranee della pittura da Alfonso Il Magnanimo a
Ferdinando Il Cattolico, Società Napolitana di Storia Patria, Nápoles, 1977), a pesar de las nuevas hipótesis de Mario
Del Treppo, “Le avventure storiografiche della Tavola Strozzi”, en Fra storia e storiografia. Scritti in onore di Pasquale
Villani, eds. P. Macry y A. Massafra, Bolonia, 1994, pp. 483-515, de Guido Donatone, “Il letttuccio donato da
Filippo Strozzi a Ferrante d’Aragona: la Tavola Strozzi”, en Napoli e l’Europa. Ricerche di storia dell’arte in onore di
Ferdinando Bologna, eds. Francesco Abbate y Fiorella Sricchia Santoro, Istituto Italiano per gli Studi Filosofici,
Nápoles, 1995, pp. 107-111, y de Fiorella Sricchia Santoro, “Tra Napoli e Firenze: Diomede Carafa, gli Strozzi e
un celebre ‘lettuccio’”, Prospettiva, 100, 2000, pp. 41-54. Difícilmente se puede compartir la atribución a Leonardo
de Enrico Guidoni, Leonardo da Vinci e le prospettive di città. Le vedute quattrocentesche di Firenze, Roma, Napoli, Genova,
Milano e Venezia, Kappa, Roma, 2002.
41 A Francesco Rosselli (ca. 1445-ca. 1524) se le atribuyen las imágenes de Roma (1492, copia en Mantua, Palazzo
Ducale) gracias al inventario de 1524 de Alessandro di Francesco Rosselli, quien enumeraba una serie de estampas
de múltiples bloques: Pisa (5 bloques), Roma (3 en 12 fols.), Florencia (6) y Constantinopla (6); habrían sido
grabadas por Lucantonio degli Uberti “Lucchetto”, de cuya autoría también se da cuenta en algunos casos en el
inventario de la colección de Hernando Colón en Sevilla (1539): La Provincia de Granada, Constantinopla
(impresa en Venecia), Italia (en Venecia) y Roma (en Florencia), en la que se especifica además que incluía una
serie de imágenes de los emperadores de Roma y escenas de la historia de Constantino. Véase ahora tanto Disegno.
Der Zeichner im Bild der Renaissance, eds. Hein-Th. Altcappenberg y Michael Thimann Schulze, Deutscher
Kunstverlag, Munich-Berlín, 2007, como Mark McDonald, “El inventario de las estampas y su sistema de
clasificación. La reconstrucción de la colección”, en La colección de estampas de Hernando Colón (1488-1539).
35
Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
xilografía de Venecia (de Jacopo de' Barbari y Anton Kolb, 1500)42; en consecuencia nos
encontramos con una tipología que tampoco hace distinciones de ningún tipo respecto a la
topografía costera de las ciudades.
En la limitada historia corográfica de las ciudades españolas, es posible que debamos
nuevamente a Anton van den Wyngaerde algunos de los primeros ejemplos de abatimiento de
vistas de ciudades desde una representación natural a una vistade pájaro, como se daría en la vista
frontal de Barcelona (1563), y otras ciudades hispanas no mediterráneas.
Por último, tampoco se darían esas distinciones en la categoría de los planos con alzado o
pla[n]taformas, en la que sobre una planta –se incluyera o no un falso horizonte- se diseñaban los
volúmenes tridimensionales de las edificaciones urbanas, de acuerdo con cualquier tipo de
proyección paralela. Este tipo de vistas aparecieron en la década de los años treinte del siglo XVI,
como hemos visto, en Francia, pero tardaron en reaparecer, en nuevas imágenes como las de
Florencia (1584) del “monteolivetano” Don Stefano Bonsignore y Bonaventura Billocardi, o las
de París de Vassalieu "Nicolas" y François Quesnel (1609) y la Roma de Matteus Greutter (1618),
ninguna de ellas ciudad mediterránea.
Da la impresión de que en los territorios españoles, fueran peninsulares o ultramarinos, los costos
y la complejidad de la corografía más científica de las plantas con alzado dieron durante los siglos
XVI y XVII un menguadísimo producto. El modenés Antonio Manzelli de Arguello (ca. 15751632/1648), produjo en 1608 un grabado de calidad limitada con una planta con alzado de la
ciudad de Valencia43, y otra de Madrid (1622-1623) hasta la fecha perdida44, esperándose casi cien
años hasta la aparición de una segunda imagen valenciana, debida al matemático oratoriano
Tomás Vicente Tosca y fechada en 170445; por su parte, la "pla[n]taforma" de Granada de 1613,
del arquitecto italiano Ambrosio de Vico (ca. 1545-1623), grabada por Francisco Heylán46,
Coleccionismo en la era del Descubrimiento, ed. Mark McDonald, Fundación “La Caixa”, Barcelona, 2004, p. 72 y Peter
Barber, “The Maps, Town-Views and historical Prints in the Columbus Inventory”, en Mark McDonald, The Print
Collection of Ferdinand Columbus 1488-1539: A Renaissance Collector in Seville, 2 vols., The British Museum, Londres,
2004, I, pp. 246-262. inv. 3151.
42 Andrew John Martin, “Anton Kolb und Jacopo de’ Barbari: ‘Venedig im Jahre 1500’. Das Stadtportrait als
Dokument venezianisch-oberdeutscher Beziehungen”, en Pinxit, sculpsit, fecit. Kunsthistorische Studien. Festschrift für
Bruno Bushart, eds. Bärbel Hamacher y Christl Karnehm, Die Deutsche Bibliothek, Würzburg, 1994, pp. 85-94. A
volo d'uccello. Jacopo de' Barbari e la rappresentazione di città nell'Europa del Rinascimento, Arsenale, Venecia, 1999. Simone
Ferrari, Jacopo de' Barbari, Bruno Mondadori, Milán, 2006.
43. Reproducido en Fernando Benito Doménech, "Un plano axonométrico de Valencia diseñado por Manceli en
1608" en Ars Longa. Cuadernos de Arte, 2, 1992, pp. 29-37, y "El plano de Valencia de Manceli", en Tiempo y espacio
en el Arte. Homenaje al Profesor Antonio Bonet Correa, Editorial Complutense, Madrid, 1994, I, pp. 231-245. Fernando
Marías, “Realidad e imagen decorosa: las ciudades españolas de Felipe II”, Reales Sitios, 134, 1997, pp. 40-49.
Véase también José Miguel Muñoz de la Nava Chacón, “Antonio Mancelli: corógrafo, iluminador, pintor y
mercader de libros en el Madrid de Cervantes (I)”, La Torre de los Lujanes, 57, 2005, pp. 45-79 y “Antonio Mancelli:
corógrafo, iluminador, pintor y mercader de libros en el Madrid de Cervantes (II)”, La Torre de los Lujanes, 58,
2006, pp. 165-219.
44. La publicada por Frederick de Wit en Amsterdam, con la fecha de 1635, no deja de presentar problemas de
cronología aún por resolver satisfactoriamente; véase Manuel Molina Campuzano, Planos de Madrid de los siglos
XVII y XVIII, Madrid, 1960 y la bibliografía precedente sobre Mancelli, y Felipe Pereda, 1998, pp. 103-134,
especialmente pp. 113-126, y 2001, pp. 129-143.
45 El plano de Valencia de Tomás Vicente Tosca (1704), ed. Joan Gavara Prior, Generalitat Valenciana, Valencia, 2003.
46. Estudiada por Antonio Moreno Garrido, José Manuel Gómez-Moreno Calera y Rafael López Guzmán, "La
Plataforma de Ambrosio de Vico: cronología y gestación", Revista Arquitectura Andalucía Oriental, 2, 1984, pp. 6-11 y
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Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo - FAUUSP
constituye la segunda imagen y la gran planta de Pedro Texeira de Madrid (1656) nuestro mejor
exponente de la tipología. Solo la ciudad de Mallorca (1644), de la mano del presbítero y
matemático Antoni Garau (†1657), pudo añadir su imagen a esta menguada lista de corografías en
su vertiente más "moderna" y visualmente contradictoria a la para que estrictamente
mediterránea47.
Así pues, de la misma manera que podíamos encontrar deslizamientos terminológicos entre
ciudades mediterráneas y costeras, podemos constatar un deslizamiento constante entre las
diferentes tipologías de vistas de ciudades o, por decirlo de otra, forma un trasvase de unas a otras,
sin que la localización topográfica costera redundara en la especifidad de sus representaciones
históricas.
José Manuel Gómez-Moreno Calera, El arquitecto granadino Ambrosio de Vico, Universidad, Granada, 1992, pp. 149-158.
47 Véase ahora Juan Tous Meliá, Palma a través de la cartografía (1596-1902), Ajuntament de Palma, Palma de
Mallorca, 2002.
37
Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
38
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo - FAUUSP
O Patrimônio Cartográfico Português e a Proposta para a Capital do V
Império
Esse ensaio é dedicado a Sylvio Barros Sawaya
e ao seu mestre Agostinho da Silva.
Prof. Dr. Fellipe de Andrade Abreu e Lima, Arquiteto
Considerações Introdutórias de uma Ideia
A cartografia é a arte e a ciência de traçar cartas geográficas e gráficas dos relevos, formas e
desenhos terrestres através dos quais se pode precisar melhor o mundo em que vivemos. O
estudo de sua evolução histórica pode nos ajudar a compreender o conhecimento humano e
sua progressão. Diversamente da arquitetura, por exemplo, a cartografia se ocupa de um
mundo visível e concreto. Não que a arquitetura não possua o seu mundo concreto, visível e
material, mas entendemos que também seja proveniente de um intangível, invisível e imaterial.
Portanto, a cartografia é uma ciência aplicada, sendo, portanto uma pura técnica aplicativa,
como a mapologia celeste ou náutica. É nesse ponto que devemos ter em conta que a
cartografia está intimamente relacionada com as navegações, pois a história da evolução
cartográfica entremeia-se com o desenvolvimento das navegações. Usada pela primeira vez
pelo Visconde de Santarém (1791-1856) numa carta datada de 8 de dezembro de 1839, escrita
de Paris ao renomado historiador brasileiro Francisco Adolfo Varnhagen, o termo ‘cartografia’
ainda não simbolizava tudo o que havia de técnicas de um passado glorioso Lusitano.
O primeiro momento de encontro em dicionário parece ser mesmo em 1873, no Grande
Diccionario Portuguez de Domingos Vieira, com a seguinte definição: ‘Cartographia. S.f. (De
Carta e do grego graphein, escrever). A arte de traçar cartas geographicas – Collecção de cartas
geographicas’48. Nesse sentido, parece-nos lícito dizer que a cartografia que conceituamos há
poucos séculos foi um dado filológico lusitano, apesar de sua técnica já vir de milênios antes.
O Visconde de Santarém foi o primeiro historiador da cartografia, mas não o primeiro
cartógrafo. A obra inaugural datada de 1841 intitula-se ‘Atlas composé de Mappemondes, de
Portulans et de Cartes hydrographiques et historiques depuis le VIe jusqu’au XVIIe siècle’.
Esses Atlas de Santarém iniciam uma tradição histórica única, efetivando-se como um
patrimônio português que se difunde pelos países de língua portuguesa, principalmente,
criando uma nova forma, ou ferramenta, de estudo do espaço geográfico, urbano,
arquitetônico e físico49. O objetivo do Atlas de Santarém foi o de preencher uma lacuna na
história dos descobrimentos portugueses desde o século XV, em especial à conquista da Guiné
por Azurara. Aspectos históricos e descritivos em união com aspectos técnicos e práticos
48
VIEIRA, Domingos. Grande diccionario portuguez, ou, Thesouro da lingua portugueza. Imprenssa Regia.
Lisboa: 1831.
49 Os ‘Atlas de Santarém’ foram republicados diversas vezes ao longo do século XIX. A primeira edição continha
22 fólios e 23 cartas em fac-símile. A segunda, publicada em 1842, já continha 29 fólios e 39 cartas em fac-símile.
A terceira, de 1849, continha 77 fólios e 163 fac-símiles.
39
Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
deram ao Visconde a projeção pretendida. Contudo, suas edições não apresentaram a lista
completa dos mapas pertencentes aos acervos cartográficos dos descobridores e aventureiros
dos ‘mundos’ aventurados pelos portugueses e europeus daquela época. Efetivamente, poucas
foram as cartas portuguesas publicadas em seus ‘Atlas’ nas edições de 1841, 1842 e 1849. As
duas primeiras, por exemplo, reproduziram apenas a cartografia africana dos planisférios de
Diogo de Ribeiro datadas de 1527 e 1529 e que estão conservadas em Weimar. Outro exemplo
notável de trabalho e catalogação cartográfica foi o de Souza Viterbo intitulado ‘Trabalhos
Náuticos dos Portuguezes nos Séculos XVI e XVII’ publicado em 1898-1900. Além desse,
outros menos conhecidos como Faria e Souza, Barbosa Machado e Garção Stockler reforçam
a ideia de patrimônio mundial, e não apenas europeu ou português, da arte e ciência
cartográfica desse Império. O Brasil obteve reconhecimento especial na historiografia
cartográfica. O trabalho de Duarte Leite denominado ‘História da Colonização do Brasil’
publicado em 1923 foi, apesar de já recente, o que melhor descreveu e registrou as cartas e
mapas do Brasil litorâneo até então. Em 1935 ressalta-se o trabalho de Armando Cortesão,
‘Cartografia e Cartógrafos Portugueses dos Séculos XVI e XVII’, em dois volumes, que se
consagrou pela nova abordagem histórica e metodológica. Por fim, consagra-se o mundo
cartográfico do V Império com a publicação do ‘Portugaliae Monumenta Cartographica’ que
reúne as cartas náuticas, terrestres e celestes dos principais arquivos em todo o mundo que
tenham relação com o mundo das navegações.
Há, obviamente muitos outros renomados e famosos cartógrafos desde a antiguidade e além
do mundo lusitano, desde Marino de Tiro e Cláudio Ptolomeu, passando pelos romanos como
Marcus Vipsanio Agripa; medievais como Santo Isidora de Sevilha e Frei Baltazar Franca;
chegando ao famoso mapa mundi de Richard Haldigham de meados de 1300. A história no
mundo pode ser lida através da cartografia, e os arquitetos e urbanistas devem,
prioritariamente, estudar essa técnica e/ou arte para complementar a história das ideias e das
civilizações. Portugal exerceu um papel capital nesse contexto, graças aos contextos
geográficos, técnicos e políticos que vivia desde o século XIV. Parece ser, portanto, óbvia que
a história de Portugal se relacione ou mesmo miscigene com a história da cartografia. O Brasil
e os demais países de língua portuguesa, em todo o mundo, refletem um momento da história
do mundo onde uma encruzilhada apresentou-se. Os rumos tomados foram guiados por
estrelas precisas, como eram as navegações por imprecisos navegadores. Novos mundos,
novas culturas confrontavam os europeus com eles mesmos. As novas civilizações ainda não
foram completamente respeitadas, pois os modelos civilizacionais europeus devem,
necessariamente, passar por revisão e crítica. Os rumos novos do futuro, de quem desejamos
ser enquanto sociedades, deve servir-se da história. A cartografia é um elemento nesse
contexto de nosso passado que servirá para nossa interpretação do presente e projeto de
futuro. Nesse texto pretendemos discutir os aspectos históricos já pontuados, discutindo suas
origens e motivos políticos de sua gênese. Apresentar as transformações até o surgimento da
cartografia moderna em meados de 1452 focando no surgimento da cartografia portuguesa.
Num segundo momento apresentaremos uma releitura dos mais importantes momentos da
cartografia portuguesa com as cartas de 1424, 1436, 1439 e 1448. Na terceira parte do texto
discutiremos sobre as cartas de marear, notadamente as de Jácome de Maiorca, Pedro Nunes,
João de Castro e Manuel Pimentel. Por fim, o mundo português efetivando-se como fundador
de um Império Mundial, como anunciou Gonçalo Bandarra, e o desenvolvimento da
cartografia da África e do Oriente, além do Brasil, que ocuparia parte fundamental dessa
jornada.
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Imagem do mapa de Diogo Homem 1558, British Museum, Londres
Uma Nova Idade ou A Gênese do Novo Império?
A cartografia é também uma concepção cosmológica que nos remete, se pretendermos
alcançar suas origens, aos antigos gregos do tempo de Ptolomeu. Desde os primeiros
navegadores do mediterrâneo, que tinham na cidade de Tiro o centro de desenvolvimento
náutico da época fenícia, dois nomes principais desenvolveram as técnicas cartográficas:
Marino e o já anunciado Ptolomeu. Esse último, autor da uma obra chamada geographia
compôs sua obra baseada nos ensinamentos do fenícios, criando as condições para um maior
desenvolvimento político e social da Grécia. A obra anunciada era composta de 27 mapas com
descrições detalhadas do entorno ao caminho náutico feito pelos navegadores. Nesse sentido,
as descrições já feitas anteriormente por Marino foram utilizadas por Ptolomeu desde o século
II a.c., e que serviriam para os novos modelos cartográficos da época de Mercator. Essa
herança chegou ao Império Romano, mas sua decadência ao longo do terceiro século de nossa
Era deu a outro povo a primazia dos conhecimento náuticos: os árabes. Com exceção de
alguns elementos cartográficos pontuais da parte dos romanos, os árabes foram os grandes
desenvolvedores da cartografia até o Renascimento. De acordo com as colocações de Plínio, o
nobre romano Marcus Vipsanio Agripa (63-12 a.c.) possuía um mapa mundi chamado ‘Orbis
Terrarum’, que havia sido mandado gravar em mármore no pórtico de Otávia, sua irmã. Os
romanos fizeram ainda um conjunto de mapas cartográficos chamados ‘Itinerarium Scriptum’,
sem data precisa, mas provavelmente feito no século III, no qual há a representação das
estradas romanas desde o norte da França até o Ganges50. Os itinerários romanos nasceram
50
Essa coleção de mapas é conhecida como ‘Tábula Peutingeriana’, por ter pertencido a Conrado Peutinger
(1465-1547), um célebre humanista de Augsburg possuidor de um grande biblioteca dedicada ao mundo Lusitano.
41
Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
para servirem de modelos descritivos aos viajantes e peregrinos, muitos dos quais iam do
extremo oeste europeu até o oriente, em especial à Jerusalém, havendo em vista os motivos
míticos e religiosos51. Mas se a cartografia até então – grega, romana ou árabe – não era rica,
mesmo considerando as limitações produtivas do sistema técnico, o período da Baixa Idade
Média tampouco produziu bons exemplares cartográficos. As imagens desse período eram
feitas, em sua grande maioria, nos mosteiros, sendo chamadas de ‘Cartas Monásticas’, sob
grande influência dos dogmas religiosos que viam nos mundos celestes mais realidade do que
na realidade material e natural que os cercavam. Nesse mundo artístico, como podemos
chamar, o livro ‘Topografia Christiana’ de Cosmas Indicopleustes, uma frade de Alexandria,
mostra desenhos que chegam ao oriente, numa afirmação de caminhos que já chegaram ao
Ceilão e à Índia. Esse fato de elevada relevância transporta o renascimento e suas descobertas a
mundos não antes vistos com facilidade. O oriente, portanto, já era parte do mundo conhecido
Europeu. Se pudermos arriscar uma afirmação perigosa, é a de que o ocidente europeu deve
muito mais do que podemos imaginar ao oriente desde o século V de nossa Era.
Obviamente a cosmogonia de Cosmas era baseada nas doutrinas teológicas, e sua obra negava
a esfericidade da terra e dos céus, sendo a Sagrada Escritura a verdade teológica da gênese e
formação do mundo. As cartas de Cosmas eram, portanto, reflexo direto das crenças do
mundo de então, sem antípodas que não poderiam existir, já que todos só poderiam descender
de Adão e Eva52. Santo Esidoro, o erudito humanista bispo de Sevilha – Espanha, serviu de
referência para as cartas ‘TO’, onde o oceano ‘O’ e o mediterrâneo ‘T’ eram os limites do
mundo conhecido pelos Europeus, que tinha ainda como limites o Egeu, o Nilo e o Atlântico.
Nesse universo de cartas ‘TO’ emerge mais um luso chamado Frei Baltazar de Vila Franca que
fez no início do século XV o famoso desenho, conservado hoje na Biblioteca Nacional de
Lisboa – Codice Alcobacense – chamado ‘Isidori Hispalensis Episcopi Ethimologiarum Libri
Vigenti’. Somam-se a esse alguns mapa-mundi desde o século XIII até o XVI. Podemos
anunciar, por exemplo, o Mapa Hereford de autoria de Richard Haldigham que se encontra
ainda hoje na Catedral de Hereford e datado de aproximadamente 1300. Essas cartas, plenas de
efeitos místicos e de fabulosos desenhos da mitologia antiga eram uma demonstração, mesmo
que parcial, do imaginário do mundo de então. Isso pode ser visto em muitos mapas do
período, como no Mapa de Ebstorf, nas quatro Cartas de Matthew Paris e no Mapa de Agripa,
que sofreram diversas modificações ao longo dos séculos e serviu, certamente, aos navegadores
do Império Português que se aventuravam no além-mar. As cartas, ou mapas cartográficos,
estavam ganhando força com a exploração do mundo. Hoje sabemos que o mundo Chinês
alcançou a Europa e o Atlântico quase um século antes da exploração dos Portugueses para lá.
Contudo, o mundo e a filosofia oriental não se baseia na exploração brusca, invasiva e
exploratória que tem sua gênese no capitalismo europeu. Ao contrário, pretenderam, desde as
dinastias Yuan e Qing, adotar o confucionismo e as doutrinas de Sun Wu (Sun Tzu), nas quais
as guerras ganhas são as que não são travadas.53
51
Ver, por exemplo, o ‘Itinerário de Bordéus a Jerusalém’, datado do ano 333.
Ver a obra de Lactâncio, conhecido como o Cícero dos cristãos.
53 Como cita um ministro da dinastia Han, ‘o Imperador deve mostrar sua mercê honrando-os com uma recepção
imperial em que o imperador em pessoa deverá servir-lhes vinho e comida, de modo a corromper suas mentes’.
Apud: KISSINGER, Henry. Sobre a China. Rio de Janeiro: Objetiva, 2011. p.38.
52
42
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António Sanches, 1641, Koninklijke Bibliothek, Den Haag
As revoluções que ocorriam nas cidades italianas, em especial Florença, Siena, Veneza, Pisa,
Gênova e Roma, deram frutos evolucionistas em toda a Europa. Contudo, como já sabemos
hoje, o movimento denominado Renascimento ocorreu em diversos pontos do Mundo, e seu
florescimento ocorre até mesmo antes do século XV. O Mediterrâneo sempre foi um grande
mar de trocas entre três continentes (Ásia, Europa e África). Porém, muitas razões
convergiram para que a Itália fosse o berço de expansão de uma nova Era para o mundo.
Outras razões já conhecidas favoreceram a expansão marítima portuguesa pelo mundo, desde a
sua geografia beirando o Atlântico, até a língua que unificava aquela pequena parte da Europa
Ibérica a se aventurar ao mar e descobrir novos mundos até então pouco conhecidos. Nesse
momento do século XV surgem as ‘Cartas Portulanos’, nas quais o Mediterrâneo ainda é o
foco principal de exploração comercial. A busca para as Índias, sem passar pelo Oriente Médio
e pela Ásia Continental seria a salvação comercial e econômica de qualquer nação. Coube ao
Luso a coragem de explorar-se no mar aberto além das colunas de Hércules, num mundo
herdeiro das tradições de Ulisses, afinal, o mito de Ulisséia já pairava desde as origens de
Lisboa. A Escola de Sagres reinou nas suas observações da natureza e as representações
míticas e ilusórias da Idade Média passaram, de uma vez por todas, para o passado. Há uma
observação fundamental nesse contexto, as relações entre Portugal e a Itália, em especial com
as Repúblicas Marinaras como Gênova, foram de fundamental importância para as aventuras
náuticas do povo Português. A exploração começou e chegou aos arquipélagos do Atlântico,
com passagens pela Madeira, Açores e Cabo Verde. Em terra firma a Guiné-Bissau tornou-se
um porto de abastecimento e as Canárias já eram um porto Lusitano desde 1336. Essas ‘Cartas
Portulanos’ já eram em fins do século XV o principal acervo cartográfico de orientação de
todo o Mundo Mediterrânico. Suas demarcações iram desde o Oriente Mediterrânico até as
43
Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
Ilhas Atlânticas, chegando mesmo até o Cabo Bojador. Há ainda questões que deixam dúvidas
nos dias de hoje, pois foi com o contato com a China que a Europa pode desenvolver o
conhecimento de latitude e longitude que havia sido inventado pelos orientais, mas bem
apropriado e aperfeiçoado pelos portugueses patrocinados pelo Infante D. Henrique na
segunda década do século XV.
As ‘descobertas’ das terras e culturas africanas começaram a tomar conta do imaginário
português e a criar a cultura marítima daquele povo, numa empresa corajosa e fantasiosa sem
precedentes na história desde a consagração do Império Romano, que vivia ainda em imagem e
disputa de herança por muitas nações da Europa continental e mesmo de além-mar após as
conquistas das Américas. Até aquele momento, Portugal e Espanha eram as duas principais
potências náuticas, e a ‘divisão’ do mundo recém ‘descoberto’ estava em jogo e negociação nas
mesas reais. Essas disputas tiveram como produto o aperfeiçoamento técnico e muitas brigas e
relações diplomáticas, que acabariam com a União Ibérica durante quase um século. Nesse
momento podemos anunciar que a história da cartografia é também parte da história do
mundo e vice-versa. Ambas as histórias se entrelaçam de forma ímpar, efetivando esses
documentos como uma prova e evidência material que pode ser usada como método científico
de novas formas de ver o mundo. A cartografia evidencia-se, assim, como uma ferramenta para
melhor se estudar e compreender os movimentos sociais, políticos, culturais, religiosos,
econômicos e culturais. Talvez essa ferramenta seja uma das mais importantes formas
registradas de ver o mundo que já foi inventada pela humanidade. O estudo da arquitetura e do
urbanismo, da sua teoria, história e crítica, além da formação das nacionalidades e grande parte
da história do mundo desde séculos antes dos primeiros Gregos passa obrigatoriamente pelo
uso da cartografia como ferramenta de análise histórica. Nesse contexto, a evolução
cartográfica evidencia as transformações sobre o conhecimento humano do mundo em que
vivemos, sendo um segundo passo o estudo das questões políticas, econômicas e culturais que
estão relacionadas com a confecção de todas essas cartas cartográficas.
Essa nova ‘Idade’ vivida pelo mundo desde os fins do século XV e início do XVI marcaram a
história da humanidade de forma absoluta. Nesse momento algumas nações atingiram
proeminência em aspectos únicos. A arte italiana, por exemplo, fez nascer catedrais
descomunais, pinturas e esculturas magníficas, teorias da arte até hoje fundamentais. O norte
da Europa fez nascer fundamentos políticos e críticas ao pensamento teológico e religioso de
elevada grandeza que transformaram as ideias de liberdade e de ética, fundamentando um
mundo conhecido como protestante, onde o bem estar social atingiu elevados valores e
índices. Coube a um pequeno país espremido entre a rica Espanha e um oceano tenebroso e
desconhecido a coragem de abrir os olhos para o que estava diante de seu rosto: um mar de
ligação que serviria para fundar um novo Império. Navegadores, cosmógrafos, cartógrafos e
descobridores se atiraram ao mar e às conquistas, marcando a história da humanidade e
formando as bases para um novo Império que ainda está em formação e que adormece para
acordar num futuro breve.
A História do futuro passou pela ‘Ilha dos Amores’, chegou ao limite do Sol nascente e
circundou a terra largando sementes por onde foi possível. Um país com aproximadamente
meio milhão de habitantes foi o primeiro a atingir essa eficácia, e fundamentalmente, a prever
um futuro. Do Brasil ao extremo Oriente, forjava-se as bases do V Império anunciado por
Gonçalo Bandarra, o sapateiro de Trancoso, que já conhecia as escrituras e as profecias de
44
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo - FAUUSP
Daniel. Esses aspectos míticos sempre fizeram parte do mundo do imaginário dos herdeiros
do mito de Roma, mas o fato de acreditar e se lançar ao ato era algo presente apenas nos
horizontes dos Imperadores, não às pequenas nações. Nesse contexto faz jus citar o Jesuíta
Joseph François quando afirmou que ‘Pendant ce long period de temps, on voit cette nation, dans le cours
d’une histoire liée & toujours interessante, vaincre les obstacles les plus insurmontables par une patience & un
courage à l’épreuve, mettre de grands hommes et tout genre sur la scene, prendre l’ascendant partout où ils se
montrent malgré leur petit nombre, établir leur réputation & leur domaine sur la ruine dês Empires, & forcer
en quelques sorte la fortune à les seconder toujours par d’heureux succès. Cela doit paroître d’autant plus digne
d’admiration qu’à considerer en soi le Portugal, qui est um Royaume assez petit, il n’étoit pás naturel de
présumer qu’il put trouver em lui-même tant de ressources, former de si vastes entreprises, ambrasser une aussi
grande étendue de pays, & mettre en ouvre un si grand nombre sujects capables de faire réussir ses projets avec
tant de gloire. Les découvertes & les conquêtes dês Portugais ont eu trop d’éclat dans leur temps pour êtres
ignorées’54
A Cartografia Moderna; Portuguesa
Se desde o século XIII as cidades italianas estavam avançando no desenvolvimento graças ao
comércio com o oriente, difundindo pela Europa as mercadorias vindas da Índia e da China, os
séculos seguintes conheceram nas navegações espanholas e portuguesas as novas formações
nacionais da Era Moderna. Não devemos esquecer que, mais uma vez, o mundo não-europeu
deu à Europa o conhecimento de algarismos e numerações matemáticas desconhecidas. Desde
o zero até os números decimais, desde a latitude vinculada à longitude, desde muitos
instrumentos de navegação a armamentos e técnicas de impressão, o mundo árabe africano e
oriental sino-indiano forneceram à Europa os elementos que fundamentaram sua hegemonia
no mundo desde os ‘descobrimentos’. Esses mundos novos, assim conhecidos por lá, eram na
verdade bem anteriores ao que se conhecia deles. O Oriente era extremamente desenvolvido 4
mil anos antes dos gregos e as Américas já povoadas desde as primeiras civilizações Egípcias.
Apesar de não podermos datar especificamente o mundo Americano, sabemos que o Oriente,
especialmente a China e a Índia com seus arredores eram densamente povoadas e
desenvolvidas, contudo, baseadas numa cultura de não expansão, mas de aglomeração
voluntária. Apesar do exposto, não podemos tirar os méritos de grandes pensadores como
Leonardo de Pisa e Raimundo Lúlio, para citar apenas alguns do fim da Idade Média, que
contribuíram intensamente para a cartografia com suas contribuições matemáticas e
geométricas.
Foi nesse contexto que as ‘Cartas Portulanos’, descritivas dos portos mediterrânicos e parte
conhecida do Atlântico, contribuíram para descrição e configuração das costas conhecidas da
Europa, Ásia e África. Dentre as ‘portulano’ mais conhecidas estão a mais antiga delas,
chamada ‘Carta Pisana’ datada de 1270-1300, que abrange desde o Mar Negro até a Península
Ibérica, com precisão incrível e rotas que formavam os ‘rumos’, dando origem ao que viria ser
conhecido como rosas dos ventos. Essas rosas significaram a aplicação científica de
observação marítima e celeste precisas, mas também o uso de bússolas ou agulhas magnéticas,
que sabemos hoje foram inventadas no Oriente, bem possivelmente na China. Considerando
que as latitudes não eram conhecidas até o contato mais intenso com o Oriente, o uso das
54
LAFITEAU, Joseph François. Histoire dês Découvertes et Conquestes dês Portugais dans le Nouveau Monde. Paris: 1733.
45
Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
agulhas já era parcialmente dominado graças aos viajantes que as usavam para as rotas da seda
e de comercio desde os tempos remotos. Assim, as rosas dos ventos desenvolvidas com oito
rumos, passou a ter pouco tempo depois dezesseis e até mesmo trinta e dois rumos. As ‘Cartas
Portulanos’ são, portanto, a primeira grande contribuição moderna da cartografia, algumas que
antecedem até mesmo o século XIV. A ‘Portulano de Petrus Vesconte’, por exemplo, data de
1311. O Oceano Atlântico foi uma extensão do Mar Mediterrâneo, não apenas por sua ligação
a partir das Colunas de Hércules, mas por ser um caminho de fuga dos impostos e altos custos
do comércio com o oriente que passava pela Eurásia.
Apesar das navegações portuguesas serem fato histórico desde meados do ano 1000, foi no
reinado de D. Dinis (1279-1325) que passou a contar com uma armada marinha nacional,
unificada com uma identidade única e com objetivos mais claros de expansão e afirmação de
poder. Essa política que continuou nos séculos seguintes só perderia força no século XVIII,
impulsionada com as guerras napoleônicas e a vinda da família real ao Brasil. Apesar disso, foi
na primeira metade do século XV que o Infante D. Henrique, o navegador, levou muito
adiante a política naval portuguesa, que foi também adotada pelo D. João III. Nesse século
Portugal circundou o mundo e fez um Império em todas as partes do mundo que se conhecia.
As políticas náuticas já haviam começado desde o século XIII, quando D. Dinis havia
mandado cultivar as árvores para fornecer as madeiras no Pinhal da Leiria, dando início às
construções de naus de guerra e circum-navegação. Foi desse mesmo período a criação da
Universidade (1290), integrando Portugal na cultura europeia e nas discussões míticas sobre
restaurações imperiais. Portanto, se inicialmente a discussão era uma única alternativa de
sobrevivência da nacionalidade portuguesa e suas relações com a economia, num segundo
momento essa cultura passou a poder pensar sobre suas missões enquanto herdeiras de um
mundo mais antigo, que poderia favorecer o pensamento sobre o futuro. Essas evoluções, se é
que podemos utilizar essa palavra para descrever o processo histórico reconhecível de uma
sociedade que opta por isso, são uma consequência direta de uma necessidade para fins
práticos, como seria esclarecido por sociólogos séculos depois. Portanto, os conhecimentos
astronômicos e científicos estavam sendo usados para o desenvolvimento social de uma nação,
e também, para uma materialização de um sonho utópico e mítico: a formação de um Império.
Esse Império forjou-se com ideais míticos presentes desde o tempo de D. Dinis, que visitando
a Universidade que ajudara a formar conheceu um código de precioso de códices, em verdade
um volume de mapas astronômicos e cartográficos portugueses já antigos, chamado de
‘Tabulae astronomicae’, pertencente hoje à Biblioteca Nacional de Madrid. Esse volume de 55
mapas em pergaminho foram revelados apenas em 1867 através da edição intitulada ‘Libros del
Saber de Astronomia del Rey D. Afonso X de Castilla’55. Esse volume tratava desde signos
astronômicos com signos do zodíaco até coordenadas celestes de interesse astrológico. Apesar
de essencialmente astronômico, esse ‘Almanaque de Coimbra’, como foi chamado por Jaime
Cortesão, abriu uma reflexão sobre a função dos astros e sua aplicabilidade para as navegações,
ou seja, para um projeto político e mítico já adotado pela erudita cultural portuguesa. Sendo
55
Um estudo sobre esse volume foi feito apenas no século XX por Jaime Cortesão. Ver também: CORTESÃO,
Jaime. Influência dos Descobrimentos Portugueses na História da Civilização. Lisboa: Imprensa Nacional Casa da
Moeda, 1993. Almanaques Astronómicos de Madrid. In: Os Descobrimentos Portugueses. Lisboa: Imprensa
Nacional Casa da Moeda, 1990. Ver ainda: CORTESÃO, Armando. The North Atlantic Nautical Chart of 1424.
In: Imago Mundi, Vol. 10 (1953), p. 1-13.
46
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo - FAUUSP
transferida para Coimbra em 1307, a Universidade fundada por D. Dinis recebeu uma cópias
dessas tábuas conhecida naquele momento como ‘Libros del Saber de Astronomia’, e sua cópia
foi feita em Toledo entre 1252 e 1256. A universidade favoreceu esses conhecimento e
solicitaram uma grande compilação de livros e mapas do mesmo gênero, e receberam obras
como a ‘Tabulae Astronomicae’ de Jacob Machir. Talvez essa obra seja a mesma que hoje
pertence a Biblioteca da Ajuda, intitulada ‘tabulae Astronomicae composite post tabulas
Aphonsi circa añu gratiae 1321’, sob código 52/VI/25.
Bem provavelmente desde o século XIV Portugal já estava criando a sua biblioteca de
cartografia com fins políticos e econômicos, mas também míticos, para realizar suas
navegações. Mas senpre com objetivos maiores, foi no século XV que esses resultados
alcançaram proporções maiores e mais eficazes. Nesse contexto de intenso contato com os
Italianos, principalmente genoveses, Portugal fez explorações e viagens que culminaram no
mapeamento e criação de pontos de apoio nas Canárias, sob a colaboração do Genovês
Lanzarotto Malocello, em 1336, ainda no século XIV. Outras ilhas das Canárias e da Madeira
foram redescobertas em 1339. As ilhas dos Açores (Corvo e São Miguel) foram também portos
de atracamento português em fins do século corrente. Já emergia discussões sobre os mundos
míticos, e essas duas ilhas estavam sendo associadas às ilhas de São Brandão, que se falava
desde séculos anteriores. Essas notícias e desenhos feitos pelos navegantes já podiam ser vistos
nos mapas-múndi italianos de Maiorca e de Dalorto, já em 1339. Muitas cartas espanholas e
portuguesas entre os anos de 1342 e 1393 já mostravam esses conjuntos de ilhas e
arquipélagos, inclusive numa já disputa territorial e política entre essas duas nações.
Infelizmente o terremoto de 1755 arrasou a maior parte dos mapas e cartas portuguesas do
século XV, pois parece que a maioria destas estavam guardadas no paço da Ribeira e nos
Armazéns que foram destruídos com os eventos sucessivos ao terremoto. Mas há uma
informação relevante que merece ser colocada.
Num trabalho chamado ‘The Nautical Chart of 1424’56, Jaime Cortesão revela a existência
dessa carta Veneziana na qual figura o Atlântico com parte da África e seus arquipélagos das
Canárias, as ilhas no Atlântico Norte (Irlanda e Inglaterra) mas, curiosamente, um conjunto de
ilhas denominadas Antilia, antigo nome das Antilhas, que inclui ainda ilhas como Sanatanzes e
Saya. A partir de então, as cartas portuguesas passaram a ser sempre utilizadas pelos
cartógrafos italianos, holandeses e ingleses para confecção dos mapas cartográficos e dos
mapas oceanográficos, tornando esses patrimônios portugueses que serviam ao mundo. O atlas
de Andrea Bianco de 1436 também já parece mostrar grande parte do Atlântico e o Mar de
Baga, passagem de volta dos roteiros pela costa atlântica da África. A carta de Gabriel de
Valsecca datada de 1439 já mostrava nove ilhas do conjunto de Açores,o que implica viagens
anteriores a esse ano, relevando ainda que em 1439 Dom Afonso V concede ao Infante D.
Henrique a autorização para colonizar os Açores. Outra data importante dos mapas
cartográficos portugueses é o ano de 1448, no qual o veneziano Andrea Bianco fez aparecer
em Londres um conjunto de 34 cartas sob o nome ‘Andrea Biancho, venician comito di Galia
mi fexe a Londra MCCCCXXXXVIII’. Esses mapas mostram o Cabo Bojador, Cabo Verde e
Cabo Roso, sendo esses os limites da Guiné Bissau Portuguesa, já registrada em documentos
em 1445 por Álvaro Fernandes.
56 CORTESÃO, Armando. The North Atlantic Nautical Chart of 1424. Imago Mundi, Vol. 10 (1953), p. 1-13.
Ver ainda: An Early Chorographic Map of Portugal. In: Imago Mundi, Vol. 19 (1965), p. 111-112.
47
Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
As cartas da segunda metade do século XV foram fundamentais para as relações íntimas entre
Portugal e Itália, e dessa forma a incorporação portuguesa do mito de restauração da opulência
romana. Fra Mauro, um veneziano frade e cartógrafo, por pedido de D. Afonso e do Infante
D. Henrique, fez um mapa-múndi com todas as informações sobre os continentes, objetivando
a avaliação das viagens de circum-navegação, entre 1457 e 1459. Hoje, a cópia que foi feita por
segurança ainda se encontra na Marciana e pode servir de evidência aos projetos míticos, como
já dissemos, e políticos que Portugal tinha em foco. Entre 1460-1461 Pedro de Sintra chegou a
Serra Leoa, atual Libéria, e seus desenhos serviram de base para o mapa de Grazioso
Benincasa, feito em Veneza em 1468. Angola, localizada a 13 graus e 25 segundos foi atingida
em meados de 1489 como consta nas Cartas de Soligo. A viagem de Bartolomeu Dias entre
1487-1488 deu frutos que podem ser vistos no Mapa-Múndi de Henricus Martellus de 1489,
incluído no volume ‘Insularium Illustratum Henrici Martelli Germani’. Essa viagem marcou a
chegada ao Cabo da Boa esperança, quando o astrolábio marcou 45 graus em relação ao
equador. Sem dúvida essas notificações e descobertas foram fundamentais, mas nada mais do
que a inclusão das latitudes nos mapas, fato que nos revela uma íntima relação com a cultura
oriental, feita de algum modo, antes da chegada das caravelas a Goa ou Macau. Algumas dicas
nos chegaram com os mapas graduada em latitudes, como a carta de Claudio Clavus,
escandinavo, datada de 1427. Mas essas eram cartas não destinadas a navegações e que faziam
uso do sistema ptolomaico, um alexandrino mais ligado ao mundo árabe e oriental que ao
mundo europeu. A primeira tradução ao latim, como sabemos, é datada de 1472, e foi
fundamental até 1490, considerando que nesse pequeno intervalo foi republicada sete vezes.
Bartolomeu Velho, 1568, Bibliotèque Netionale, Paris
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Sem dúvida, essas novas cartas foram surpreendidas com o Atlas Miller, também conhecido
como o Atlas de Lopo Homem-Reineis, pois é um atlas português datado de 1519. Essa obra,
ricamente ilustrada apresenta mais de uma dezena de cartas náuticas. Esse respeitável trabalho,
profundamente bem executado, possui trabalhos de um conjunto de cartógrafos como Lopo
Homem, Pedro Reinel e Jorge Reinel, e foi ilustrado pelo miniaturista António de Holanda, pai
do tratadista português Francisco de Holanda, estudante junto a Michelangelo Buonarrotti, e
que traria a Lisboa a ideia mítica de ser a capital do Império Português. Esse atlas apresentou
as zonas geográficas dos Oceanos Atlântico Norte, a Europa do Norte, o Arquipélago dos
Açores, a ilha africana de Madagáscar, o Oceano Índico de forma quase completa, e ainda a
Indonésia, o Mar da China, as Molucas, o Brasil e o Mar Mediterrâneo detalhado. A
característica política principal desse volume é a página de rosto, que apresenta as armas
de Catarina de Medici com a inscrição ‘Hec est universi orbis ad hanc usqz diem cogniti, tabula
quam ego Lupus homo Cosmographus, in clarissima Ulisipone civitate Anno domini nostri,
Millessimo quigentessimo decimo nono jussu, Emanuelis incliti lusitanie Regis collatis pluribus,
aliis tam vetustorum quae recentiorum tabulis magna industria et dilligenti labore depintii’, e
parece ter sido um presente de D. Manuel I de Portugal ao Rei Francisco I da França. As
relações políticas evidenciadas entre os reinados europeus já demonstram interesseis nacionais
e disputas: no caso específico a autonomia de Portugal em relação a Espanha, que estava
planejando um grande império sob Domínio do escorial de Felipe II. um outro destaque do
Atlas Miller é o detalhado mapa ‘Terra Brasilis’, considerando sua extensão geográfica feita em
menos de vinte anos após o desembarque de Pedro Álvares Cabral. Parece que a forma como
esse mapa mostrou um mundo fechado, onde não se vê o oceano Pacífico, tenha sido
interpretada como uma tentativa de dissuadir a circum-navegação que Fernão de
Magalhães então preparava em Sevilha, na corte de Carlos I de Espanha.
Por fim, para não nos estendermos demais nas contribuições individuais do mundo
cartográfico português, podemos citar o cosmógrafo e matemático Pedro Nunes (1502-1578),
autor do ‘Tratado em Defesam da carta de Marear’, que inclui o ‘Tratado da Sphera’, publicado
em Lisboa em 1537. Portugal entrava, definitivamente, no círculo de grandes capitais,
disputando primazias intelectuais e científicas com as grandes nações do mundo. A projeção da
carta em superfície plana, fato de maior preocupação desde a ‘Geographia’ de Ptolomeu, foi o
grande salto que atingiu as cartas de Marear. Seguindo a maestria de Pedro, seu
contemporâneo, Dom João de Castro (1500-1548) fez estudos de magnetismo e suas
influências nas navegações que faziam uso de bússolas, instrumento que sofria interferências
diretas dessas forças invisíveis. Além dessas contribuições, Pedro Nunes e João de castro
fizeram estudos dos portos portugueses em todo o mundo, contribuindo com os estudos do
geomagnetismo, no estudo das marés e das formações submersas dos oceanos. Os ‘Roteiros’
de João de Castro serviram de livro de consulta a todos os navegadores que passavam por
portos portugueses em todo mundo, e contribui ainda num comentário ao tratado de Pedro
Nunes chamado ‘Tratado da Sphera, perguntas e respostas a modo de Diálogo’.
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Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
Considerações Finais : Sobre um Português – Francisco de Holanda
Parece haver, no nosso entender, uma maneira lusitana de fazer-se no mundo. O estudo das
profecias de Bandarra, da herança do mito Romano descrito por Tito Lívio, e as tentativas
nacionais europeias de criarem uma capital à Imagem da Roma Caput Mundi faz-nos repensar
as contribuições portuguesas ao mundo. Parece que Portugal veio para o Brasil, e deu a esse
grandioso país a maior de todas as heranças possíveis. Podemos supor, num arriscado
argumento desproporcionado, mas também desproposital e longe de atingir critérios de
cientificidade, que a obra de Francisco de Holanda, arquiteto e tratadista já mencionado acima,
que havia uma novidade mítica e artística presente no imaginário português. Essa Antiqua
Novitas instaurada por Francisco de Holanda é a sua maniera de compreensão do antigo. A
sua metodologia de restauratio. Restauração do mito de sede de um grande Império, do
Império que Fernando Pessoa tratou como o da Língua Portuguesa, mas que Padre Antônio
Vieira, Camões e Bandarra haviam já refletido bem antes. Não há, portanto, para Holanda,
uma aparente contradição entre a ideia artística de origem divina e a imitação seletiva de
elementos artísticos ou da natureza. Aliás, a antiguidade serve como referência a ser seguida,
não como modelo rígido, mas como modelo metafórico vivo a ser reinterpretado e aos olhos
do novo mundo. A anunciação de suas mensagens ao longo de sua esparsa obra remete-nos às
suas citações de Hermes Trismegistus como enigmas, como aquele que escreve na imagem
final de ‘Da Ciência do Desenho’57, quando diz que “et conscius meus in excelsis”, pois a
tristeza se tornará alegria.
A ‘Prisca Pictura’ é, portanto, a ‘Maniera Lusitana’, segundo nosso entendimento, de ideia de
arte de Francisco de Holanda. Sendo, como ele mesmo anunciou, pintura, escultura ou
arquitetura, manifestações que fazem uso do desenho, da antiga pintura, como entendiam os
antigos, a ideia de cidade está presente ao longo de toda a sua obra. As leituras devem ser feitas
como na figura de Lisboa, mulher sóbria coroada, rainha dos mares e oceanos que carrega uma
nau em seus braços, símbolo de daquele império marítimo que buscou levar a maniera dos
antigos a novas terras aparece ilustrada no tratado ‘Da Fábrica que Falece’ de Holanda ainda
no início do texto ‘da Fábrica que Falece’. A maioria dos estudiosos sobre a obra de Holanda o
coloca como um intérprete da maneira dos Romanos, ou seja, como um teórico que pretendia
dotar Lisboa de marcos, monumentos, e edifícios de valor simbólico, já que esta seria a capital
de um novo Império. Exaltar as contribuições de Francisco de Holanda e colocá-lo como um
‘profeta’ de um novo império é já bastante louvor à sua figura. Entender ou supor que
Holanda percebeu na capital lusa e nas profecias do sapateiro de Trancoso uma razão
perceptível como destino, é já dotá-lo de grande mérito. Mas se pretendemos como objetivo
implícito acabar com a ideia de mérito, pois somos todos herdeiros de uma antiguidade e
reprodutores míseros de modelos anteriores, esse trabalho estaria apenas dando um passo além
dos que já foram dados por aqueles que nem chegaram a observar nos desenhos de Holanda as
mensagens implícitas; leram apenas as linhas escritas em tipos, não as sublimadas em espaços
57 HOLANDA, Francisco de. Da Ciência do Desenho. Lisboa: Livros Horizonte, 1985. p.47. f.50v. Ver Livro de
Jó, 16-21, (Ecce enim in cælo testis meus et conscius meus in excelsis). Holanda cita Hermes no capítulo 12 de seu ‘Da
Pintura Antiga’. “Proavi nostri invenerunt artem qua Deos eficerent quoniam animas facere non poterant”, ou seja, Nossos
antepassados já que não poderiam produzir almas produziram deuses. E ainda: “Sicut Deus ac Dominus ut sui similes
essent Deos fecit aeternos, ita humanistas Deos suos ex sui vultus similitudine figuravit”, ou seja, Para o Deus e Senhor, para
os deuses serem semelhantes a si mesmo, os fez eternos. Tradução nossa. Idem. Da Pintura Antiga. Lisboa:
Livros Horizonte, 1984. Capítulo 12. p.38.
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Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo - FAUUSP
incomensuráveis. Se esses que nem chegaram a perceber que a imagem da ‘Potestas’ do Álbum
das Antigualhas58 reportava a Lisboa como ‘Nuovo Caput Mundi Imperium’ seria exigir em
demasia que o mérito esteja na reprodução de uma leitura dentro de um mesmo sistema
linguístico.
Essas concepções explicam por uma nova ótica as querelas renascentistas entre as artes, os
motivos da recuperação dos antigos pelos renascentistas desde o século XIV ou até mesmo
antes nas doutrinas organizativas tomista e agostiniana, as críticas sobre o universo e os
mundos, a discussão sobre as formas de governo, culminando na crise da incredulidade no
século XVI, e daí por diante. A imposição desses modelos, seja da recriação de uma Caput
Mundi, em qualquer das grandes capitais europeias, seja em novos mundos já conhecidos –
África e Oriente – ou desconhecidos até meados de 1490 – Américas, não passou de uma
reprodução de uma ideia anterior. É nesse ínterim que se exalta a figura de novas culturas e
novos modelos. Por que também não as novas linguagens das metáforas vivas,
transformadoras, perceptíveis apenas para alguns eleitos que conseguiam superar os obstáculos
epistemológicos da cultura. A valorização de cada um dos povos do mundo que fazem seus
patrimônios é valorizar a todos os modelos, forjados ao longo de milênios. Não seria
concebível entendê-las sem serem vividas. Apesar de tudo, muitas dessas formas e modelos se
perderam, ou se transformaram de forma tão ativa que se deformaram para nos servir de
análise, ao menos. Impossível julgar um valor e uma cultura com nossos olhos externos a ela.
Da mesma forma, impossível modificá-la ou tomá-la como modelo transformador estando
imerso. Exaltemos os novos modelos, para que aqueles tidos como gênios, mas que recriaram
a partir de modelos anteriores, sejam considerados apenas recriadores, e não mais semideuses.
Imagens do Livro das Antigualhas de Francisco de Holanda, 1570.
58
HOLANDA, Francisco de. Álbum dos desenhos das Antigualhas. Lisboa: Livros Horizonte, 1989.
51
Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
O mito de um novo V Império, além-mar e atingido através de projetos arquitetônicos, sejam
urbanos, sejam de Impérios que se baseiam na força dos sentimentos míticos, perenes e ternos,
que se validam de forças inconscientes do ser humano, confirmando, portanto, ser o mito além
de um tempo e espaço. O fim de um mundo finito dos reinterpretes de Roma no século XV e
XVI e a ascensão de um novo modelo de mundo, maior, planetário, inserido num sistema
universal maior ainda, no qual as estrelas davam as precisões necessárias à navegação, fez
nascer novos Impérios. Seja luso ou hispânico, brasileiro, africano, oriental, o novo mundo
circunda a terra, e as reinterpretações míticas devem adquirir argumentos maiores de toda a
humanidade, uma única e grande família. Miscigenando pessoas, culturas e mitologias, as novas
interpretações de mundo, do que é o ser humano, deve caminhar para a constante questão de
quem somos e do que desejamos enquanto criadores de novas interpretações de modelos
antigos, mas que observam ao futuro.
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La ville (idéale?) chez Alberti
Prof. Dr. Michel Paoli
1. Homme idéal propose ville idéale, bon rapport qualité-prix.
Pourquoi l’idée de «ville idéale» est-elle souvent associée au nom d’Alberti, et cela est-il justifié?
Lorsque l’on pense à la ville idéale à la Renaissance, on pense à des projets, éventuellement à
des réalisations; des images surgissent en nous. Or il n’est pas rare de trouver le nom d’Alberti
mêlé à ces projets ou ces images qui ont trouvé ou non une forme de réalisation. En ce qui
concerne le XVe siècle, au moins trois idées viennent immédiatement à l’esprit: les ambitieux
projets de restructurations de la ville de Rome sous le pontificat de Nicolas V; l’aménagement
«urbain» du bourg natal du pape Pie II, Pienza; les trois panneaux dits des «cités idéales»
d’Urbino, Berlin et Baltimore (et en particulier le premier des trois). Dans tous ces cas, même
si l’on ne dispose que d’une documentation très limitée voire inexistante, le nom d’Alberti
semble émerger avec évidence car il est courant de voir son nom cité comme celui d’une sorte
d’imprésario occulte qui nourrirait l’Italie entière de ses idées.
Il ne serait pas difficile de montrer que cela est d’ailleurs valable pour l’ensemble de sa vie et de
ses interventions les plus connues. Lorsqu’on propose, par exemple, de reconnaître Alberti
dans une fresque peinte par Masaccio en 1427 au milieu d’artistes aussi renommés que
Brunelleschi, Donatello et Masaccio lui-même, on fait de lui un prodige de 23 ans qui ferait
succomber tout le monde sous son charme intellectuel. Les connaissances sur la vie d’Alberti,
sur son milieu familial, professionnel, amical, relationnel ayant beaucoup évolué ces dernières
années, en particulier à l’occasion des quinze colloques qui ont ponctué l’année du sixième
centenaire, il nous est plus facile de nous interroger sur la justesse de cette représentation. Or
l’on est obligé de convenir qu’à 23 ans, Alberti n’était à peu près rien, ou pas grand chose, et le
peu qu’il avait écrit ne lui avait pas permis de se distinguer radicalement de ses camarades
d’études. Il est donc très hautement invraisemblable (voire, à d’autres égards, totalement
impossible) qu’Alberti ait été reconnu par le milieu artistique florentin comme un personnage
de premier plan dès 1427.
53
Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
Le problème essentiel auquel nous avons à faire face, c’est que cette image d’un Alberti qui
fournirait des idées aux artistes, aux humanistes, aux princes de son époque persiste sur toute
la durée de sa vie. Depuis plusieurs décennies, chaque fois qu’une nouveauté promise à un bel
avenir est identifiée par la recherche, elle est attribuée au grand pourvoyeur d’idées Alberti.
D’une certaine manière, ne sachant pas comment expliquer le surgissement de tant de
nouveautés, l’on a tôt fait de les attribuer à une source unique, une sorte d’incarnation parfaite
de la Renaissance, un héros permettant à lui seul de tout expliquer.
Or, cette image, partiellement fabriquée par Alberti lui-même dans son autobiographie,
perfectionnée à l’époque néo-classique et romantique en extrapolant à partir de quelques
informations éparses, est définitivement popularisée, à très grande échelle, par Jacob
Burckhardt dans sa Civilisation de la Renaissance en Italie. A partir de ce moment, Alberti
devient l’homme universel, l’homme de la Renaissance; il est l’incarnation parfaite des vertus
de son temps. Dès lors, quoi de plus naturel que de voir l’homme idéal inventer la ville idéale?
Il importe de comprendre que, par delà les données dont on dispose pour défendre des
attributions, le fait de poser la marque d’Alberti sur les travaux romains de Nicolas V (en
grande partie non réalisés), sur le réaménagement de Pienza ou sur la «cité idéale» urbinate naît
d’abord de cela: Alberti semble être la clé universelle pour ouvrir toutes les portes - une clé
sans doute trop commode.
En effet, une lecture attentive des oeuvres écrites, qui contiennent de très nombreux
indications biographiques, la découverte de nouveaux documents, l’application de nouvelles
54
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méthodologies (à commencer par la relecture de toute la tradition critique), nous permettent de
dire que la vie d’Alberti a été avant tout un long et difficile combat, celui d’un enfant illégitime
né alors que sa famille était en exil, qui se retrouvera vite orphelin, rejeté par une partie de sa
famille, par sa patrie, Florence, par son milieu intellectuel, les humanistes, probablement aussi
par les artistes florentins de son temps, et qui devra se battre pour se faire reconnaître - chose
qui n’interviendra que vers la fin de sa vie, à partir des années 1460.
Qu’on ne se méprenne pas: Alberti avait des capacités immenses, hors norme, et la partie de
son oeuvre qui est arrivée avec certitude jusqu’à nous suffit amplement à le démontrer. Mais
cela ne l’empêchait pas d’avoir des ennemis, y compris au sein de sa propre famille. On serait
même tenté de dire qu’il avait des ennemis à la hauteur de ses capacités, qui étaient grandes.
C’est d’ailleurs probablement parce que, dans un premier temps, il est méprisé par une partie
de ses contemporains qu’il se donne les moyens de hausser encore davantage son niveau à des
hauteurs jamais atteintes.
On a ainsi longtemps présenté Alberti comme un ami de Brunelleschi. Le seul et unique
élément dont nous disposions pour le dire est la lettre de dédicace du De pictura. Or, des
études philologiques (conduites principalement par Lucia Bertolini) ont prouvé qu’il n’existe
qu’un manuscrit de ce texte et qu’il se trouve dans un codex de travail possédé par Alberti luimême. Si Leon Battista a a adressé cette lettre à son illustre aîné, il est presque certain que ce
dernier n’en a rien fait, probablement parce qu’il n’avait pas apprécié le cadeau (il est vrai que le
jeune homme disait être le premier à avoir formulé ce que le vieil architecte avait en réalité
découvert deux décennies plus tôt, c’est-à-dire la perspective). Souvenons-nous que, dans le De
re aedificatoria, dont la rédaction commence dans les années 1440, l’oeuvre du premier
architecte de la Renaissance n’est même pas évoquée allusivement: elle n’existe tout
simplement pas. Si Alberti avait été l’ami de Brunelleschi, en aurait-il été de même? On ne peut
alors exclure qu’Alberti ait consacré toutes ses forces à l’architecture précisément pour
répondre au mépris de Brunelleschi.
Dans ses oeuvres écrites des années 1430 et 1440 (on pense en particulier aux Intercoenales),
Alberti ne cesse de faire allusion à ses obtrectatores, ses détracteurs, ceux qui dénigrent son
travail, qui le critiquent et contre lesquels il doit se défendre, avant tout moralement. Il existait
certes, dans son entourage, des gens qui aident le jeune homme aux talents si prometteurs (on
pense à son lointain cousin Francesco d’Altobianco degli Alberti ou au prélat Alberto degli
Alberti, et, au fond, Alberti insiste assez peu sur eux), mais imaginer qu’il était universellement
bien reçu est devenu tout simplement indéfendable. Le reconnaissance qu’il finira par obtenir
est une véritable conquête, pas un cadeau qui lui est servi sur un plateau dès sa jeunesse. Et
cette reconnaissance ne viendra que tardivement, dans les dix dernières années de sa vie (14621472).
2. La part d’Alberti dans les cités idéales.
Dès lors que l’avancée des recherches albertiennes nous prive de l’expédient commode de
l’Homme universel, reconnu par tous comme une autorité, capable de synthétiser et de diffuser
toutes les nouveautés de son époque, l’on est obligé de revenir aux quelques pièces à
conviction dont on est censé disposer.
55
Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
Si l’on commence par les travaux romains de l’époque de Nicolas V (des travaux pour
l’essentiel projetés et n’ayant donné lieu qu’à de rares réalisations), l’on n’a sous la main que le
témoignage, extrêmement pauvre et discutable, de Vasari. L’on y ajoute le fait que le futur pape
Parentucelli aurait été à Bologne à l’époque où Leon Battista y suivait des études de droit.
Partir de cela pour prendre ensuite le témoignage posthume de Manetti sur les ambitieux
projets urbanistiques du pape (dans le De vita ac gestis Nicolai quinti summi pontificis) et faire
d’Alberti le concepteur de ce programme, totalement disproportionné si l’on songe aux
moyens dont disposait le pape, n’a tout simplement aucun sens (surtout si l’unique argument
dont on puisse faire état est le suivant: seul Alberti, à son époque, pouvait concevoir un tel
programme). C’est pourtant ce qu’a fait Carroll W. Westfall dans son célèbre In this most
perfect paradise de 1974, dont les idées ont été ensuite reprises par Franco Borsi dans sa
monographie d’Alberti. Quelque temps plus tard, l’idée a été fermement combattue, voire
anéantie avec une grande autorité par Manfredo Tafuri (en particulier dans Ricerca del
Rinascimento. Principi, Citta, Architetti, Torino, Einaudi, 1992).
Depuis lors, toute la recherche semble confirmer l’analyse de Tafuri: autant sur le mode sérieux
(dans le De re aedificatoria) que sur le mode comique (dans le Momus, écrit au même moment,
c’est-à-dire pendant le pontificat de Nicolas V), Alberti ne cesse de fustiger la «smania di
costruire», la libido aedificandi; il critique le mauvais architecte qui doit tout détruire avant de
songer à construire, et ce sans même savoir s’il aura les moyens intellectuels et financiers pour
mener ses projets à terme. Ici, clairement, le théoricien de l’architecture vise Bernardo
Rossellino, qui a commencé par démolir tout ce qui se trouvait aux environs du chevet de la
vieille basilique Saint-Pierre (y compris des édifices antiques) avant d’entamer la construction
de fondations gigantesques et disproportionnées. On sait comment se termine l’histoire: après
la prise de Constantinople par les Turcs, le pape tombe en dépression et tous les travaux sont
stoppés. A la suite de cela, Alberti n’aura de cesse de critiquer les programmes urbanistiques et
architecturaux mégalomaniaques: on ne doit entreprendre que ce que l’on est capable de
terminer et l’on doit mesurer ses ambitions à l’aune de ses forces financières et techniques; et
plus que tout, l’on doit respecter les édifices qui existent. De toute évidence, la grand chantier
abandonné de Nicolas V était aux antipodes de cet état d’esprit.
Il est possible qu’Alberti ait distribué quelques conseils, mais pour donner un exemple Vasari
dit en 1568 que les travaux romains de Rossellino se font sous la direction d’Alberti alors que
Mattia Palmieri, qui connaît personnellement l’humaniste, indique un siècle plus tôt que Leon
Battista est consulté sur la construction de la nouvelle abside du vieux Saint-Pierre et qu’il
recommande de stopper les travaux. C’est ce même Palmieri qui affirme qu’Alberti, en 1452,
«présente au pape» son traité d’architecture. Or, dans le Momus, Alberti raconte que le héros
de son récit offre à Jupiter un volume contenant de nombreux conseils qui pourraient lui être
utiles; Jupiter n’ouvre même pas le volume; plus tard, après avoir connu bien des
mésaventures, y compris architecturale (son arc de triomphe en or s’est effondré), le dieu des
dieux ouvre le livre et comprend qu’il se serait épargné de nombreux malheurs s’il avait lu
l’ouvrage plus tôt. Pourquoi parler de cela? Parce qu’on a suggéré, peut-être avec raison,
qu’Alberti faisait allusion au De re aedificatoria, qu’il avait présenté au pape et que ce dernier
n’avait même pas pris la peine de parcourir; s’il l’avait fait, son pontificat ne se serait peut-être
pas terminé si misérablement.
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Sur le problème de Pienza, les questionnements sont comparables même si l’on a cette fois
affaire au successeur de Nicolas V, Pie II (autre pape humaniste). Une fois encore, Alberti est
censé travailler main dans la main avec Rossellino pour construire une copie du Palazzo
Rucellai et restructurer l’ensemble du bourg de Corsignano, rebaptisé Pienza en l’honneur de
son célèbre enfant. De quels preuves dispose-t-on? Aucune. Quels arguments avance-t-on? Il
est certain que le Palazzo Piccolomini est construit par Rossellino (des documents le prouvent)
et sa ressemblance avec le Palazzo Rucellai est incontestable.
Or, on détient une lettre dans laquelle le marquis de Mantoue Ludovico Gonzaga écrit à
Alberti pour lui dire que le pape souhaite lire le De architectura de Vitruve; il lui demande donc
de lui prêter son exemplaire du traité antique. Quel étrange circuit! Alberti est un fonctionnaire
du pape et l’on sait qu’il suit l’administration papale pendant son déplacement vers Mantoue
(on a découvert des documents signés de sa main); pourquoi alors le pape prie-t-il le marquis
de demander son codex à Alberti? On ne le sait pas. On sait en revanche qu’Alberti avait
travaillé pour Sigismondo Malatesta en construisant la façade du Tempio malatestiano, or le
tyran de Rimini était un ennemi personnel de Pie II; le pape gardait-il une certaine distance
envers l’humaniste à cause de cela? On a aussi observé que le Palazzo Piccolomini était une
interprétation du Palazzo Rucellai faite en ne comprenant pas le fonctionnement du palais
original. Peut-être Rossellino ne disposait-il que d’un dessin dont il n’était pas vraiment en
mesure de comprendre la subtile logique. Quoi qu’il en soit, une implication directe d’Alberti
dans les travaux de Pienza paraît assez improbable. Pie II cite d’ailleurs dans ses oeuvres le
nom de son fonctionnaire, mais il en parle comme d’un fin connaisseur des antiquités, pas
comme d’un architecte.
Le troisième cas qu’il convient d’évoquer rapidement est, comme nous l’avons dit, celui du
panneau dit de la «Cité idéale», aujourd’hui dans les collections publiques d’Urbino (Galleria
Nazionale delle Marche). On ne sait rien sur ce tableau et sur son origine. Un examen par
diverses techniques a permis de lire, sous la superficie, un très long et très méticuleux travail
préparatoire, quasiment toutes les lignes des édifices étant tracées (ce qui serait une manière de
procéder extrêmement rare), mais cela ne nous dit rien sur l’auteur de l’oeuvre. Quels
arguments utilise-t-on pour en faire un tableau «albertien» dans sa réalisation ou au moins dans
son inspiration? L’on fait remarquer que le deuxième palais à gauche ressemble au Palazzo
Rucellai et l’église du fond, à la droite de la rotonde, ressemble à Santa Maria Novella, mais
comme toute «ressemblance», celles-ci sont discutables. On fait remarquer aussi que Vasari dit
qu’Alberti avait dessiné une belle vue de Venise («una Vinegia in prospettiva»), avec des
personnages peints par d’autres que lui; la vue de la cité idéale attendait-elle des figures? On
insiste enfin sur les liens entre Alberti et Urbino, et spécialement avec Federico da Montefeltro.
Longtemps, on s’en est tenu, sur ce point, au témoignage de Landino, qui, dans les
Disputationes camaldulenses, disait qu’Alberti avait l’habitude de passer l’été à Urbino, mais la
fidélité du dialogue de Landino à la pensée albertienne a été tellement remise en cause que ce
témoignage ne semblait plus avoir la moindre valeur. On connaît néanmoins depuis longtemps
une lettre tardive du duc qui parle de sa vieille amitié avec Alberti et l’on a découvert depuis
peu un document qui prouve qu’Alberti fréquentait Urbino. On admettra toutefois que cela ne
démontre rien quant à la paternité de la «Cité idéale», qu’on attribue parfois à Laurana, parfois
à Piero della Francesca, parfois à d’autres. En somme, ville, perspective, Quattrocento, ce sont
des arguments bien simples, voire un peu faciles, qui conduisent vers le nom d’Alberti.
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Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
3. La ville de papier.
Reste donc la question de ce que dit Alberti dans son traité d’architecture sur le problème de la
ville. Pour commencer, la ville qu’il décrit est-elle «idéale»? C’est ce qu’il semble dire lorsqu’il
évoque La République de Platon:
Aussi aimerais-je imiter la réponse que fit Platon à ceux qui lui demandaient où ils pourraient bien trouver la
fameuse cité qu’il avait dépeinte : « Ce n’est pas là mon propos, dit-il, mais je cherche de quelle façon il convient
d'établir la meilleure cité à venir ; quant à toi, pense bien qu’il te faudra préférer à toutes les autres celle qui lui
sera le moins dissemblable ». De même, nous aussi décrivons, comme si nous en présentions un modèle, la ville
que les hommes les plus savants, se pliant pour tout le reste au temps et à la nécessité des choses, jugeront
commode jusque dans le moindre détail. Nous soutiendrons le jugement de Socrate, pour qui le meilleur est ce
qui ne peut être changé qu'en pire. (IV,2 p. 191 = Krüger 286-287)
Qu’Alberti parte d’une idée est certain, et il pourrait difficilement en être autrement dès lors
que l’on parle de «villes de papier». On comprend néanmoins assez vite qu’il n’impose pas sa
conception des choses à la réalité dont il veut parler (dès cette phrase, il est d’ailleurs question
de se plier «au temps et à la nécessité des choses»). Pour prendre tout de suite un exemple,
lorsque Alberti se propose de faire une typologie des bâtiments, il indique qu’il existe
différentes catégories d’édifices parce que les hommes sont différents entre eux; après avoir
cité les opinions des Anciens sur cette question (c’est-à-dire divers exemples de divisions en
classes de la société), il propose son propre critère de distinction: «Or rien ne différencie mieux
un homme d'un autre que cela seul qui le sépare radicalement des bêtes, c’est-à-dire la raison et
la connaissance des arts libéraux» (IV,1 p. 187 = Krüger p. 282). Il s’agit là d’une opinion
commune parmi les hommes de savoir, et qui revient à dire que seuls eux méritent de détenir le
pouvoir, et ce dans l’intérêt général (on est là encore en plein contexte platonicien).
Néanmoins, le but d’Alberti n’étant pas de décrite un monde idéal où seuls les hommes les plus
sages, les plus justes et les plus intelligents détiendraient le pouvoir, il est immédiatement
conduit à ajouter au premier groupe celui des hommes les plus riches. Il fonde ainsi la
catégorie des «premiers citoyens» qui est capitale pour son analyse et donc son traité car ce
sont eux qui vont posséder des édifices particuliers (ni publics, ni privés collectifs) sur le
modèle desquels seront ensuite bâtis les édifices des citoyens plus modestes. En effet, de quoi
parle-t-on ici? Du palais privé. Et qui est capable de se faire construire un palais privé? En
réalité, ce ne sont pas les hommes les plus sages, les plus avisés, les plus instruits; ce sont les
hommes les plus riches. Ce n’est donc pas la «raison» qui permet, dans les faits, de distinguer
des classes parmi les hommes, c’est l’argent - et à Florence, ce n’est pas le sage Alberti qui se
fait construire un palais, c’est le riche Rucellai. Il est essentiel de comprendre qu’Alberti
cherche à écrire un traité qui soit capable de remplacer Vitruve et donc qui soit d’emblée
classique, c’est-à-dire fondé non sur une époque et un lieu mais sur la raison et la nature
(intemporelle) des choses - ce qui le rend virtuellement indémodable. En partant de sa
conception de la réalité mais en y intégrant ce qu’est le monde qu’il connaît, avec ses forces et
ses nombreuses faiblesses, l’auteur du De re aedificatoria abandonne une position
platonicienne (qui n’a jamais vraiment été la sienne) et réussit à éviter les écueils aussi bien de
l’idéalisme (qui tendrait à oublier ce qu’est le monde) que de la description désenchantée du
réel ici et maintenant (qui perdrait vite toute sa pertinence pour devenir un document sur une
époque révolue).
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Certes, pour faire cela, Alberti part de sa propre situation, celle d’un intellectuel en quelque
sorte «marginal» au sein de sa famille de marchands-banquiers et de sa cité, qu’il ne découvre
qu’à l’âge de 27 ans. Voulant être utile à tous, voulant que ses recommandations puissent être
mises en pratique, il ne peut se contenter de se référer à sa propre lecture du réel. Il y est
d’ailleurs d’autant plus forcé que si l’on cherchait dans ses œuvres qui mérite véritablement de
détenir le pouvoir, on aurait vite fait de constater que tous les groupes qui l’entouraient dans sa
vraie vie ont été, à un moment ou à un autre, violemment critiqués, surtout dans les
Intercoenales et dans le Momus: les riches, les juges, les politiques, les humanistes, les nobles,
les pauvres, sa propre famille, le peuple (cela va de soi), absolument tout le monde est rabaissé
et jugé indigne de détenir le pouvoir. D’ailleurs, dans sa dernière grande œuvre, le De iciarchia,
Alberti aboutit au seul résultat logique: se présenter implicitement comme l’unique personne
digne d’exercer l’autorité, au sein de la famille et indirectement au sein de la cité.
Mais son traité d’architecture serait inaudible s’il se construisait autour de cette vision des
choses. Il faut donc qu’il se fonde sur une sorte de réalisme intemporel d’essence
fondamentalement aristotélicienne: la nature des choses et non une idée parfaite. Or, cela
autorise la prise en compte de données très finement analysées. Pour donner un exemple, les
villes les plus grandes et les plus importantes auront certes besoin de routes et de rues
rectilignes et majestueuses, qui puissent mettre en évidence le rôle de premier plan joué par ces
cités, mais pour des ensembles de taille plus modeste, la route puis la rue courbe seront des
avantages :
Ainsi, non seulement elle (i.e. la rue principale) paraîtra plus longue et donnera l'impression que la ville est plus
étendue, mais en outre elle contribuera grandement à sa grâce, à la commodité de ses usages, aux circonstances et
aux nécessités du moment. Comme il sera précieux pour le promeneur de découvrir insensiblement, à chacun de
ses pas, de nouveaux aspects des édifices, de voir la sortie et la façade de chaque habitation alignées sur l'axe
central de la voie, et d'apprécier, dans ces conditions, sa vaste étendue, tandis qu'autrement ses dimensions
excessives seraient malséantes et rendraient même la ville insalubre ! (IV,5 p. 205 = Krüger p. 302-303)
Plusieurs choses sont néanmoins à noter. Tout d’abord, il est normal qu’un traité
d’architecture, qui se fixe pour but d’aider son lecteur à prendre de bonnes décisions ou à
émettre des jugements avisés, s’efforce de dire ce qui est bon et ce qui est mauvais en matière
de construction. Or, il ne vient à l’idée de personne de dire qu’Alberti décrit l’«édifice idéal»;
pourquoi alors prétendrait-on, lorsqu’il parle de la ville, qu’il décrive la «cité idéale»? Chacun,
dans sa vie, visitant d’autres ville que la sienne, a l’occasion de se dire que telle ville présente
telles avantages et tels inconvénients; partant de cela, et c’est le second point sur lequel il faut
insister, on peut se demander à quoi ressemblerait une ville rassemblant le maximum
d’avantages, mais il s’agit alors d’une ville créée à partir de rien, d’une ville nouvelle.
Ici aussi, l’on voit qu’Alberti cherche à s’abstraire de son siècle car au milieu du XVe siècle en
Italie, il devait être bien rare que l’on cherche à créer des villes nouvelles. On a cité la
restructuration de Rome, qui ne donne pas grand chose, celle de Pienza, de toute petite taille,
celle d’Urbino, qui permet objectivement de moderniser un peu la cité autour du palais de
Federico, mais on ne part jamais de rien. Curieusement, dans le Livre X, consacré à La
réparation des ouvrages, Alberti évoque l’idée de «corriger» la ville, mais il se corrige hélas tout
de suite lui-même :
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Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
Cherchons pour notre part quels ouvrages la main peut convenablement améliorer ; et commençons par les
ouvrages publics. Le plus important et le plus vaste d’entre eux est la ville ou plutôt, s’il nous plaît de le
comprendre ainsi, la région de la ville. La région où l’architecte négligent aura fondé sa ville, souffrira sans doute
de défauts qu'il faudra corriger.» (X,1 p. 469 = Krüger p. 625)
Et l’on parle ensuite d’assèchements de marais et non de réaménagements ou de
restructurations de villes. L’on est donc face à une sorte de paradoxe: les hommes sont,
particulièrement dans l’Italie du XVe siècle, les citoyens d’une ville et c’est dans cette ville qu’ils
se feront construire éventuellement un palais - souvent, d’ailleurs, en devant acheter des
constructions déjà existantes et non en partant d’un terrain vide. Or on ne va pas parler de
réaménagement de la ville pour en corriger d’éventuels défauts (la Renaissance hérite
fatalement de la cité médiévale), on va penser la fondation d’une ville à partir de rien. Autant
dire que le propos n’est pas nécessairement pertinent au moment où Alberti rédige son traité (il
le sera plus tard lorsque l’on recommencera à fonder des villes, en particulier dans le Nouveau
Monde).
Construire une ville, ce n’est pas comme construire un palais. On a plutôt le sentiment
qu’Alberti parle aussi de la ville, d’une part, parce qu’il s’agit, au moins depuis Aristote et sa
Politique, d’une sorte de «passage obligé» pour un théoricien, et, d’autre part, parce que, s’il
devait parler de la restructuration d’une ville existante, il ne pourrait parler que de cas
particuliers, sans pouvoir atteindre une forme d’intemporalité, de généralité abstraite. En
matière de restructuration, il n’existe que des cas spécifiques, même si l’on a déjà vu qu’Alberti
cherche en général à éviter les destructions (l’ancienneté même des édifices leur conférant une
dignité supérieure). Même en ce qui concerne une ville construite à partir de rien, Alberti ne
donne que peu d’indications génériques. La ville aux murailles formant un rond parfait est
certes celle qui possède le meilleur rapport entre taille de l’espace occupé et longueur des murs,
mais il s’agit d’une simple remarque de géométrie; plus loin, Alberti précise:
Aussi n’existe-t-il pas pour enceindre les villes une seule et même règle valable en tous lieux. (...) Nous avons
déjà dit que la ville dotée de la plus grande capacité sera circulaire. (...) Nous viserons cependant à profiter des
opportunités que nous offre la place elle-même, comme nous le remarquons chez les Anciens qui tiraient parti des
avantages et des contraintes des lieux.» (IV,3 p. 197, 199, 200 = Krüger p. 292-297)
S’adapter, toujours s’adapter; ne jamais arriver avec des solutions préétablies; face à un
problème à résoudre, se poser les bonnes questions. Pour le reste, la ville doit se situer au
milieu de son territoire; elle doit pouvoir bénéficier de tout ce dont elle a besoin (c’est le vieux
rêve autarcique et conservateur d’origine pythagoricienne):
il convient d'établir la cité de façon que, dans la mesure où la raison et la condition des choses humaines le
permettent, son propre territoire lui suffise sans qu'elle ait besoin de rien chercher ailleurs. (...) Par conséquent,
voici ma règle : quelle que soit la région où tu l’implantes, tu dois faire en sorte que la ville profite de tous ces
avantages sans en subir aucun inconvénient (IV,2, p. 191-192 = Krüger p. 286)
On note que ce type d’observation est dans la nature de ce type de traité. Dire que la ville
qu’on va créer doit avoir le plus d’avantages et le moins d’inconvénients possibles n’est pas
d’une grande originalité, ou plutôt c’est justement pour atteindre ce but que le texte est écrit.
C’est la nature même d’un traité qui l’implique.
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En revanche, il est peut-être un aspect du traité qui peut donner l’impression que la ville
qu’Alberti décrit possède des qualités qui ne sont pas nécessairement communes. Comme on le
sait à partir de ce qu’Alberti dit lui-même du plan de son ouvrage mais aussi des analyses
proposées par Françoise Choay dans La Règle et le Modèle, le traité étudie les mêmes
questions sous l’angle de la nécessité, puis de l’utilité et enfin du plaisir. Or, cette troisième
dimension n’était pas toujours présente chez d’autres penseurs de la ville. Alberti en vient ainsi
à préciser que:
la ville doit être conçue non seulement pour servir les besoins et les nécessités des habitations, mais aussi pour
offrir, à l'écart des affaires publiques, des espaces et des bâtiments agréables qui contribuent à l’ornement et aux
délices, des places, des champs de courses, des jardins, des promenades, des piscines, etc.» (IV,3 p. 197 =
Krüger p. 293 - toutes choses que l’on retrouve analysées dans le Livre VIII).
C’est sans doute sur ce point que l’on s’approche le plus de ce que pourrait être la «ville de la
Renaissance»: une ville possédant en son sein des espaces de plaisir. Alberti insiste d’ailleurs au
Livre VIII sur l’absence de salles de spectacle et spécialement de théâtres dans les villes de son
époque (ce qui montre bien que sa référence constante au modèle antique ne l’empêche en rien
de proposer des considérations valables pour l’avenir, comme le montrera la suite de l’histoire
de la ville européenne). La place accordée par le traité albertien au paysage va dans le même
sens; plus d’une fois, l’auteur insiste sur le plaisir que procure au marcheur la beauté des
campagnes environnantes.
Si ces idées permettent de mesurer le degré de clairvoyance d’Alberti, qui trace des perspectives
qui entreront progressivement dans la manière normale de penser la ville, certains passages du
début du Livre V frappent par leur réalisme, voire leur spregiudicatezza, leur absence de
scrupules. On connaît les pages sur la distinction entre ville du roi, accepté par tous, et ville du
«tyran», qui impose son pouvoir à une population peu encline à se soumettre et doit donc se
prémunir contre ses propres concitoyens en installant une citadelle au cœur même de la cité.
Certes, on a pu judicieusement rapprocher ces pages de celles du Prince (De principatibus) de
Machiavel, et y voir la préfiguration d’une «autonomisation» du domaine politique, qui ne
dépendrait plus de la morale, mais elle n’en reste pas moins une étrangeté à l’intérieur de
l’œuvre albertienne. S’agit-il d’une manière de permettre à tout un chacun de pouvoir lire dans
le plan d’une ville si l’on est face à la ville d’un roi ou face à la ville d’un tyran? Comme on l’a
déjà dit, Alberti avait travaillé pour Sigismondo Malatesta, le tyran de Rimini, mais est-il en
général possible d’adresser des conseils à un tyran en lui disant explicitement qu’il est un
«tyran»? Dès lors que l’on voit le texte comme une anomalie, il est bien sûr possible d’imaginer
des solutions: dans une première version du texte, le mot «tyran» n’apparaît pas et ce n’est que
plus tard qu’Alberti introduit le mot afin qu’on ne se méprenne pas sur le sens de ce qu’il dit,
etc. Au fond, en l’absence de pièces à conviction, ce passage garde tout son mystère. Il est
cependant un autre passage, toujours au début du Livre V, qui a pu frapper lui aussi par son
réalisme amoral:
On divise très commodément la ville au moyen d'un mur intérieur que je juge bon d'élever non en travers de
l’aire comme un diamètre, mais à la manière d'un cercle contenu dans un autre cercle : en effet, les plus riches,
qui aiment avoir de vastes espaces, accepteront facilement d'être exclus de la première enceinte, et abandonneront
volontiers le marché et le centre de la ville, avec ses boutiques et ses ateliers, aux besogneux qui gravitent autour
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Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
du forum. Dans ces conditions, la tourbe infâme des rôtisseurs, des bouchers, des cuisiniers, etc. dont parle le
Gnathon de Térence y menacera moins la sécurité et engendrera moins de suspicion que si les principaux citoyens
ne s'en trouvaient exclus. (V,1 p. 223 = Krüger p. 319)
Construire purement et simplement un mur à l’intérieur de la ville pour séparer le peuple des
«principaux citoyens» paraît peut-être d’un cynisme outrancier, mais on notera que cette
proposition reste strictement dans le cadre de la «cité du tyran»: le tyran doit séparer les
citoyens les uns des autres afin de contrôler plus facilement sa ville; sa muraille intérieure sera
plus aisément acceptée par les citoyens les plus riches si ces derniers sont placés à l’extérieur de
l’enceinte centrale - voilà tout. Penser qu’Alberti prescrivait d’isoler à ce point les groupes
sociaux, voire de confiner le peuple (nécessairement dangereux) derrière des murailles serait un
contresens. En revanche, il est clairement question de quartiers possédant des fonctions
différentes, même si l’on notera que sur ce point aussi, la pensée albertienne sait faire preuve
de souplesse, car s’il est question de zones diversifiées, on admet aussi, en fin de raisonnement,
qu’une certaine interpénétration est utile:
La présence de divers ateliers d'artisans aux endroits appropriés des différentes rues et des différents quartiers
contribuera grandement à l'agrément de la ville : au forum, les changeurs, les peintres et les orfèvres ; juste
derrière, les boutiques d’épices, les échoppes de tailleurs et enfin tous les métiers jugés honnêtes ; mais la puanteur
et l'infection des métiers infâmes, en particulier l'ordure des tanneries, seront reléguées aux confins de la ville
(...). Les uns aimeraient sans doute que les nobles jouissent d'un voisinage débarrassé et exempt de toute la
crasse du menu peuple. Les autres préféreraient que tous les quartiers de la ville sans exception soient équipés de
façon à offrir partout ce que réclame l’usage, et c'est pourquoi ils ne refuseraient pas de voir des boutiques de
rapport associées aux demeures des grands. Mais c’en est assez sur ce point. A l'évidence l’utilité veut une chose,
la dignité une autre. (VII,1 p. 321 = Krüger p. 432)
En réalité - et c’est le point auquel il faut aboutir -, la pensée albertienne de la ville est
caractérisée par l’interrogation. Ce qu’il faut faire, c’est se poser des questions. Dans de très
nombreux cas, Alberti donne des réponses floues qui n’aident véritablement à régler des
questions qu’en alimentant la réflexion lorsque l’on est confronté à des cas concrets. Cette
solution est-elle conforme à la dignité? Puis-je faire mieux en ce qui concerne le nécessaire,
l’utile, l’agréable? Etc. Il propose ainsi un programme théorique assez souple pour s’adapter à
la réalité et infléchir progressivement les manières de faire. Le simple fait de s’interroger sur la
question de l’«ornement» des villes lui permet d’énoncer un résultat qui s’apparente en fait à un
programme:
Mais le principal ornement des villes résidera dans le site, le tracé, la configuration et la position des rues, du
forum et de chacun des édifices, tels que tous soient correctement aménagés et distribués selon l’usage, la dignité et
la commodité de chacun. En effet, sans ordre, plus rien n'apparaîtra commode, agréable ou digne. (VII,1 p.
320 = Krüger p. 430)
Rien de ce qui est dit n’est concret, mais le mot essentiel est dit: l’ordre. La ville selon les vœux
d’Alberti n’est pas faite nécessairement d’avenues rectilignes et de maisons dans le style
moderne ; en revanche, il obéit à un ordre, c’est-à-dire à une réflexion. On a vu que les
positions politiques d’Alberti sont fondamentalement conservatrice, mais l’ordre n’empêche
pas le progrès si ce progrès est ordonné, c’est-à-dire conforme à la nature et à la raison.
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Sobre a Cidade Ideal de Leon Battista Alberti aos olhos de um Humanista
chamado Michel Paoli
Por Fellipe de Andrade Abreu e Lima
O texto ora traduzido para o português foi escrito pelo ilustre professor Michel Paoli, um vocacionado para os
estudos albertianos. Conheci Michel Paoli em Paris em 2011, através da indicação do emérito professor da
Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG, Carlos Antônio Leite Brandão: provavelmente o maior
especialista sobre a obra de Leon Battista Alberti no Brasil. Essa indicação frutificou em uma amizade e em
visitas mútuas, que têm como causa principal o acesso aos leitores de língua portuguesa a textos produzidos por
este letrado escritor francês. Não à toa cultivo essa amizade, pois os textos do Paoli me esclarecem as dúvidas
sobre os temas aos quais alude.
Esse texto que apresento e traduzo para esse catálogo – A Cidade (ideal?) de Alberti – foi escrito especialmente
para essa edição, e é a luz que parece faltar aos estudos sobre o tema em questão: seria Alberti um pensador da
cidade ideal ou um prático que desejava transformar o mundo em plena realidade, sem dúvida imperfeita? Seria
uma cidade ideal ou um ideal de cidade? O autor faz uma longa trajetória com precisão metodológica; aliás, esse
texto possui duas qualidades impressionantes, uma metodológica e outra histórica. Ambas se entrelaçam e tecem
uma teia que, ao contrário do que poderia parecer, esclarece a imagem sobre a temática em questão.
O propósito maior da reunião desses textos é a tentativa de difundi-los considerando a impossibilidade de termos
acesso a eles na maioria das bibliotecas, mesmo nas melhores universidades no Brasil, e ainda com a difusão dos
trabalhos científicos hoje em dia nas redes digitais. Mas esse texto apresenta uma luz especial, pois abala o
rumo que as pesquisas sobre o autor renascentista tomavam. A maioria dos estudos sobre Alberti seguiam as
diretrizes estabelecidas por Franco Borsi, Carroll W. Westfall e Rudolph Wittkower, um depois do outro.
Como bem evidencia Paoli no texto a seguir, apenas após os colóquios do sexto centenário do nascimento de
Alberti as pesquisas evoluíram em termos de novas fontes e estudos filológicos. Mas qual luz é essa? Bem, o
autor conclui que não há verdades absolutas sobre a obra de um autor, em questão o humanista Leon Battista.
Se a microhistória veio abalar as bases das ‘verdades’ da história até então, desde as contribuições da ‘École dês
Annales’; as releituras e novas metodologias clarearam o mundo para aquilo que se poderia chamar de ‘fim da
história’. Mas parece que a nova verdade é não haver verdades, e então nos aproximamos ao oriente e sua
filosofia, quando o que importa não é o fim, mas o trajeto. É nesse sentido que parece surgir uma verdade nova,
uma história nova: a da busca, a da pesquisa.
Contudo, apesar do exposto e das múltiplas edições críticas, dos ensaios e suas tentativas e dos textos e tratados
de Alberti e de outros mais sobre o autor e sua obra, alguns pontos continuam opacos, obscuros; e possivelmente
continuarão sempre assim, pois as certezas são improváveis no mundo do humanismo. Desta forma, Paoli inicia
o texto fazendo uma análise da vida de Alberti, considerando sua condição social, familiar, cultural. Relaciona
a tendência de se associar as elevadas concepções intelectuais desde o século XIX a Leon Battista Alberti ou às
ideias dele, originárias ou relacionadas a ele. Oferece uma relação direta de que seria óbvio relacionar a
concepção de cidades ideais a homens ideais, daí o surgimento do nome de Leon Battista Alberti ser renascido,
também por influência de Jacob Burckhardt em seu clássico ‘A Cultura do Renascimento na Itália’.
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Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
Mas Michel Paoli faz uma abordagem metodologicamente atual quando tenta responder a pergunta sobre a
cidade ideal ou o ideal de cidade de Alberti. Ele faz uma leitura estruturalista do autor em diálogo crítico,
dialético e hermenêutico com suas obras e seus contextos – social, temporal, cultural, etc. Nesse sentido, as
possíveis respostas óbvias quando tomadas dentro de contextos específicos, tomam novos rumos quando
apresentam novas facetas. Ad exemplum: pontos do ‘Intercoenales’, do ‘De pictura’, do ‘Obtrectatores’ e do ‘De
re aedificatoria’, sugerem respostas diversas quando lidos separadamente e conjuntamente. No primeiro caso as
respostas parecem ser mais óbvias, mas no segundo se apresentam com mais caráter e dignidade, talvez mesmo
com mais respeito e harmonia.
Na segunda parte do texto Paoli faz a discussão sobre as relações históricamente feitas entre as ‘cidades ideais’ e
a figura de Leon Battista Alberti, chegando às contribuições feitas por Manfredo Tafuri em ‘Ricerca del
Rinascimento. Principi, Città, Architetti’ (Torino: Einaudi, 1992). O autor revela, com sua perspicácia
metodológica, as ‘denúncias’ feitas por Alberti no ‘Momus’ e a incapacidade do Papa Nicolau V em perceber os
desvios tomados para o objetivo maior que seria a ‘restauratio’ de Roma. Júpiter não ouviu os conselhos que lhe
foram dados e parece que nem mesmo o sucessor de Nicolau: Pio II. De qualquer modo, Pienza foi rebatizada e
a reforma parcialmente feita. Assim, Paoli tece uma teia de considerações, valendo-se de importantes fontes como
o texto de Landino, ‘Disputationes camaldulenses’, para discutir a relação entre projetos reais e projetos ideais
de Alberti. O objetivo é sempre um: responder ao questionamento inicial (Alberti propõe um ideal de cidade ou
uma cidade ideal?)
A terceira e última parte do texto é quando o autor faz mais uso do tratado de arquitetura de Alberti. A
questão inicial é recolocada e posta em confronto com o texto. Citando Platão, Alberti diz: [Eu também
gostaria de imitar a resposta de Platão quando lhe perguntaram sobre onde poderia encontrar a famosa cidade
que ele havia retratado: “Não existe, disse ele, mas eu estou procurando determinar a melhor cidade para o
devir; quanto a você, pense bem no que você acha que deve ser preferido por todos os outros e que seré de opinião
mais aproximada por todos”]. Mas no fim das contas, tomando as concepções de cidades reais ou de tiranos,
somando as discussões de Maquiavel, em ‘O Príncipe’, Paoli conclui que ‘Nada disso que foi dito é concreto’,
mas que Alberti procurava sim uma ‘ordem’. Aliás, a cidade ideal é aquela que é materialmente real, mas
idealmente imaterial. A ‘ordem’ é a ‘reflexão’ contínua, a trajetória. A cidade parece ser na visão de Paoli uma
constante releitura, uma entidade viva e mutável, mas isso é o que parece ser o entendimento mesmo de Alberti.
Se real ou ideal, se material ou imaterial, não importa, pois a cidade é tudo isso e muito mais; é tudo que possa
ser pensado pelo homem em sua história viva, com múltiplas metáforas e releituras: infinitas possibilidades.
Não há muito mais a falar sobre o texto humildemente traduzido. Apenas devemos ressaltar que
disponibilizamos o texto original neste mesmo catálogo para que os leitores mais dotados em língua francesa
pudessem desfrutar de um exame mais preciso; minhas faculdades nesta nobre língua são singelas. Peço,
portanto desculpa pelos erros possíveis, que já imagino ter cometido; mas peço que compreendam que foi uma
atitude de um ansioso, que desejava dividir uma felicidade com todos, disponibilizando um texto que merece ser
lido pelos amantes do tema.
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A Cidade (ideal ?) de Alberti – por Michel Paoli
1. Homem ideal propõe a cidade ideal, boa relação qualidade-preço.
Porquê a ideia de “cidade ideal” é freqüentemente associada ao nome de Alberti, e esta é por
ele justificada? Quando pensamos em uma cidade ideal do Renascimento pensamos em
projetos, eventualmente em realizações; as imagens nos surgem. No entanto, não é raro
encontrar o nome de Alberti envolvido nesses projetos ou imagens que encontramos ou numa
forma de realização.
Quanto ao século XV, ao menos três ideias vêm imediatamente à mente: os ambiciosos
projetos de reestruturação da cidade de Roma sob o pontificado de Nicolau V; o
desenvolvimento “urbano” da aldeia natal do Papa Pio II, Pienza; os três painéis das chamadas
“cidades ideais” de Urbino, Berlim e Baltimore (e especialmente o primeiro dos três primeiros).
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Em todos estes casos, mesmo se houver apenas uma documentação muito limitada ou
inexistente, o nome de Alberti parece emergir com evidência, pois é comum ver o seu nome
mencionado como se fosse um tipo oculto de empresário que nutriria toda a Itália com suas
idéias.
Não seria difícil mostrar que isso também é válido para toda a sua vida e suas mais conhecidas
intervenções. Quando propomos, por exemplo, reconhecer Alberti em um afresco pintado por
Masaccio em 1427, no meio de artistas de renome como Brunelleschi, Donatello e o próprio
Masaccio, nós fazemos dele um prodígio de 23 anos que faria sucumbir todo o mundo
intelectual sob o seu charme. Os conhecimentos sobre a vida de Alberti, seu meio familiar,
profissional e de amigos, evoluíram muito nos últimos anos, especialmente por ocasião dos
quinze colóquios que marcaram o ano do sexto centenário, sendo mais fácil agora nos
perguntarmos sobre a precisão desta representação.
Parece que nós somos forçados a admitir que, com 23 anos, Alberti era quase nada, ou não
muita coisa, e o pouco que ele tinha escrito não apresentava condição nem autorização para
distingui-lo radicalmente de seus companheiros de estudos. É muito pouco provável (e, em
outros aspectos, totalmente impossível) que Alberti fosse reconhecido pelo ambiente da arte
florentina como uma figura de liderança em 1427.
O principal problema que enfrentamos é que esta imagem de um Alberti que forneceria ideias
para artistas, humanistas e os príncipes de seu tempo persiste durante toda a sua vida. Há
décadas, sempre que uma novidade promissora é identificada pela pesquisa, esta é atribuída a
algo maior que está ligado às ideias de Alberti. De alguma forma, quando não se sabia explicar
o surgimento de algo novo, rapidamente se atribuía à uma única fonte, uma espécie de
encarnação perfeita da Renascença, um herói para que pudesse sozinho explicar tudo.
Mas esta imagem, em parte fabricada por Alberti-se em sua autobiografia, aperfeiçoada durante
as épocas do neoclássico e romantismo por algumas informações dispersas, foi definitivamente
popularizada em larga escala por Jacob Burckhardt em sua ‘civilização do Renascimento na
Itália’. A partir desse momento, Alberti se torna o homem universal, o homem do
Renascimento; ele é a encarnação perfeita das virtudes de seu tempo. Portanto, o que poderia
ser mais natural do que ver o homem ideal inventar a cidade ideal? É importante compreender que,
além dos dados disponíveis para defender estas atribuições, o fato de atribuir a Alberti a marca
dos trabalhos sobre a Roma de Nicolau V (em grande parte não realizada), da reurbanização de
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Pienza ou do ‘cidade ideal’ urbineta nasce por um motivo: Alberti parece ser a chave universal
para abrir todas as portas - uma chave, sem dúvida, muito cômoda.
De fato, uma leitura cuidadosa das obras escritas, que contêm muitas indicações biográficas, a
descoberta de novos documentos, a aplicação de novas metodologias (começando pela
releitura de toda a tradição crítica), permite-nos dizer que a vida Alberti foi principalmente uma
luta longa e difícil, sendo um filho ilegítimo que nasceu enquanto sua família estava no exílio, e
que rapidamente se encontrava órfão e foi rejeitado por uma parte de sua família na sua terra
natal, Florença, e também por seu meio intelectual, dos humanistas, e provavelmente por
artistas florentinos de seu tempo, tendo que lutar por reconhecimento – algo que viria ocorrer
no final de sua vida, a partir de década de 1460.
Que não haja dúvidas: Alberti tinha capacidades enormes, fora do normal, e a parte de sua
obra que chegou até nós com certeza é mais do que suficiente para provar isso. Mas isso não o
impediu de ter inimigos, inclusive dentro de sua própria família. Poderíamos mesmo dizer que
ele tinha inimigos tão capazes quanto ele, mesmo no auge de suas habilidades, que eram
grandes. Isso é provavelmente porque, em primeiro lugar, era desprezado por alguns de seus
contemporâneos que consideravam que ele poderia aumentar suas capacidades chegando a
níveis nunca alcançados.
Há muito tempo que conhecemos Alberti como um amigo de Brunelleschi. O único elemento
que temos para afirmar isso é a dedicatória do De pictura. No entanto, estudos filológicos
(conduzidos principalmente por Lucia Bertolini) mostraram que existe apenas um manuscrito
deste texto e que este se encontra num códice de trabalho de propriedade do próprio Alberti.
Se Leon Battista enviou esta carta ao seu ilustre amigo ancião é quase certo que este não
respondeu e não fez nada, provavelmente porque ele não apreciou o presente (é verdade que o
jovem havia dito ser o primeiro a ter realizado aquilo que o arquiteto ancião havia descoberto
duas décadas antes, isto é, a perspectiva). Lembremo-nos que no De re aedificatoria, que a
elaboração começa na década de 1440, o trabalho do primeiro arquiteto renascentista não é
sequer mencionado alusivamente: ela simplesmente não existe. Se Alberti fosse mesmo um
amigo de Brunelleschi, teria feito isso mesmo? Não se pode ignorar que Alberti dedicou todas
as suas energias para a arquitetura especificamente para responder ao desafio de Brunelleschi.
Em suas obras escritas desde os anos de 1430 e 1440 (pensamos especialmente no Intercoenales)
Alberti não para de fazer alusão a seus obtrectatores, seus detratores, aqueles que denegriram seu
trabalho, seus críticos, e contra os quais ele deveria se defender, em primeiro lugar
moralmente. Houve certamente ao seu redor, as pessoas que ajudaram o jovem de talento tão
promissor (imaginamos o seu primo distante Francesco d’Altobianco degli Alberti ou prelado
Alberto degli Alberti, e, de fato, Alberti fala pouco sobre eles), mas imaginar que ele fosse
universalmente bem recebido simplesmente se tornou insustentável. O reconhecimento que ele
acabará por obter é uma conquista verdadeira, não foi um dom do qual ele se serviu como se
fosse uma bandeja em sua mesa desde sua juventude. E este reconhecimento só viria mais
tarde, nos últimos dez anos de sua vida (1462-1472).
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2. A participação de Alberti nas cidades ideais.
Quando o avanço das pesquisas e estudos albertianos nos privou do cômodo expediente do
homem universal, reconhecido por todos como uma autoridade, capaz de sintetizar e divulgar
todas as novidades da sua época, obrigando-nos a rever algumas evidências da quais se
imaginava ter.
Se começarmos pelos trabalhos romanos da época de Nicolau V (principalmente os trabalhos
de projetos essenciais que culminaram em raras realizações), nós teremos à mão o
extremamente pobre e questionável depoimento de Vasari. A ele nós acrescentamos o fato de
que o futuro Papa Parentucelli estava em Bolonha, no momento em que Leon Battista foi para
lá cursar direito. A partir de então, para tomar o póstumo testemunho de Manetti sobre os
ambiciosos projetos urbanos do Papa (no De vita ac gestis Nicolai quinti summi pontificis) Alberti se
torna o ideólogo deste programa, totalmente desproporcional se considerarmos o meios
disponíveis ao Papa, algo simplesmente que não faz sentido (especialmente se o único
argumento que pode ser relatado é que: só Alberti, no seu tempo, poderia projetar um
programa desse tipo). É, portanto, isso que fez Carroll W. Westfall em seu célebre ‘In this most
perfect paradise’ de 1974, cujas idéias foram repetidas por Franco Borsi Alberti em sua
monografia sobre Alberti. Algum tempo depois, esta ideia foi fortemente combatida, com
argumentos de oposição de grande autoridade feitos por Manfredo Tafuri (especialmente no
seu Ricerca del Rinascimento. Principi, Città, Architetti. Torino: Einaudi, 1992).
Desde então, toda a pesquisa parece confirmar a análise de Tafuri: seja de modo sério (no De re
aedificatoria) ou de modo cômico (no Momus, escritos ao mesmo tempo, isto é, durante o
pontificado de Nicolau V), Alberti não cessa de castigar a ‘smania di costruire’, a libido aedificandi;
ele critica os arquitetos despreparados que ajudam a destruir um edifício ao invés de construílo, e isso mesmo sem saber se ele teria os meios intelectual e financeiro para conduzir seus
projetos à realidade. Aqui, claramente, o teórico de arquitetura visa Bernardo Rossellino, que
começou por demolir tudo o que estava perto da cabeceira da antiga basílica de São Pedro,
(incluindo os edifícios antigos) antes de iniciar a construção de fundações gigantescas e
desproporcionais.
Nós sabemos como esta história termina: após a tomada de Constantinopla pelos turcos, o
Papa caiu em depressão e todo o trabalho é interrompido. Depois disso, Alberti nunca mais
parou de criticar os programas urbanísticos e arquitetônicos megalomaníacos: temos que
admitir quando não somos capazes de completar algo e medir as ambições de acordo com
nossas capacidades financeiras e técnicas, e acima de tudo, devemos respeitar os edifícios
existentes. Obviamente, o grande canteiro abandonado por Nicolau V era a antítese dessa
mentalidade.
É possível Alberti tenha dado alguns conselhos, mas para dar um exemplo, Vasari diz em 1568
que os trabalhos romanos de Rossellino estavam sob a direção de Alberti, enquanto que Mattia
Palmieri, que conhecia pessoalmente humanista indica um século antes que Leon Battista foi
consultado sobre a construção do novo abside da antiga São Pedro e recomenda a paralisação
dos trabalho. Este é o mesmo Palmieri que afirmou que Alberti, em 1452, ‘presenteou o Papa’
com seu tratado de arquitetura. No entanto, no Momus, Alberti diz que os heróis de sua história
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dão a Júpiter um volume contendo nobres conselhos que podem ser úteis; Júpiter nem sequer
abriu o volume, e mais tarde, depois de experimentar muitas desventuras, incluindo na
arquitetura (seu arco triunfal desabou), o deus dos deuses abre o livro e entende que seria
poupado de muitos problemas se ele tivesse lido o livro antes. Por quê falar sobre isso? Porque
temos sugerido, talvez com razão, que Alberti estava se referindo ao De re aedificatoria, que ele
tinha presentado ao Papa e que este último não tinha sequer se preocupado em entendê-lo; se
o tivesse feito, seu pontificado talvez não tivesse acabado tão miseravelmente.
Sobre o problema de Pienza, os questionamentos são comparáveis mesmo se falarmos do
sucessor de Nicolau V, Pio II (outro Papa humanista). Uma vez mais Alberti trabalha,
supostamente, ao lado de Rossellino para construir uma cópia do Palazzo Rucellai e
reestruturar todo o burgo de Corsignano, rebatizado de Pienza em homenagem ao seu filho
famoso. Mas quais provas temos? Nenhuma. Quais argumentos podemos avançar? É certo que
o Palazzo Piccolomini foi construído por Rossellino (documentos provam isso) e sua
semelhança com o Palazzo Rucellai é inegável.
No entanto, temos uma carta do Marquês de Mântua, Ludovico Gonzaga, escrita para Alberti,
dizendo que o Papa deseja ler o De Architectura de Vitrúvio; ele pede para lhe emprestar sua
cópia pessoa do antigo tratado. Que circuito estranho! Alberti é um funcionário do Papa e
sabemos que trabalhava na administração papal para viagem a Mântua (encontramos
documentos assinados por sua mão); então por quê o Papa solicita ao Marquês para pedir esse
códice a Alberti? Nós não sabemos. Sabemos, no entanto, que Alberti trabalhou para
Sigismondo Malatesta na construção da fachada do Tempio Malatestiano, ou o tirano de
Rimini era um inimigo pessoal de Pio II; ou o Papa manteve uma certa distância do humanista
por causa disso? Observamos ainda que o Palazzo Piccolomini era uma interpretação do
Palazzo Rucellai feita sem a compreensão funcional do palácio original. Talvez Rossellino não
dispusesse de um desenho ou não estivesse realmente habilitado para entender a lógica sutil.
De qualquer forma, um envolvimento direto de Alberti nos trabalhos de Pienza parece
bastante improvável. Pio II também cita em suas obras o nome desse seu funcionário, mas ele
fala dele como um conhecedor de antiguidades, não como um arquiteto.
O terceiro caso que devemos mencionar rapidamente, como já dissemos, é sobre o painel da
‘Cidade Ideal’, agora parte das coleções públicas de Urbino (Galleria Nazionale delle Marche).
Não sabemos nada sobre essa tábua nem sobre sua origem. Examinado as várias técnicas
podemos dizer que, sob a superfície, há um trabalho muito longo e meticuloso de preparação,
quase todas as linhas dos edifícios foram desenhadas (o que seria uma maneira de fazer
extremamente raro), mas isso não nos diz nada sobre o autor do trabalho. Que argumentos
poderíamos usar para fazer deste um trabalho ‘albertiano’, ou pelo menos sob sua inspiração?
Podemos notar que o segundo palácio à esquerda se assemelha ao Palazzo Rucellai e que a
igreja no fundo à direita da rotunda, parece com a de Santa Maria Novella, mas como qualquer
‘semelhança’, são todas questionáveis. Observamos também que Vasari diz que Alberti havia
desenhado uma bela vista de Veneza (‘una Vinegia in prospettiva’), com outros personagens além
dele; uma vista de uma cidade ideal teria pessoas? Nós insistimos nas relações entre Alberti e
Urbino, e especialmente com Federico da Montefeltro.
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Apesar de termos nos detido muito tempo neste ponto, o testemunho de Landino, em
Disputationes camaldulenses, diz que Alberti tinha o hábito de passar o verão em Urbino, mas a
fidelidade do diálogo de Landino ao pensamento albertiano foi totalmente contestado e esse
depoimento não parece ter qualquer valor. Sabemos, no entanto, depois de muito tempo que
numa carta tardia, o Duque fala de sua velha amizade com Alberti, e recentemente descobriuse um documento que comprova que Alberti frequentava Urbino. Admitamos, porém, que isso
nada prova quanto à autoria da ‘Cidade Ideal’, que atribuímos por vezes a Laurana, outras
vezes a Piero della Francesca, outras mais a outros autores. Em suma, cidade, perspectiva,
Quattrocento, esses são argumentos muito simples, até mesmo fáceis, o nos conduz ao nome de
Alberti.
3. A cidade de papel
Permanece a questão do que disse Alberti em seu tratado de arquitetura sobre o problema da
cidade. Para começar, a cidade que ele descreve é “ideal”? É o que ele parece dizer quando
evoca ‘A República’ de Platão:
Eu também gostaria de imitar a resposta de Platão quando lhe perguntaram sobre onde poderia encontrar a
famosa cidade que ele havia retratado: “Não existe, disse ele, mas eu estou procurando determinar a melhor
cidade para o devir; quanto a você, pense bem no que você acha que deve ser preferido por todos os outros e que
seré de opinião mais aproximada por todos”. Da mesma forma, nós descreveremos, como se estivéssemos
apresentando um modelo, a cidade que os homens mais instruídos, do modo mais adequado para todas as coisas
nos tempos e necessidades das coisas justas, considerem conveniente no mais ínfimo pormenor. Nós apoiaremos o
julgamento de Sócrates, para quem o melhor é o que não pode ser mudado que não para pior. (IV,2 p. 191 =
Krüger 286-287)
Que Alberti parte de uma ideia é um fato certo, e dificilmente poderia ser de outra forma
quando falamos de “cidades de papel”. Entendemos, no entanto, de modo suficientemente
rápido que ele não impõe sua concepção das coisas à realidade que ele fala (desde esta frase,
que é também uma questão de se pontuar “ao tempo e à necessidade das coisas” – “au temps et
à la nécessité des choses”). Para tomarmos um rápido exemplo, logo que Alberti propõe fazer uma
tipologia de edifícios, ele indica que existem diferentes categorias destes, porque os homens
são diferentes entre eles, mas depois de citar as opiniões dos ‘Antigos’ sobre esta questão (isto
é, vários exemplos de divisão de classes na sociedade), ele tem seu próprio critério de distinção:
“Não diferenciamos em nada um do homem do outro, e a única coisa que separa radicalmente o homem dos
animais é o fato de possuir a razão e o conhecimento das artes liberais”. (IV,1 p. 187 = Krüger p. 282)
Ele possuía uma opinião comum entre os homens de saber, o que significa que eles
consideravam que só eles mesmos mereciam manter o poder, e isso em prol do interesse geral
(pois estamos ainda está em pleno contexto platônico). No entanto, o propósito de Alberti não
era o de descrever um mundo ideal, no qual apenas os homens mais sábios, os mais justos e os
mais inteligentes se manteriam no poder, ele é imediatamente levado a se juntar ao primeiro
grupo dos homens mais ricos. Ele funda assim a categoria de “primeiro cidadão”, que é capital
para sua análise e, portanto, seu tratado apresenta estes edifícios particulares (nem públicos
nem privados coletivos) sobre o modelo de quais serão construídos para os cidadãos mais
modestos. Na verdade, de quem nós falamos aqui? Do palácio privado. E quem é capaz de
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construir um palácio privado? Na realidade, não são os homens mais sábios, os mais avisados,
os mais instruídos; são os homens mais ricos. Não é a ‘razão’ que permite, com os fatos,
distinguir as classes entre os homens: é dinheiro - e em Florença; não é sábio Alberti que
construiu um palácio, é um rico Rucellai.
É essencial compreender que Alberti tenta escrever um tratado que seja capaz de substituir o
de Vitrúvio e, portanto, que seja clássico, isto é, fundamentado não em um tempo e num lugar,
mas na razão e na natureza (atemporal) das coisas – o que o torna praticamente atemporal. A
partir de sua concepção de realidade, mas incorporando neste o que ele conhece do mundo,
com os seus pontos fortes e fracos, o autor do De re aedificatoria abandona uma posição
platônica (que nunca foi realmente a sua própria) e consegue evitar as armadilhas do idealismo
(que tende a esquecer o que é mundo) para descrever a realidade desencantada do aqui e agora
(que rapidamente perde a sua relevância para tornar-se um documento sobre uma época).
Claro que, para fazer isso, Alberti parte de sua própria situação, a de um intelectual que vive de
forma ‘marginal’ em sua própria família, de banqueiros de sua cidade, e que ele descobre com a
idade de 27 anos. Querendo ser útil a todos, desejando que as suas recomendações pudessem
ser postas em prática, ele não pode se contentar em se referir à sua própria interpretação da
realidade. Há outras obras nas quais podemos encontrar afirmações mais forçadas sobre quem
merece deter o poder, e nós rapidamente podemos constatar que todos os grupos ao redor
dele em sua vida real foram, num momento ou em outro, violentamente criticados,
especialmente nos Intercoenales e no Momus: os ricos, os juízes, os políticos, os humanistas, os
nobres, os pobres, sua própria família, as pessoas (é claro) absolutamente todos são julgados e
rebaixados como indignos de deter o poder. Além disso, em sua última grande obra, De
iciarchia, Alberti chega a um resultado lógico: se apresenta implicitamente como a única pessoa
digna de exercer a autoridade dentro da família e, indiretamente, na cidade.
Mas seu tratado sobre a arquitetura seria inaudível se ele se construísse como autor dessa visão
das ciosas. Por isso, é necessário que ele se fundamente num tipo de realismo atemporal de
natureza aristotélica: a natureza das coisas, e não uma idéia perfeita destas. No entanto, isto
permite a inclusão de dados finamente analisados. Para dar um exemplo, as cidades maiores e
mais importantes possuem certas necessidades de estradas e de ruas retas e majestosas que
possam evidenciar o papel primordial desempenhado por essas cidades, mas para conjuntos
menores, a estrada e as ruas curvas apresentam vantagens:
Assim, não só ela (ou seja, a rua principal) será a mais longa e dará a impressão de que a cidade é mais
extensa, mas também contribuirá grandemente para a sua graça, a comodidade de seus usuários, às
circunstâncias e às necessidades do momento. Como será precioso descobri-la progressivamente, em cada um de
seus passos, os aspectos dos novos edifícios, de ver as saídas e as fachadas de cada uma de suas casas alinhadas
com o eixo central da vista, e de apreciar, sob estas condições, a sua imensidão, suas dimensões, enquanto que se
a forma fosse outra seria inadequado e excessivo tornando a cidade insalubre! (IV, 5 p. 205 = Krüger p. 302303)
Várias coisas são dignas de nota. Em primeiro lugar, é normal que um tratado de arquitetura
que pretende ajudar o leitor a tomar boas decisões ou a fazer bons julgamentos, se esforce para
dizer o que é bom e o que é ruim em matéria de construção. Então ninguém tem a ideia de
dizer que Alberti descreveu o ‘edifício perfeito’; então por que pretenderíamos, quando ele fala
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da cidade, afirmar que ele descreve a ‘cidade ideal’? Todo mundo em sua vida, visitando outras
cidades que não são as suas, tem a chance de dizer que há em cada uma delas algumas
vantagens e outras desvantagens; e a partir deste há um segundo ponto no qual é necessário
insistir, que podemos nos perguntar como seria uma cidade com o máximo de benefícios, mas
deveria ser uma cidade construída a partir do nada, uma nova cidade.
Aqui também vemos que Alberti tenta se abstrair de seu século, meados do século XV na
Itália, e deveria ser muito raro que procurassem criar novas cidades. Citamos a reestruturação
de Roma, que não foi tão grande coisa, a de Pienza, de apenas pequena parte dela, a de Urbino,
que permitiu objetivamente modernizar um pouco a cidade, mas apenas em torno do palácio
de Federico, mas que não nos deiou nada. Curiosamente, no Livro X, dedicados à ‘A
Restauração das Obras’, Alberti evoca a ideia de ‘corrigir’ a cidade, mas ele próprio,
imediatamente, se corrige:
Procuremos por nossa parte as obras que podem ser melhoradas; e comecemos pelas obras públicas. O mais
importante e maior das coisas é a cidade em si, ou melhor, se quisermos compreendê-la como região da cidade. A
região onde o arquiteto negligente teria fundado sua cidade, provavelmente sofrirá dos defeitos e devem ser
corrigidos. (X, 1 p. 469 = Krüger p. 625)
Mas então passa a falar de terraplanagem de pântanos e áreas molhadas e não de readequação
ou reconstrução de cidades. Ficamos diante de uma espécie de paradoxo: os homens são,
sobretudo na Itália do século XV, cidadãos da cidade e é nesta cidade que, eventualmente,
deverá se construir um palácio – outras vezes, tendo de comprar edifícios existentes e
remodelando, em vez de iniciar uma obra a partir de um lote vazio. Mas não vamos falar sobre
reconstrução da cidade para corrigir quaisquer defeitos (o Renascimento inevitavelmente herda
a cidade medieval), vamos pensar na fundação de uma cidade do nada. Embora ressaltando
que o tema não é necessariamente relevante no momento em que Alberti escreve seu tratado
(mas que será mais tarde, quando se começa a construir cidades, especialmente no Novo
Mundo).
Construir uma cidade não é como a construção de um palácio. Nós temos a sensação de que
Alberti fala tanto de uma cidade, por um lado, porque ao menos desde Aristóteles e sua
‘Política’, passar sobre o tema é uma espécie de ‘obrigação’ para um teórico, e em segundo
lugar, se deve falar sobre a reestruturação de uma cidade existente, e disso ele só poderia falar
de casos específicos, sem poder alcançar modelos ou formas atemporais, de gênero abstrato.
Em termos de reestruturação, há apenas casos específicos, mesmo que tenhamos visto que
Alberti geralmente procura evitar a destruição (a própria antiguidade dos edifícios lhes confere
uma dignidade superior).
Mesmo com relação a uma cidade a ser construída a partir do nada, Alberti dá apenas algumas
poucas indicações genéricas. A cidade deveria ser murada e formar um círculo perfeito e,
certamente, é esta a melhor relação entre o tamanho do espaço ocupado e o comprimento dos
muros, mas isso é uma geometria simples; mais adiante Alberti diz:
Não há para cercar as cidades uma única e universal regra a ser aplicada em todos os lugares. (...) Nós já
dissemos que a cidade dotada da maior capacidade será circular. (...) Vamos devemos procurar aproveitar as
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oportunidades que nos são oferecidas pelo local, como observamos o que foi feito pelos antigos que aproveitaram
tanto as vantagens quanto os limitações do lugar. (IV, 3 p. 197, 199, 200 = Krüger p. 292-297)
Adaptar-se, sempre adaptar-se; nunca chegar com soluções preestabelecidas; em face de um
problema para resolver, fazer as perguntas certas. Para o resto, a cidade se situar no meio de
um território; e este deve dar todos os benefícios que eles precisam (este é o velho sonho
autárquico e conservador de origem Pitagórica):
... convém estabelecer a cidade de modo que, na medida em que a razão e a condição das coisas humanos
permitem, seu próprio território o suprindo sem que ela necessidade procurar mais nada em outro local. (...)
Consequentemente, eis aqui minha regra: qualquer que seja a região para se fundar uma cidade, deves de tudo
para que esta cidade garanta a todos os benefícios necessários, sem que sofram nenhum inconveniente (IV, 2 p.
191-192 = Krüger p. 286)
Notamos que este tipo de observação é parte da natureza deste tipo de tratado. Dizer que a
cidade deve ter o maior benefício e a menos inconveniência não é de grande originalidade, ou
melhor, é precisamente com este objetivo que o texto é escrito. Esta é própria natureza
implícita de um tratado. Ao contrário, este pode ser um aspecto do tratado que poderia dar a
impressão de que a cidade descrita por Alberti possui qualidades que não são necessariamente
comuns. Como sabemos a partir do que o próprio Alberti disse sobre o plano em sua obra, em
análise feita por Françoise Choay em seu ‘A Regra e o Modelo’, examinando essas questões a
partir da perspectiva da necessidade, da utilidade, e do prazer. No entanto, esta terceira
dimensão não estava sempre presente em outros pensadores sobre a cidade. Alberti é,
portanto, preciso quando diz que a cidade deve ser projetada não só para atender às
necessidades dos habitantes, mas também deve oferecer, no que tange aos assuntos públicos,
espaços e edifícios agradáveis que contribuam à ornamentação e ao prazer, e ainda praças,
passeios, jardins, parques, piscinas, etc. (IV, 3 p.197 = Krüger p. 293 – todas as coisas que
podem ser encontradas no Livro VIII).
É provavelmente neste ponto que chegamos mais próximo do que poderia ser a ‘cidade do
Renascimento’: uma cidade que possua em seu centro os espaços de deleite. Alberti insiste
ainda em outra passagem do Livro VIII sobre a ausência de salas de espetáculos, especialmente
para concertos e teatro, pontualmente nas cidades de seu tempo (o que mostra bem que
constante referência ao modelo antigo não o impede de propor suas considerações aplicáveis
para um futuro advir, como será mostrado mais tarde na história das cidades européias). A
ênfase colocada pela tratado albertiano na paisagem vai na mesma direção; mais de uma vez, o
autor insiste no deleite que procuramos quando buscamos a beleza nos caminhos de paisagens
circundantes.
Se essas ideias permitem medir o grau de clarividência de Alberti, que traça novas perspectivas
que transformarão, progressivamente, o modo de se pensar a cidade, algumas passagens do
início do Livro V são marcantes por seu realismo, vejam sua spregiudicatezza, sua falta de
escrúpulos. Nós conhecemos as páginas sobre a distinção entre cidade real, aceita por todos, e
a cidade do ‘tirano’ que impõe seu poder a uma população relutante em se submeter e que
deve se proteger contra esses próprios concidadãos através da instalação de uma cidadela no
coração da própria. Certamente, podemos trazer à tona essas páginas do Príncipe (De
principatibus) de Maquiavel, e ver neste a prefiguração de uma autonominação do domínio
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político, que já não dependeria da moral, mas que parece ser uma estranheza dentro da obra de
Alberti. Seria uma maneira de permitir que todos pudessem ler sobre no plano de uma cidade
se você estaria diante da face de uma cidade de um rei ou diante da cidade de um tirano?
Como já mencionamos, Alberti trabalhou para Sigismondo Malatesta, o tirano de Rimini, mas
seria possível enviar conselho a um tirano dizendo explicitamente que ele é um ‘tirano’?
Quando vemos o texto como uma anomalia, é claro que é possível imaginarmos soluções: na
primeira versão, a palavra ‘tirano’ não aparece, e é só mais tarde que Alberti introduziu esta
palavra, para que não fosse mal interpretado sobre aquilo que havia dito, etc. No fundo, na
ausência de evidência, esta passagem mantém-se em mistério. Existe outra passagem, ainda no
início do Livro V, que pode demonstrar seu realismo amoral:
Dividimos a cidade muito convenientemente através de um muro interior que considero deva ser criado não como
um diâmetro, mas na forma de um círculo que deve estar contido dentro de outro círculo: assim, os mais ricos,
que gostam de ter vastos espaços, estarão facilmente afastados do outro espaço, e abandonarão de bom grado o
mercado e do centro da cidade, com suas lojas e oficinas, os necessitados que fiquem ao redor do fórum. Sob estas
condições estará a turfa infame dos cozinheiros, açougueiros, etc, embora fale Gnathon de Térence ameaçar que
estes irão gerar menos suspeita se não estivessem muito excluídos. (V,1 p. 223 = Krüger p. 319)
Construir pura e simplesmente um muro dentro da cidade para separar o povo dos ‘principais
cidadãos’pode parecer um cinismo revoltante, mas notemos que essa proposição permanece
estritamente no âmbito da ‘cidade do tirano’: o tirano deve separar os cidadãos uns dos outros,
a fim de controlar a cidade com mais facilidade; sua muralha interior será mais prontamente
aceita pelos cidadãos mais ricos se eles estiverem localizados do lado de fora do círculo central
– isto é tudo. Pensar que Alberti prescreve isolar neste ponto os grupos sociais, ou confinar as
pessoas (necessariamente perigoso) atrás das muralhas seria um contrassenso. No entanto, é
claro quando estabelece que deve haver quarteirões com funções diferentes, apesar de se
verificar que também neste ponto, o pensamento Alberti parece ser flexível, uma vez que são
áreas diferentes, mas admitimos num raciocínio final que uma interpenetração certo se faz útil:
A presença de várias oficinas de artesãos em locais apropriados em diversas ruas e bairros contribuirá
significativamente para a aprovação da cidade: no fórum, os trocadores, pintores e ourives; logo atrás deste
estarão lojas de especiarias, alfaiatarias e, finalmente, todos os comércios considerados limpos, mas os comércios
fétidos e infecciosos considerados infames, especialmente os curtumes e lixos serão relegados à periferia da cidade
(...). Alguns, sem dúvida, gostarão das áreas nobres dos bairros livre de qualquer sujeira das pessoas comuns.
Outros preferirão que todas as partes da cidade, sem exceção, estejam equipadas com tudo para oferecer o que
possa ser de utilidade na cidade, e é por isso que eles não se recusam a ver lojas próximas às grandes casas. Mas
é exatamente sobre este ponto. A evidente utilidade requer uma coisa, a dignidade da outra. (VII,1 p. 321 =
Krüger p. 432)
Na realidade – e este é o ponto que devemos considerar – o pensamento albertiana sobre a
cidade é caracterizado pela interrogação. É preciso se fazer perguntas. Em muitos casos,
Alberti dá respostas vagas que realmente não ajudam a resolver os problemas que alimentaram
o pensamento quando se colocou os casos concretos. Esta solução é compatível com a
dignidade? Posso fazer melhor no que diz respeito à necessidade, à utilidade, è agradabilidade?
Etc. Ele propõe um programa teórico suficientemente flexível para se adaptar à realidade e
influenciar gradualmente as maneiras de se fazer as coisas. O simples fato de se questionar
74
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo - FAUUSP
sobre a questão do ‘ornamento’ das cidades permite que ele enuncie um resultado que se
assemelhe a um programa:
Mas o ornamento principal das cidades reside no local, o traçado, a configuração e a posição das ruas, do fórum
e dos edifícios, de tal forma que todos estejam bem localizados e distribuídos de acordo com o uso, a comodidade
e a dignidade de todos. De fato, no fim, nada parecerá cômodo, agradável e digno. (VII,1 p. 320 = Krüger p.
430)
Nada disso que foi dito é concreto, mas a palavra essencial a ser dita: ordem. A cidade de
acordo com os desejos de Alberti não é necessariamente feita de avenidas retas e casas em
estilo moderno; no entanto, ele obedece a uma ordem, ou seja, uma reflexão. Vimos que as
posições políticas de Alberti são fundamentalmente conservadoras, mas a ordem não impede o
progresso se este progresso for ordenado, isto é, de acordo com a natureza e a razão.
75
Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
76
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo - FAUUSP
Don García de Silva y Figueroa y la Percepción del Oriente: La
“Descripción de Goa”
Fernando Marías
Universidad Autónoma de Madrid
Uno de los episodios españoles de viaje a Oriente quizá más injustamente olvidado fue el que
realizara en la segunda década del siglo XVII el embajador de Felipe III don García de Silva y
Figueroa, primero a Goa59 y después al reino de Persia, coincidente en parte con el que
doscientos años antes llevara a cabo Ruy González de Clavijo hasta Samarcanda (1404)60.
Este viaje nos es conocido a través de dos manuscritos conservados en la Biblioteca Nacional
de Madrid, el Ms. 18217, titulado "Comentarios de Don Garcia de Sylva que contienen su viaje
a la India y de ella a Persia", y el Ms. 17629, de la Colección Gayangos, "Commentarios de
Don Garcia de Silva de la Embaxada que de parte del Rey de España D. Phelippe III hizo al
Rey Xa Abas de Persia. Año de 1618"61. Si esta relación tuvo un gran e inmediato eco en
59.
Este texto se publicó originalmente en Anuario del Departamento de Historia y Teoría del Arte, xiv, 2002, pp.
137-149, se reedita con mínimos retoques. Desde entonces se ha avanzado enormemente en nuestro
conocimiento del autor y el texto; véanse Luis Gil Fernández, El imperio luso-español y la Persia Safávida, I
(1582-1605), FUE-Antonio Azorín, Madrid, 2006 y Estudos sobre Don García de Silva y Figueroa e os
«Comentarios» da embaixada à Pérsia (1614-1624), eds. Rui Manuel Loureiro y Vasco Resende, Centro de História
de Além-Mar, Lisboa, 2011. Quisiera agradecer vivamente al Profesor Rafael Moreira la ayuda prestada para la
elaboración de este trabajo, que fue originalmente presentado al Congreso Internacional "A arte na rota dos
descobrimentos portugueses", organizado por la Comissâo Municipal dos Descobrimentos de Lagos, Lagos
(Portugal), 1996.
60. A través de Constantinopla y Teherán y, al regreso (p. 197), Qazvín, en 1403-1406; véase Eugenio Llaguno y
Amírola, Historia del Gran Tamorlán: e itinerario y enarracion del viaje, y relación de la embajada que Ruy
Gonzalez de Clavijo le hizo por mandado del... rey don Henrique el tercero de Castilla. Y un breve discurso fecho
por Gonzalo Argote de Molina para mayor inteligencia de este libro Segunda impresion a que se ha añadido la
vida del gran Tamorlan... que escribió don Garcia de Silva y Figueroa..., Madrid, 1782, y Relación de la embajada
de Enrique III al Gran Tamorlán, ed. de Francisco López Estrada, Espasa-Calpe, Madrid, 1952; también Juan Gil,
En demanda del Gran Kan. Viajes a Mongolia en el siglo XIII, Alianza, Madrid, 1993.
61. Este manuscrito, según el propio texto, fué compuesto por un autor no identificado ya en Madrid, a partir de
los originales del embajador, tras el regreso de la embajada; contiene el Libro III (desde Ormuz), IV y V (viaje
tierra adentro); faltan los Libros I (sobre el viaje a Goa) y II (descripción de Goa). Asimismo da cuenta de la
embajada el Ms. 2348 (fols. 519-520), de la Biblioteca Nacional de Madrid, "Relación de la jornada de Dom
García de Sylva dada por [el agustino portugués] Fr. Melchor de los Angeles" [Madrid, 30 de diciembre de 1619];
ha siso publicada en Documentação Ultramarina Portuguesa, I, Centro de Estudios Históricos Ultramarinos,
Lisboa, 1960, pp. 139-140, y A. Hartmann OSA, “William of St. Augustine and His Time”, Augustiniana, 20,
1970, pp. 634-636. Fray Melchor había hecho profesión en Goa en 1587, y había sido enviado a Persia como
embajador por el virrey Luiz Pereira, Conde de Feria, en 1608. De regreso en Madrid en 1636, Felipe IV lo
nombró su predicador en 1643, donde murió poco después. Véase sobre él, "Historia do Martyrio de Fr. Nicolâo
de Mello e Fr. Guilherme de Santo Agostinho, com a relaçâo das cousas notaveis que na Persia fizerâo os
Religiosos de Santo Agostinho" (Ms. del convento de Nuestra Señora de Gracia de Lisboa) y Z. Novoa, "El R. P.
Fr. Melchor de los Angeles del Orden de S. Agustín, primer misionero en Persia", Archivo Agustiniano, 45, 1951,
pp. 263-275; R. Gulbenkian, L'ambassade en Perse de Luis Pereira de Lacerda et des Pères Portugais deL'Ordre
de Saint-Augustin, Belchior dos Anjos et Guilherme de Santo Agostinho, 1604-1605, Lisboa, 1972; Carlos
Alonso, “Cartas del P. Melchor de los Ángeles, OSA, y otros documentos sobre su actividad en Persia”, Analecta
Augustiniana, 44, 1981, pp. 249-298; y Luis Gil, "Sobre el trasfondo de la embajada del Shah Abbas I a los
príncipes cristianos: contrapunto de las Relaciones de Don Juan de Persia", Estudios Clásicos, 89, 1989, pp. 347ss.
77
Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
Europa, como demuestran los extractos y la traducción al francés que se publicaron durante las
siguientes décadas62, no fue redescubierta y publicada hasta comienzos del siglo XX63; desde
entonces ha pasado prácticamente desapercibida e incluso la existencia de esta edición pueda
justificar el hecho de que la presencia de un importante mapa de Goa que los manuscritos
recogen no haya sido dada a conocer hasta la fecha64.
Como quizá es sabido, una embajada del Shah Abbas I el Grande de Persia (1587-1629)65 llegó
a Madrid en 1608, contemporáneamente a la que el agustino portugués Fr. Melchor de los
Ángeles realizara a Persia como enviado del virrey Luiz Pereira de Lacerda, Conde de Feria, en
el mismo año de 1608. Pocos más tarde, en 1614, Felipe III recibió del Shah Abbas una nueva
embajada presidida por el religioso descalzo Fray Redempto de la Santa Cruz. Mientras tanto,
Miguel de Soria ("Libro de las cosas memorables que han sucedido desde el año de mil quinientos noventa y
nueve", Madrid, Biblioteca Nacional, Ms. 9856), narra la visita de la embajada de Persia a Madrid de 1608, a la que
se correspondió con otra, citada por Gil González Dávila, Teatro de las grandezas de la Villa de Madrid Corte de
los Reyes Catolicos de España, Madrid, 1623, p. 125; citadas por Alicia Cámara Muñoz, Arquitectura y sociedad
en el Siglo de Oro. Idea, traza y edificio, El Arquero, Madrid, 1990, p. 191. Véase también Ciriaco Pérez
Bustamante, La España de Felipe III. Historia de España, xxiv, Espasa-Calpe, Madrid, 1983, p. 404.
62. Véase [García de Silva Figueroa] Garciae Silva Figueroa, Philippi III, Hispaniarum Indiarumque regis, ad
Persiae regem legati, de rebus Persarum Epistola v. Kal. an. MDCXIX Spahani extracta ad marchionem Bedmari,
nuper ad Venetos, nunc ad Sereniss. Austriae Archiduces, Belagranum principes, regium legatum, Amberes, 1620;
A letter from Garcia de Silva y Figueroa embassador from Philip the Third king of Spaine to the Persian, written
at Spahan, or Hispahan, Anno 1619, to the Marquis of Bedmar, touching matters of Persia, Londres, 1625 y,
sobre todo, L'ambassade de Don Garcias de Silva Figueroa en Perse, trad. de Mr. de Wicqfort, Jean de Puy/L.
Billaine, París, 1667. Los dos primeros textos reproducían la carta, con la descripción de la antigua Persépolis,
enviada por don García a don Alonso de la Cueva y Carrillo (1572-1655), I Marqués de Bedmar, embajador
español en Venecia (1607-1618), desde Ispahan, el 28 de diciembre de 1618; de una hipotética primera edición de
esta epístola, quizá realizada en la propia Venecia, aunque había sido expulsado en 1618, nada se sabe; véase
Carlos Alonso, La embajada a Persia de D. Garcia de Silva y Figueroa (1612-1624), Diputación, Badajoz, 1993,
pp. 228-231. Puede tratarse de un simple error y que la primera edición, dedicada a los Archiduques de Austria,
ante quienes ejercía su nueva embajada en Bruselas y, en realidad, como primer ministro, fuera la bruselesa de
1620. Sobre Bedmar, Carlos Seco, "El Marqués de Bedmar y la conjuración de Venecia 1618", Revista de la
Universidad de Madrid, 1955, pp. 334 y ss.
63. Citada por Manuel Serrano y Sanz, Autografías y Memorias coleccionadas e ilustradas, Nueva Biblioteca de
Autores Españoles, Madrid [1902], pp. xii-xvi, fue impresa de inmediato por Manuel Serrano y Sanz, García de
Silva y Figueroa. Comentarios de la embajada que de parte del rey de España hizo añ rey Xa Abas de Persia, 2
vols., Sociedad de Bibliófilos Españoles, Madrid, 1903-1905. Véase también César Fernández Duro,
"Comentarios de D. García de Silva y Figueroa", Boletín de la Real Academia de la Historia, xliv, 1905, pp. 271276; y "Comentarios de D. García de Silva y Figueroa", Boletín de la Sociedad Geográfica, xlvi, 1907, pp. 52-58.
Ahora, desde un perspectiva fundamentalmente política, el ya citado trabajo de Carlos Alonso, La embajada a
Persia de D. Garcia de Silva y Figueroa (1612-1624), Diputación, Badajoz, 1993. Ya Eugenio Llaguno y Amírola,
Historia del Gran Tamorlán...., Madrid, 1782, pp. 221-228, había utilizado y citado los Comentarios.
64. El Ms. 18217, incluye en el fol. 6 (antes en el fol. 90) un mapa de Goa. El Ms. 17629 no aparece dicho mapa.
65. Bisnieto de Ismail I (1501-1524), nieto de Tahmasp I (1524-1576) e hijo y sucesor de Mahommed Mirza o
Khuda-banda, así como sobrino de Haidar Mirza y de Ismail II, Abbas fue el sexto (para otros historiadores el
cuarto) rey de Persia de la dinastía chiíta de los safavíes, que gobernó hasta 1722. Aunque concertó una paz en
1590 con los otomanos sunitas -tras la guerra con el sultán Murad II (1574-1594) en Georgia- que reconocía las
pérdidas persas de Georgia, Tabriz, Shirván y el Luristán, Abbas I reanudó las hostilidades en 1594 y 1597 y entró
en guerra contra Muhammad III en 1601; reconquistó Eriván y Kars en 1601, expulsó a los otomanos del
Azerbaiján y del Cáucaso en 1603 y retomó Georgia y Shirván en 1605 y más tarde el Irak central, Bagdad y
Mosul, manteniendo campañas victoriosas frente a los sultanes Ahmed I y Osman II (1618-1622), con quien
firmó una nueva paz. En 1602 tomó a los portugueses la isla de Bahrein y poco después la isla de Quishm; en
1622 con ayuda naval inglesa, Abbas atacó y conquistó Ormuz.
78
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el rey de España -por iniciativa del virrey de Portugal Cristóbal de Moura- había decidido
organizar una embajada castellana, para intentar convencer al Shah de que mantuviera su
guerra contra el Imperio turco, que encomendó a don García de Silva y Figueroa y que éste
aceptó en Madrid el 19 de octubre de 1612; no obstante, la misión se retrasó y las instrucciones
reales no fueron otorgadas hasta el 9 de agosto de 1613 y, desde San Lorenzo del Escorial, el
13 de agosto66.
No es mucho desgraciadamente lo que sabemos sobre el embajador don García de Silva y
Figueroa67. Se le ha supuesto nacido en la ciudad extremeña de Zafra el 29 de diciembre de
1550, como hijo primogénito de don Gómez de Silva y doña María de Figueroa; pero en
realidad era bastardo del Duque de Feria Gómez Suárez de Figueroa y Toledo y de María de
Silva; pertenecía, por lo tanto, a la familia de los Duques de Feria, y fue asimismo primo del
jerezano (de Jerez de los Caballeros) don Juan de Silva, nombrado gobernador de las Islas
Filipinas desde 1609 a 161668 y, por lo tanto, descendiente del embajador quinientista en
Venecia el toledano don Diego Guzmán de Silva. Fue tio de los gobernadores de las Filipinas
don Jerónimo (1616) y don Fernando de Silva (1625-1626) y caballero de la Orden de
66.
Estas instrucciones se recogen como apéndice en el Ms. 17629. Véase C. Alonso, op. cit., pp. 27-69.
Véase M. Serrano y Sanz, op. cit. y ahora García de Silva y Figueroa. Epistolario diplomático, ed. Luis Gil,
Instituto Cultural El Brocense, Cáceres, 1989, y C. Alonso, op. cit., pp. 19-26.
68. Juan Gil, Hidalgos y samurais. España y Japón en los siglos XVI y XVII, Alianza, Madrid, 1991.
67.
79
Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
Calatrava. Don García habría sido paje de Felipe II y más tarde habría estudiado leyes en
Salamanca, para alcanzar –según fuentes icnontrolables- como militar en Flandes el grado de
capitán. Se le tenía por hombre “de buen juicio y sutil entendimiento, visto y leído y muy
versado en la lengua latina e italiana”69. Más tarde don García ocupó puestos menores en las
administraciones locales de varias ciudades, pues había sido corregidor de la ciudad de Badajoz
y más tarde, desde 1595 a 1597, ocupó idéntico cargo y el de justicia mayor en Jaén y Andújar,
desde donde socorrió Cádiz con el Duque de Medina Sidonia en 1596; parece por sus
comentarios haber tenido alguna experiencia en tierras italianas, en concreto en Venecia,
aunque desconocemos las funciones y circunstancias.
Parece también don García haber sido un hombre culto, a tenor de sus lecturas, e interesado
por las antigüedades, habiendo llegado a coleccionar algunas estatuas que habría tomado de las
ruinas de Mérida70. Debía poseer también conocimientos importantes de matemáticas y
navegación, como atestiguarían tanto sus relaciones y juicios sobre algunos inventores de
ingenios náuticos durante los años de su estancia madrileña como sus críticas a su compañero
de viaje el supuesto matemático e inventor Antonio de Marís71, quien había sido recomendado
por el provincial y los frailes de Nuestra Señora de Gracia de San Agustín en Ormuz y al que
dirigió numerosas consideraciones despectivas, al denominarlo "Aguxafixa" y señalar que
carecía de conocimientos de letras. Aunque se ha identificado recientemente este personaje con
el soldado, evangelizador de Chile y matemático Antonio Parisi72, quizá se tratara en realidad
del cosmógrafo mayor António de Mariz Carneiro73.
69.
Según el historiador de la India portuguesa Antonio Bocarro, Década 13 da História da India, ed. Rodrigo José
de Lima Felner, Lisboa, 1876, I, p. 370; citado por C. Alonso, op. cit., p. 22.
70. M. Serrano y Sanz, op. cit., II, p. 393. Publicó de forma póstuma don Gacía, en Lisboa en 1628, una especie de
síntesis de la historia de España (Hispanicae historiae breviarium... autore... D. Don Garcia de Silva & Figueiroa...
Ex Bibliotheca Noguerica nunc primúm edit Antonius Furtado da Rocha..., Manuel de Silva, Lisboa, 1628
(B.N.P., Res. 187P), aparentemente escrita en Goa, citada por Nicolás Antonio, Bibliotheca Hispana Nova,
Madrid, 1783, I, p. 517, y por C. Alonso, op. cit., p. 26.
71. Ms. 18217, fol. 66.
72. Sobre éste, véase Juan Gil, Mitos y utopías del Descubrimiento. 2. El Pacífico, Alianza, Madrid, 1989, pp. 324334. Don García había tenido desde 1609 relaciones, siempre incrédulas, con otros inventores fantasiosos y
embaidores como Lorenzo Ferrer Maldonado o Juan de Fonseca Coutinho.
73. De quien se conserva una copia del Libro de António Bocarro e ilustraciones de Pedro Barreto de Resende,
archivero y secretario del virrey Conde de Linares (ca. 1630); véase Pedro Dias, Antonio de Mariz Carneiro.
Descriçâo da fortaleza de Sofala e das mais da India, Lisboa, 1991, y A arquitectura militar na expansâo
portuguesa, Lisboa, 1994, p. 138.
80
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo - FAUUSP
Recibidas las instrucciones de su embajada persa, todavía permaneció don García en Madrid
hasta finales de febrero de 1614 y, tras trasladarse a Lisboa, partió de aquel puerto el 8 de abril
de 1614, con tres naves74, así como un cortejo difícil de precisar75, para llegar a Goa el 6 de
noviembre de 1614. En la colonia portuguesa de la India permaneció don García tres años, en
concreto hasta el 21 de marzo de 1617, a causa de las trabas que el gobernador de Goa don
Jerónimo de Acevedo puso a su viaje, al considerar que debía ser un portugués el embajador y
no un castellano. Por fin, don García terminó por embarcarse en una pequeña nave el 21 de
marzo de 1617, con su comitiva, una veintena de tripulantes moros y un piloto persa llamado
Mustafá, que usaba un extraño instrumento de navegación en lugar de la brújula, y desde allí
dirigirse a Ormuz, adonde llegó -tras detenerse en Muscate o Masquat, en la costa árabe de
Omán76- el 22 de abril de 1617, siendo recibido por el capitán de la fortaleza Don Luis de
Gama77.
Desde allí siguió primero la costa de la Carmania (Querman) la Desierta (situada entre el cabo
Guadel y la desmbocadura del Eufrates y al sur de la Carmania la Abundante), y donde se
extendían los reinos de Lara [Lârestân] y Oesa o Monbareca, con la tierra de Mogostán, hasta
llegar a la costa de Bandar o Bandel [¿Bandar-Abbas?], y desde donde le esperaba Kaçen Bec
en nombre del Shah Abbas, donde empezó el viaje por tierra, adentrándose en Persia en
octubre de 1617.
Desde la ciudad de Lâr pasó a Shiraz, donde permaneció desde el 24 de noviembre de 1617
hasta el 4 de abril de 1618, para visitar, después de abandonar esta ciudad, las ruinas de
Chilminara, la antigua Persépolis. Otra parada importante de su itinerario fue la ciudad de
Isphahan, desde la que partió a Casbín [Qasvin], donde logró entrevistarse con el Shah y donde
permaneció desde el 13 de junio hasta agosto de 1618. Desde allí volvió a desandar el camino,
embarcándose de nuevo hacia Goa el 15 de diciembre de 1619.
74.
La capitana Nuestra Señora de la Luz, la almiranta Nuestra Señora de los Remedios y una tercera, Nuestra
Señora de Guadalupe.
75. Conocemos los nombres del maestresala, Pedro Jiménez (de Ledesma), el capellán Vicente Sorrentino -al que
se añadieron desde Ormuz los religiosos agustinos Fray Manuel del Pópulo y Fray Luis de Rivera-, el
gentilhombre Gutiérrez de Monroy, el repostero Juan González, el repostero italiano César, dos criados
portugueses -Simón y Lobo- y uno piamontés Jusepe, y un anónimo pintor. Es posible que también lo
acompañara un sobrino del embajador, don Fernando de Silva, antes capitán en Flandes y que marchó a Persia
como "entretenido"; véase J. Gil, Hidalgos y samurais, p. 153, n. 33.
76. Sobre esta ciudad, véase A. Pereira Brandâo, A Aventura portuguesa, Lisboa, 1991 y el diseño del "Libro de
Bocarro", en A Arquitectura militar na expansâo portuguesa, Oporto, 1994, p. 141.
77. Ms. 17629, fol. 179 vº y ss. Ormuz parecía una ciudad de unas 2.500 o 3.000 casas; se fijó especialmente en la
iglesia mayor y Casa de Misericordia, derivada de la antigua mezquita destruida, pero de la que se había
conservado un altísimo Alcorán o Torre, "muy labrada por de fuera". También dedicó algunos párrafos a los
monasterios del Carmen y de San Agustín o de Nuestra Señora de Gracia -que M. Serrano y Sanz, op. cit.,
consideró de Mascate-. Véase sobre su arquitectura, Wolfgang Kleiss, "Die portugiesische Seefestung auf der Insel
Hormoz am Persischen Golf", Architectura, 1978, pp. 166-183 y Rafael Moreira, "Inofre de Carvalho, a
Renaissance Architect in the Gulf", en Bahrain in the 16th Century: An Impregnable Island, ed. por M. Kervan,
Manama, 1988, pp. 85-92.
81
Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
En Goa permaneció nuevamente algunos meses, hasta que el 19 de diciembre de 1620, salió la
carabela que debía llevarlo de regreso a España78, hallándose el 28 de abril de 1621 a la altura
del Cabo de Buena Esperanza79; sin embargo, las condiciones de navegación le obligaron a
retornar a Goa. Su tercera estancia se prolongó durante dos nuevos años y medio, y allí otorgó
testamento don García el 11 de noviembre de 1622; pensando en un feliz retorno, decidió
enterrarse en la capilla del Santo Cristo de San Benito de Zafra, hoy en ruinas y entonces
también conocido vulgarmente como de San Francisco, a la que dejo la plata de su propio
oratorio, en la capilla que su familia había utilizado hasta la fecha, y nombró heredera de sus
bienes a la cofradía de la Caridad de Zafra; a ésta encargó que cuidasen de los reparos de su
capilla, con una nueva reja y que abriesen una media naranja con sus vidrieras80.
78.
Ms. 18217, fol. 499.
Ms. 18217, fol. 541 vº.
80. C. Alonso, op. cit., p. 287 añade algún dato sobre esta fundación, tomada de Fray José de San Miguel OFM,
Crónica de la provincia franciscana de San Miguel, ed. Antolín Abad García OFM, Crónicas franciscanas de
España 19, Madrid, 1989, p. 309. Sobre este convento de franciscanos observantes, véase ahora, Juan Carlos
Rubio Masa, El mecenazgo artístico de la Casa ducal de Feria, Editora Regional de Extremadura, Mérida, 2001,
pp. 237-239.
79.
82
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo - FAUUSP
Por fin, la partida definitiva tuvo lugar en enero de 1624, pero el embajador cayó enfermo en la
costa africana81 y -los apuntes del embajador llegan hasta el 28 de abril de 1624- murió don
García de Silva a causa del "mal de Luanda" o disentería, el 22 de julio de 1624, en medio del
Atlántico, a 35º de latitud Norte, a 110 leguas al sur de las islas de las Flores y el Cuervo, las
más occidentales del archipiélago de las Azores. La expedición arribó finalmente, once años
después de su partida, al puerto de San Sebastián en octubre de 1624.
Vamos a ocuparnos en esta ocasión exclusivamente del largo informe de don García de Silva
sobre la ciudad de Goa, que parece haber iniciado, durante su primera estancia en la ciudad, el
4 de febrero de 1615 y terminado el 9 de enero de 161782, por lo tanto uno de los primeros
conservados83 y el único conocido hasta la fecha de un español; incluye también un
81. El Ms. 17629, quizá por error, da como lugar de su muerte "el mar de Luanda". Véase también C. Alonso, op.
cit., pp. 280-287.
82. Ms. 18217, fols. 88-156.
83. Sobre éstos, A. R. Machado, ed., Livro em que da relaçâo do que viu e ouviu no Oriente, Lisboa, 1946. José
Nicolau da Fonseca, An Historical and Archeological Sketch of the City of Goa, Bombay, 1878 (Asian
Educational Services, New Dehli, 1986); Jacques de Coutre, Andanzas asiáticas, ed. de Eddy Stols, B. Teensma y
J. Werberckmoes, Historia 16, "Crónicas de América" nº 61, Madrid, 1991; Boies Penrose, Goa, Rainha do Riente,
Lisboa, 1960; Georg Schurhammer S. J., Franz Xavier: Sein Leben und seine Zeit, Freiburg im Breisgau, 1963.
Sobre el viaje de Jan Huyghen van Linschoten (ca.1563-1611) a Goa (1583-1589), The Voyage of Jan Huyghen
van Linschoten to the East Indies, ed. de A. C. Burnell y P. A. Tiele, 2 vols., Hakluyt Society, Londres, 1885; el de
François Pyrard de Laval (1611), en The Voyage of François Pyrard de Laval to the East Indies, the Maldives, the
83
Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
interesantísimo mapa de la zona84 que, aunque publicado hace más de tres décadas85, no ha
recibido la atención que merece. Reviste una doble importancia, por una parte como imagen
cartográfica; con el mapa del distrito de Goa del "Atlas" de 1610 y, sobre todo, el de la "Taboa
da Ylha de Goa" del "Atlas-Misceláneo" de Lisboa, de hacia 1615-162286, atribuído a Manuel
Godihno de Herédia, que presentan algunos elementos comunes, el madrileño constituiría uno
de los más antiguos mapas portugueses de Goa que se conocen.
Por otra parte, también tiene interés como imagen urbana de la ciudad. Si dejamos aparte la
vista grabada y publicada en el "Civitates orbis terrarum" de Georg Braun y Franz Hogenberg
(casi como imagen de la ciudad musulmana de Goa, fundada hacia 1460 por Melik Hussein,
realizada en las primerísimas décadas del siglo XVI), la que ahora presentamos sería la segunda
o tercera de las conocidas. La primera sería la vista caballera publicada por el holandés Jan
Huyghen van Linschoten (ca. 1563-1611), tras su estancia en Goa entre 1583 y 1589, y fechada
en 1595 (editada por Baptista van Dentecum y publicada en París en 1610)87. La segunda o
tercera sería la planta o -según su leyenda- "Plantaforma da Cidade de Goa" del cartógrafo
nacido en Malaca Manuel Godinho de Herédia (1563-1623), fechada entre 1615 y 1620)88. El
mapa y planta de Goa incluídos en la relación de García de Silva sería contemporánea o, algo
anterior, a este lustro de la segunda década del siglo XVII y quizá también anterior a la de
Herédia, desde luego a la cuarta conocida, el grabado anónimo incluído en la obra "Ásia
Maluccas and Brazil, ed. de Albert Gray y H. C. P. Bell, Hakluyt Society, Londres, 1887-1890; sobre el de Pietro
della Valle (1623), más allá de la ed. de Roma, 1668, véase The Travels of Pietro della Valle in India, ed. de Sir
Richard Carnae Temple y Lavinia Mary Anstey, 6 vols., Hakluyt Society, Londres, 1907-1936, y P. Gaeta y L.
Lockhart, I viaggi di Pietro Della Valle, Istituto Poligrafico dello Stato, Roma, 1972. También véase Diogo
Ramada Curto, “Representações de Goa: Descrições e relatos de viagem”, en Histórias de Goa, Fundação
Oriente-Comissão para as Commemorações dos Decobrimentos portuguesês, Lisboa, 1997, pp. 45-85; Catarina
Madeira Santos, Goa: corte e cerimonial. Os constructores do Oriente português, Comissão para as
Commemorações dos Descobrimentos portuguesês, Oporto, 1998.
84. Ms. 18217, originalmente en fol. 90 pero hoy a la altura del fol. 6. Mapa sobre papel, 282 x 410 mm., a pluma y
tinta sepia, con aguadas sepia, roja y amarilla; con pitipié de "mea legoa"; se orienta hacia el Sur. Se trata de un
mapa portugués, a tenor de la toponimia y las inscripciones explicativas escritas en lengua portuguesa, referidas
por una parte al paso de los moros a la isla de Choram en la época del gobernador Francisco Barreto y, por otra, a
los moradores de las islas de Calvi y Corgi. Es digno de señalarse que no aparezcan señalados algunos de los
principales colegios de Goa: San Pablo, San Roque y el Noviciado de los jesuitas, San Buenaventura de los
menores y de los Reyes Magos de Bardes. Además, aparecen representadas dos importantes cintas abaluartadas:
una desde Daugín, Gondalín, Banastarín hasta Carabolín y Ajocím, con un total de catorce baluartes; otra, solo
trazada con punteado, desde Ajocím hasta Panelín y Rabandar, con cinco baluartes y un "Castello de Santangel"
de forma romboidal y cuatro torres angulares de planta circular. Estos hechos -la representación como proyecto
de la ciudadela de Santangel y la ausencia de algunas de las más recientes fábricas- podría plantear algunas dudas
sobre la cronología -último tercio del siglo XVI- del original que manejara el autor de este mapa.
85. Portugaliae Monumenta Cartographica, ed. de Armando Cortesâo y Avelino Texeira da Mota, Lisboa, 1960, IV,
pp. 51-52, nº 413c. Las medidas que le atribuyen (512 x 745 mm.), que han hecho pensar a los citados autores que
se trataría del mayor dibujo conocido de Manuel Godinho de Herédia, no coinciden con los del original de la
Biblioteca Nacional de Madrid, más reducido.
86. Procedente de la Colección del Dr. C. M. C. Machado Figueira, de Lisboa.
87. Véase en The Voyage of Jan Huyghen van Linschoten to the East Indies, ed. de A. C. Burnell y P. A. Tiele, 2
vols., Hakluyt Society, Londres, 1885. Fue reeditada varias veces, entre ellas en 1599 por Theodor de Bry, desde
entonces.
88. Procedente de la Colección del Dr. C. M. C. Machado Figueira, de Lisboa. Véase en Portugaliae Monumenta
Cartographica, ed. de Armando Cortesâo e Avelino Teixeira da Mota, Lisboa, 1960, IV, pp. 39-60, nº 420 E y en
Teotónio R. de Souza, Goa medieval. A cidade e o Interior no Século XVII, Editorial Estampa, Lisboa, 1994, p.
108.
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Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo - FAUUSP
Portuguesa" (Lisboa, 1666) por el hijo del famoso poeta, cronista y secretario del Marqués de
Castel Rodrigo don Manuel de Moura don Manuel de Faria e Sousa (1590-1649)89.
Nuestro mapa -anónimo- puede ser atribuído también a Manuel Godinho de Herédia y
fecharse lógicamente durante los años de la estancia en Goa tanto de García de Silva como del
cartógrafo portugués, hacia 1616; confiere primordial importancia a la situación topográfica de
la isla y su entorno, algo que solo sumariamente reflejó Jan Huyghen van Linschoten en su
vista, plagada de errores geográficos; constituye posiblemente, por lo tanto, el más antiguo
levantamiento cartográfico de calidad de la isla de Goa y el territorio de su entorno.
Godinho de Herédia, en cambio, prestó mucha menor atención que Huyghen van Linschoten
a la distribución viaria de la ciudad, que recogió de manera más reductiva que propiamente
esquemática; tanto el holandés como Faria e Sousa centraron su interés en la descripción de los
edificios y las calles de la ciudad, aunque quizá de forma un tanto convencional y esquemática léase inexacta al incluirse una relación proporcionalmente errónea entre las medidas de la
planta y la de los alzados de los monumentos y el caserío- en la disposición concéntrica de
muchas de ellas. Además, tiene el interés añadido de que aparecen representadas la forqa de
justicia y dos importantes cintas abaluartadas: una desde Daugín, Gondalín, Banastarín hasta
Carabolín y Ajocím, con un total de catorce baluartes. Otra, solo trazada con punteado, desde
Ajocím hasta Panelín y Rabandar, con cinco baluartes y un "Castello de Santangel" de forma
romboidal y cuatro torres angulares de planta circular; aquella se corresponde con la nueva
muralla abaluartada -hoy desaparecida- que cerraba Goa por el suroeste y que fue iniciada en
89.
Publicada por R. Moreira, "Goa em 1535: uma cidade manuelina", Revista da Faculdade de Ciências Sociais e
Humanas, 1994, pp. 177-221, p. 185.
85
Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
1568 por el virrey don Luís de Ataide; a medio camino de esta importantísima defensa estaba
proyectada, aunque nunca llegara a realizarse, una ciudadela de planta como ya hemos señalado
romboidal, de la que nos da testimonio este plano de Godinho de Herédia. En este sentido, el
mapa de Goa de la Biblioteca Nacional de Madrid parece constituir el complemento de la
planta zenital de la "Plantaforma" del mismo Godinho de Herédia, pasando del contexto
cartográfico de la ciudad a la descripción de su tejido viario en detalle y, de acuerdo con los
modelos más modernos y científicos de la representación urbana, utilizando el medio
planimétrico, excepcional para este género en el conjunto europeo y, sobre todo, para el
ámbito ibérico. Mas al mismo tiempo, la aparición de elementos ya obsoletos podría indicar
que nuestro mapa hubiera sido realizado por Herédia utilizando materiales ajenos del tercer
tercio del siglo XVI que hasta ahora no se han podido identificar.
La descripción de Goa90 se inicia por la situación topográfica, a partir de las bocas del golfo
(situadas a 16º de latitud, añadiéndose al margen que debían restarse 10'[15º 50', en realidad
90.
Véanse fols. 119 vº-130. Véase sobre este tema, José Pereira, In Praise of Christian Art in Goa, Marg
Publications, Bombay, s. a. Mário Chicó, "A Igreja dos Agostinhos de Goa e a Arquitectura da India Portuguesa",
Garcia de Orta, II, 2, 1954; "A igreja do Priorado do Rosário de Velha Goa, a arte manuelina e a arte do
Guzarate", Belas Artes, 2, 7, 1954; "Algumas observaçôes acerca da Arquitectura da Companhia da Jesús no
Districto de Goa", Garcia de Orta, 1956, pp. 257-272. Carlos de Azevedo, "The Churches of Goa", Journal of the
Society of Architectural Historians, xv, 3, 1956, pp. 3-6, "A arquitectura religiosa", en Arte Cristâ na India
Portuguesa, Lisboa, 1959 y "Arte Cristâ", en A Arte de Goa, Damâo e Diu, Lisboa, 1969 y 1993. J. Delinkar S. J.,
86
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo - FAUUSP
entre 15ª 44' y 14º 53' N], y 160º de longitud [en realidad entre 73ª 45' y 74ª 26' E]). Sitúa el
comienzo de la isla en el cabo de Talangan [en el mapa Taleigam], que separaba dos los rios
que la rodeaban [el Mandavi al norte y el Juari, al sur, separando la tierra de Marmagâo o
Mormugâo, Murmugam] y en cuya punta se encontraba la ermita de Nuestra Señora do Cabo
de los franciscanos descalzos, para situar de inmediato el lugar donde se hallaban las ruinas de
Goa la Vieja, al pie del montecillo de Nuestra Señora del Pilar.
Al norte de la entrada al rio Pangín [Panaji, Panjim o Mandavi] se encontraban dos fortalezas,
de Bardes y del Aguada, primero el Castillo del Farol, del que quedaban los principios de un
fuerte que no se había acabado en Bardes, y más adelante el castillo de la Embocadura. Es
extraño que don García se detuviera escasamente en la descripción del castillo de la Aguada, la
obra del mestre de obras de fortificaçâo da cidade de Goa y engenheiro-mor da Índia Júlio
Simâo (1604-1612), hoy considerada como una de las mayores obras de arquitectura militar del
"The Christian Empress, Churches and Cloisters", Golden Goa, Marg Magazine, Bombay, 1980, pp. 617-626.
David Martin Kowal, "The Evolution of Ecclesiastical Architecture in Portuguese Goa", Carl Justi Vereinigung
Mitteilungen, 1993, pp. 1-22. Teotónio R. de Souza, Goa medieval. A cidade e o Interior no Século XVII,
Editorial Estampa, Lisboa, 1994, pp. 104-110. Rafael Moreira, "From Manueline to Renaissance in Portuguese
India", Mare Liberum, 9, 1995, pp. 401-407; "Goa em 1535..."; y “Riflessi della Ghiara nell’India Portoghese: la
Chiesa dei Teatini a Goa”, en La Basilica della Ghiara. Il Miracolo della Città, Reggio Emilia, 1997; Helder Carita,
Palaces of Goa. Models and Types of Indo-Portuguese civil Architecture, Londres, 1999; y Paulo Varela Gomes,
Arquitectura, religião e política em Portugal no Século XVII. A planta centralizada, Universidad de Oporto,
Oporto, 2001.
87
Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
Renacimiento construídas en todo el mundo91. Al norte del rio Pangín se encontraba la isla de
Divar, donde se hallaba la fortaleza de Narva o del Espíritu Santo, pequeña obra antigua,
realizada por los moros unos doscientos años atrás, con dos torres y una barbacana, y donde se
encontraba la Pagoda, el templo y la pequeña población de Narva (Narve).
Don García retorna al rio Pangín y al extremo oriental de la isla de Goa, situando la fortaleza
de Pangín [Daugín] que había ganado don Alfonso de Albuquerque, también obra antigua de
los moros, con una barbacana y una pequeña torre de unos 20 pies de anchura interior y dos
pisos, redonda en su primera mitad y hexagonal en su parte alta; en 1616, sin embargo, la torre
se había acabado de rehacer de otra forma por obra de la Cámara de Goa "para [la] recreación
de los virreyes", con una hermosa casa de muy "acomodados aposentos". Hacia el sur, en
Gondalín, se encontraba la fortaleza de San Blas, un baluarte redondo de fábrica grosera y
antigua, con una casa para el alcaide; otro baluarte, cuadrado y muy alto, se hallaba en
Benasterím [Banastarín], también hacia el sur siguiendo la costa de la isla; se trataría del primer
baluarte construído en Goa en 1511, inmediatamente después de su conquista por Alfonso de
Alburquerque, al que se añadirían otras obras en 1526, durante el gobierno de Lopo Vaz de
Sampaio. Manteniendo esta dirección de acuerdo con las agujas del reloj, don García pasó a la
zona de Goem, en la que se extendía la playa de Guadalupe, lugar donde "se pasean y
entretienen los vecinos", poblada de hermosas quintas y jardines, con muy "buenas y
acomodadas" casas en las que se pasaban los inviernos y épocas de lluvia; hacia el interior se
encontraba la iglesia de Nuestra Señora de Guadalupe, fundada por los primeros portugueses
que habían llegado. Desde allí se alcanzaba fácilmente Goa la Vieja [Goa Velha], la antigua
ciudad hindú y musulmana, con la "casa de los gentiles" y un estanque con cocodrilos de
pequeño tamaño92.
A partir de este momento93, el embajador se centró en la nueva ciudad de Goa [hoy Velha
Goa], "metrópoli principal de la colonia de los españoles de la corona de Potugal" (desde 1530
había sustituído a Cochin como la capital administrativa de las Indias portuguesas y desde 1557
era, como sede arzobispal, su capital religiosa), aunque no le mereciera de entrada un juicio
positivo su distribución urbana, pues "la ciudad es toda desordenada, descompuesta y
esparzida... con las más de las calles muy torcidas, sin ninguna pulicía ni concierto". No
obstante, no todo eran adjetivos peyorativos pues en la "grandeza, ornato y sumptuosidad" de
sus templos, se podía "compara esta ciudad con muchas de las más célebres ciudades de
Europa"; en cierto sentido, a tenor de sus juicios sobre su arquitectura, el embajador español
habría estado quizá de acuerdo con el dicho "Quem vio Goa, excusa de ver Lisboa", aunque
no llegara a definirla en términos de "Goa Dourada" o "Roma del Oriente". Comienza su
narración con la descripción de la zona septentrional abierta al rio Pangín, entre las parroquias
de San Pedro [de Panelim, fundada en 1542] y Santa Lucía [de Daugín, fundada en 1544],
donde había buenas casas. El centro estaba constituído por la zona rodeada por un muro de la
antigua ciudad, que giraba desde la fortaleza y Casa de los Virreyes hasta la Puerta de la
Misericordia, el Buen Jesús, San Francisco, la Plaza del Bazarino, Santa Catalina [capilla erigida
91.
J. M. do Carmo Nazareth, "O arquitecto Júlio Simâo", en O Oriente Português, Nova Goa, 1906, III, pp. 458464; Rafael Moreira, "From Manueline...", p. 405.
92. Aquí comienza una larga digresión sobre la fauna de Goa, en la que se pasa revista a sus hienas, lobos,
serpientes, víboras y "culebras de capello" [cobras], camaleones y unos animales incógnitos, del tamaño de las
lechuzas y parecidos a los basiliscos o régulos de Plinio el Viejo, a los que intentó sin éxito cazar con un arcabuz,
93. Ms. 18217, f. 116.
88
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo - FAUUSP
en 1511 en conmemoración de la festividad del día de la conquista de la ciudad], la Iglesia
Mayor [la Sé], las antiguas Casas del Çabayo, la Marina, el Hospital del Rey [o Real, que imitó el
edificio de Lisboa y cuya fachada recibió en 1527 una arquería sobre este mismo modelo], las
Atarazanas [las taracenas, construídas durante el gobierno de don Lopo Vaz de Sampaio y
donde se producían tanto pólvora como piezas de artillería] y la Fortaleza, dentro de cuyo
perímetro se podían contar unas quinientas o seiscientas casas; estas estaban construídas con
una piedra bermeja liviana y quebradiza, con la que estaba hecha la mayoría de las fábricas de
Goa, aunque se usaba en portadas y frontispicios otra vena más maciza de la misma piedra
local94. Esta muralla era similar a las de las fortalezas antiguas de España y conforme a la
costumbre de los moros de Berbería y Asia, con torreones, almenas y saeteras.
El centro de esta zona estaba constituído por la Fortaleza y Casa de los Virreyes, aunque antes
lo había sido la Casa del Çabayo, convertida ya entonces en la Casa de la Inquisición -ya
introducida en 1560-, situada en la Plaza de Leilán [Leilâo]. La Fortaleza [de Santa Catarina] era
también para don García obra de los moros, con un baluarte cuadrado con aposentos y un
pequeño jardín, a pesar de que supuestamente hubiera sido fundada en 1511 por don Afonso
de Albuquerque y la hubiera construído su maestro de obras Tomás Fernandes.
94.
Ms. 18217, f. 114 vº. Más adelante se interesó también de la cal que se usaba en la construcción, procedente
toda ella de las conchas de las ostras.
89
Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
Hacia el sur se extendían los barrios de San Pablo, Nuestra Señora de la Luz [parroquia
fundada en 1543] y la Trinidad; estaban arruinados a causa de las enfermedades de su sitio,
junto a la Laguna de la Trinidad, por lo que los jesuitas se habían pasado desde el "insigne
colegio de San Pablo" [que había sustituído al de Santa Fe de San Francisco Xavier,
inaugurando desde 1560 el uso romano en la arquitectura de la ciudad y del que solo se
conserva una portada] al de San Roque, que se estaba construyendo por entonces. No
obstante, alrededor de esta Laguna diversos vecinos ricos habían edificado quintas y jardines
que podían utilizar parte del año. Desde esta Laguna se podía llegar al barrio de San Matías,
por una calle larga hasta San Pablo y siguiéndose la calle de San Pablo hasta las Carnicerías o el
Azougue y la playa del Pelouriño; a mano derecha se encontraba el Hospital de la Misericordia
y más adelante la Rua Derecha [Direita], la principal de la ciudad ya desde los primeros
momentos del asentamiento portugués, que llevaba hasta el Terrero y la Plaza de la Fortaleza
[de Santa Catarina], en un complejo itinerario difícilmente constatable por el mapa. Una serie
de callejuelas angostas conducían desde la Puerta de la Misericordia, hacia el este, al barrio del
Manduín, poblado por "gente pobre de los naturales" y donde se encontraba un campo donde
se vendían alimentos; más allá se encontraba situado el convento de Santo Domingo, buen
edificio antiguo y grande [dedicado a Nuestra Señora del Rosario y cuya iglesia había sido
construída a partir de 1542 todavía en estilo manuelino]. La calle de Nuestra Señora del Monte
atravesaba una zona de buenas casas hasta alcanzar al final la ermita, situada en la cumbre de la
colina [fundada en 1557].
Tras esta visita, don García enderezó de nuevo sus pasos hacia el centro y la Iglesia catedral de
Goa, la Sé, "adonde se labra agora un grande y sobervio templo de buena architectura"
[nuevamente levantada en 1532 en estilo "antimanuelino" por el gobernador Jorge Cabral,
reconstruída a partir de 1562 quizá con proyecto del maestro real Inofre de Carvalho, y
concluída desde 1596 a 1631 por Júlio Simâo en un claro estilo clasicista]95; el convento de San
Francisco [fundado en 1517 en un estilo manuelino que imitaba el de los Jerónimos de Belém
de Lisboa, según un proyecto del maestro real Leonardo Vaz]96 con una "muy hermosa iglesia";
la pequeña Plaza del Bazarino; y el Buen Jesús, sede de la Casa Profesa de la Compañía de
Jesús, "grande fábrica, hermosa y capaz" [casa construída desde 1585 y parcialmente destruída,
cuya iglesia fue fundada en 1594, tras ser enviados sus planos a Roma en 1586 para que se
eligiera entre una planta de una o tres naves, y quizá proyectada por el hermano jesuita
Domingos Fernandes]97. Más adelante se encontraba la Lonja de los Banienes [quizá el
Bangaçal o almacén de alimentos importados], plena de mercadurías diversas procedentes
incluso del Chaul98 y la China. En la Plaza del Pelouriño Nuevo se asentaban los orfebres y
lapidarios que, a juicio del embajador, "aunque no tienen la inventiva que los oficiales de
Europa, labran con gran facilidad y presteza qualquiera joyas como le muestren el modelo o
muestra de donde proceda sacallo" [en 1535 el Pelourinho Velho y la Rua das Manilhas o dos
95.
Véase Judilea Nunes, Monuments in Old Goa, Panjim, 1979 y R. Moreira, "From Manueline...", pp. 403 y 405.
R. Moreira, "From Manueline...", p. 403.
97. R. Moreira, "From Manueline...", p. 405. Los planos citados en Jean Vallery-Radot, Le recueil de plans
d'édifices de la Compagnie de Jésus conservé a la Bibliothèque Nationale de Paris, Institutum Historicum S.I.,
Roma, 1960, p. 119, nº 451-453.
98. Sobre esta ciudad, Chaul de Cima, véase G. von Mitterwallner, Chaul. Eine unerforschet Stadt an der Westkust
Indies, Berlín, 1964, y el diseño del "Libro de Bocarro", en A Arquitectura militar na expansâo portuguesa,
Oporto, 1994, p. 142.
96.
90
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo - FAUUSP
Ourives -que unía aquella con San Paulo constituía el centro artesanal y mercantil de metales
preciosos de la ciudad].
Visitó también el convento de los agustinos de Nuestra Señora de Gracia, que encontró
"hermoso y vistoso", calificable por su fábrica como el segundo de la ciudad [su hoy
desaparecido templo fue construído entre 1597 y 1602, quizá sobre el modelo de Sâo Vicente
da Fora de Lisboa], y el convento de Santa Mónica -situados en un campo hacia los barrios de
Vangani, Panelín y Rabandar, al oeste del centro- que había fundado en fecha reciente el
arzobispo (1595-1611) y gobernador (1602-1609) Fray Aleixo de Meneses. Desde allí se
descendía a la Plaza del Rosario [con la parroquia homónima fundada en 1543, construída por
Tomás Fernandes en estilo ya renacentista, quizá a causa de los intereses del primer obispo de
Goa Francisco de Melo]99; se trataba de un campo que, según el citado mapa, agrupaba
también las iglesias de Santa Mónica, San Antonio [capilla fundada hacia 1543], Nuestra Señora
de Gracia y la Concepción; frente a esa plaza se hallaba el Noviciado de los jesuitas de San
Roque, "de fuerte y hermosa fábrica... [hecha] a imitación del de Lisboa"; el nuevo colegio de la
Compañía de Jesús era grande y suntuoso, "con muestra de un fuerte alcázar con cuatro torres
en los ángulos" y quedaba unido a la Casa Profesa por medio de un arco abovedado sobre la
calle que los separaba, via que terminaba en las Fuentes de Manganil. Esta había sido
construída -según rezaba una inscripción- cincuenta años antes por el virrey don Antonio de
Noroña y, con su frontispicio, cornisas y remates, era de "razonable architectura". En esta zona
también estaban ubicados los colegios de Santo Tomé, de los dominicos, y de San
Buenaventura, de frailes menores, que se encontraba en obras.
A partir de este momento, el embajador entró en una nueva serie de digresiones, unas referidas
a las usanzas de los nativos, como las sandalias que usaban las mujeres "a la manera en que las
pinturas o estatuas antiguas" y otros elementos de las vestimentas femeninas, a las que
censuraba el uso de ceñidos saris y unos corpiños que dejaban a la vista constantemente sus
"henchidos pechos" desnudos100; o a los palanquines y las costumbres de las mujeres101. Otras
tenían muy diferentes objetivos, como la ciudad de Bisnagar102, la lengua y alfabeto y algunas
creencias locales, como la de la "transmutación" que se creía "invención de Pitágoras" pero era
demostrable -según la opinión del fraile menor Fray Juan de San Matías- que tenía su origen en
los "Philósofos orientales"103; asimismo volvió su curiosidad hacia a la religión y los
conocimientos de astronomía y el calendario de los brahamanes indígenas, así como
nuevamente a sus vestidos, que comparó -ahora con la ayuda de la "Historia" (VIII) de Quinto
Curzio- con los de los antiguos de la época de Alejandro Magno104; a las costumbres, entre ellas
las penitenciales, y la religiosidad de los "bramenes", a los que consideraba a la postre "los más
relaxados y perdidos hombres del mundo", así como a la casi en desuso práctica del sati, ya
prohibida desde la época de don Afonso de Albuquerque, por la que las viudas eran
incineradas en la pira junto al cadáver sus maridos; por último, don García de Silva se refirió a
la causa de la enorme devoción de los indianos de Goa. Navegándose desde el paso de Daugín,
de la Madre de Dios o del Espíritu Santo, al otro lado del rio, se encontraba una peña de unas
99.
R. Moreira, "From Manueline...", p. 404.
Ms. 18217, f. 144.
101. Ms. 18217, fol. 145.
102. Ms. 18217, f. 134.
103. Ms. 18217, f. 135 vº.
104. Ms. 18217, f. 137.
100.
91
Cartografia e Cidade dos Renascimento e Barroco Íbero Americanos
dos picas de alto y que caía casi a plomo, frontera a la isla de Don Bernardo o punta de la Isla
de Iuna [Junga] la Mayor o San Esteban. A media altura de esta peña se encontraba una cueva
con una entrada de unos quince pies, con una losa derecha a manera de arquitrabe que sostenía
una especie de "falda de montera o sombrero", su "pagode" o templo de Narva; su interior era
muy alto, excavado sin artificio alguno en su piedra; detrás se encontraba otra pequeña cueva
cuadrada con un pequeño agujero que daría, según los gentiles, a una sima. Se trataba de un
santuario de todo el Indostán e incluso de creyentes del otro lado del rio Indo, visitado sobre
todo en la festividad de la Luna de Agosto y venerado por no haber sido "fabricado por manos
de hombres como los demás templos y pagodas de la India, que son infinitos, riquísimos y
sumptuosos, sino por la mente y sola voluntad divina". En su interior se adoraba una "figura
de culebra de oro, de aquella mortífera y venenosa especie que acá en la India llaman de capelo
los portugueses que en lengua canara llaman çoropo... pues creían que Dios les aparescía en
forma de culebra biva en aquella cueva"; era también un lugar de oráculo de sus sacerdotes,
como el de Delfos, y de perdón de culpas y pecados, a excepción de los hurtos, como si fuera
un "sancto jubileo". A pesar de los esfuerzos de los arzobispos de Goa, no se había podido
impedir por completo su culto, que se celebraba desde lejos, desde la Playa del Mar situada en
la Tierra Firme a una distancia de 500 pasos, donde habían labrado los gentiles cinco o seis
gradas de unos 100 pasos de longitud y donde se bañaban y lavaban en el agua del mar. A
pesar de la incomprensibilidad de sus ritos, el embajador demostró reiteradamente su asombro
ante la piedad de los hindúes y su placer ante la visión de sus ceremonias: "En dos años y
medio que me detuve en Goa, me hallé dos veces, y confieso que con mucho gusto y
curiosidad mía, a ver esta gran junta de gente"; en 1615 se había reunido una multitud de
15.000 personas, mísera y pobre, "con tan singulares y estrañas demostraciones de devoción
que, en comparación suya, parecía tibieza las que los cristianos tenemos en semejantes actos".
Las casas de Goa le interesaron también vivamente105; las más de ellas eran de buena fábrica y
capacidad de aposentos, incluso "mayores y más altos de los que comunmente se usan y
habitan en España con grandes ventanas y coredores por gozar a todas oras del aire sin el qual
se vive con gran molestia y trabaxo, o más propiamente hablando, es imposible vivir". Como la
ciudad era tan extendida, todas tenían grandes corrales y jardines con árboles, lo que hacía a las
casas muy difíciles de defender. Todas ellas, así como los templos, se encalaban por dentro y
fuera e incluso se daba de cal su pavimento, tanto en aposentos como varandas; también se
usaba en los suelos una costra gruesa de cal o -en los conventos y casas de gente que no fuera
muy pobre- una fina y blanca con una "compostura" de cáscaras de huevo, de tal forma que
parecen de mármol y las gradas de sus escalinatas de una sola pieza; de las conchas sacaban
también el material para las vidrieras -que engastaban en varillas de madera- de las ventanas,
corredores y varandas, mayores que en cualquier otra parte del mundo, y más claras que los
lienzos encerados de España a pesar de no ser diáfanas. También en este aspecto eran dignas
de señalarse algunas otras prácticas arquitectónicas, como la del aderezo de los suelos con
excrementos de buey "que hacía el pavimento más hermoso y apacible... con buen olor y
apazible vista" como demostraba su uso en el Colegio Real de los Reyes Magos de los
menores, situado junto a la fortaleza de Bardes106. A excepción de los templos y fortaleza,
105.
Ms. 18217, fol. 145.
Ms. 18217, f. 129. En este pasaje utilizó como fuente de sus conocimiento el texto de Diodoro Sículo para
identificar estas sandalias con el calzado usado por las tebanas y distinguirlo de los coturnos de las Ninfas o
"mujeres sucientas"; elogió estas sandalias, "elegante[s] y hermos[as] para las mugeres... de manera que con gracia
106.
92
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo - FAUUSP
como ya había señalado, Goa carecía de edificios públicos si se excluía la Casa de la
Inquisición, que de inmediato reconstruiría el maestro real Júlio Simâo en 1616107; era todavía
de "fábrica morisca" como antigua Casa del Çabayo [Sabaio] representada en la vista de las
"Civitates Orbis Terraum", y alta y grande, a la que se accedía gracias a muchas gradas, y que
tenía "magestad y apazible perspectiva"; sus ventanas eran similares a las que existían todavía
en algunas casas o fortalezas principales y antiguas en España; se demostraba en consecuencia,
según nuestro embajador, que los moros que habían llegado a la India eran los mismos que
habían conquistado Africa y España, "conservando desde entonces adonde quiera que están un
mesmo modo en sus edificios", de la misma manera que habían incluso conservado los mismos
trajes los moros de Granada hasta el momento de ser "expelidos", pocos años antes de su
partida de la península. Se encontraba esta Casa del Çabayo en la Plaza de Leilán [Leilâo], toda
rodeada de buenas casas y situada entre la Iglesia catedral y la Rua Derecha, la más frecuentada
de Goa y donde se celebraban los mercados y ferias, por lo que incluso era difícil "romper por
ella a pie ni a cavallo".
Con el regreso al centro de la Goa Dourada, don García daba por terminada su descripción.
Había intentado reflejar lo mejor posible sus impresiones sobre el enclave portugués en la
India y entender su variopinta naturaleza sin aspavientos que demostraran el asombro que la
realidad vista podía haberle producido; al revés, había intentado entender lo ajeno
apropiándose de ello con los instrumentos que su cultura seiscientista española le había
equipado: la Biblia en primer lugar; la cultura libresca sobre la Antigüedad clásica en segundo
puesto, de los textos de Arriano y Diodoro Sículo a los de Plutarco y Quinto Curzio que le
habían acompañado en su equipaje desde España, como único referente que vinculara el
presente goano con lo que concebía como original y radicalmente antiguo; por último, su
experiencia arquitectónica y, podríamos decir, antropológica, de la España de la segunda mitad
del siglo XVI, en la que todavía lo musulmán, lo morisco, había tenido un lugar en la realidad
material de todo el país y en la cultura popular de su Extremadura natal.
y venustad mostraban la mayor parte del pie", e incluso encontró una justificación bíblica para su empleo en el
"Libro de Esther".
107. R. Moreira, "From Manueline...", p. 405. No deja de ser extraño que precisamente en esta fecha, nada dijera
don García de Silva sobre el inicio de su remodelación.
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Architecture as Metaphor
Professor Joseph Rykwert
From Serlio’s time onwards there were five orders. Definitely. Yet neither Vitruvius nor
Alberti, the first major theorists of architecture, were absolute about the matter. In his third
and fourth books Vitruvius lists three genera of columns: Doric, Ionic and Corinthian. To
these he adds a Tuscanic dispositio as a less exalted kind of arrangement, while Alberti - in the
seventh chapter of his seventh book - specifies the same three main varieties of column, but
for his part adds to these an Italic capital which - he says - unites the best of both Corinthian
and Ionic; it is the kind later called ‘Composite’. In a monumental Vitruvius translationcommentary printed in Como in 1521, Cesare Cesariano provides the very first full-page
woodcut plate (LXII recto) of columns and he numbered six of them - sex generatione de
columne.
So it was Sebastiano Serlio who finally fixed the column varieties at five, and five they have
remained. His fourth (of seven) books was published in 1537, before all the other parts of his
great work; and his was also the first book explicitly to propose a method of proportioning
columns (and the cornices they supported) which explicitly offered architects and craftsmen a
summary of Vitruvius’ prescriptions checked against measurements yielded by the surveys of
ancient buildings. Although on the title-page of that book Serlio still calls them cinque maniere
de gli edifici, his turned out to be the first of very many ‘order books’, which - well into the
twentieth century, sometimes at the rate of two or three a year - offered more or less formulaic
directions for drawing the columns and their ornaments.
By the next generation there is no uncertainty. When Vignola published his Regola delli Cinque
Ordini in 1562/3 and Andrea Palladio his Quattro Libri in 1570, they are five, and they are
ordini and such they remain. Why was that ‘five’ so defined and so enduring?
Though the question may seem fatuous to some - now that the ‘five orders’ are taken for
granted, as a generalized commonplace - it was a real enough one in the sixteenth century,
which like the much earlier period, that from late antiquity to the high middle ages, was almost
obsessively concerned with number symbolism. And although the speculations on three (the
Trinity, first whole number) and four (seasons, elements, temperaments) are well-known, five
is less familiar: to those who investigated its hidden meaning, it is the number of coupling,
being the sum of the first even and therefore female number with the first odd, masculine one,
three - so that it becomes an emblem of marriage and of generation. And the symbol also of
another corporeal association, since bodily extremities were counted as five (two hands, two
feet, head) as were the fingers of one hand. And, most evidently, it is the number of the senses.
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Aristotle first summed the matter up as magisterially as might be expected in his De Anima: 108
the senses were five and there could not be any more. Of course, Aristotle’s assertion
inevitably invited variations and commentaries. One of the best known is that of the mystic
and theologian Alain de Lille (Alanus de Insulis, Doctor Universalis ca 1130-1200) whose verse
treatise on morals, Anticlaudianus, offers the image of Reason travelling through the cosmos
to discover its secrets on a chariot made by the seven arts, and this chariot is drawn by the five
horses of the senses. 109
The poem was occasionally illustrated and was part of the symbolic lore about a
correspondence between notion and number which occupied some of the best minds of his
time. These speculations were taken up with renewed vigour in the sixteenth century in Serlio’s
and Vignola’s lifetime. Two highly- respected authors provide examples of such thinking:
Cornelius Agrippa of Nettesheim in his de Occulta philosophia has much to say about the
numerus connubii 110, while a contemporary and equally popular book, De Subtilitate (perhaps
best translated as ‘on astuteness’) by the Lombard physician/astrologer/mathematician
Girolamo Cardano, devotes a great deal of attention to the particular interrelation of the five
senses111.
Until the number of the orders had finally been fixed at five, any close association of orders
with other quintuples could not enter such speculations. But once this happened, the corporeal
and tangible nature of the fivefold could be invoked to enliven what might be thought dry
formulae; or to put it another way - enclosing the orders in the fertile number five suggests
their generative character, their bodily nature.
The very prolific Johannes Vredeman de Vries (sometimes plain Hans Fridman Fries or Frisius
- the Freisian) published a number of splendidly flourished and calligraphed order books which
the engraver Heinrich Hondius reprinted - it seems very profitably - first in Dutch, then in
German; he also devised an emblem-series of the orders, all set in elaborate, pollarded and
gardened landscapes, and showed them as analogous to the times of day as well as the five ages
of man. Each age lasted 16 years: the delicacy of childhood was displayed by the Composite:
108.
Peri psychis/De Anima II 6 ff 418 a; the proof that there cannot be a sixth sense in III 1 424 b; The
possibility of a sixth or ‘common’ sense is much later.
109. F.J. Raby, A History of Christian-Latin Poetry, Oxford 1927. Pp. 298 f. E.R. Curtius, European Literature and
the Latin Middle Ages, New York 1953 pp.118 ff. On the five senses as horses, F. Mütherich in JWCI XVIII
(1955) pp. 140 ff.; and Elizabeth Sears, ‘Sensory Perception and its Metaphors’ in W.F.Bynum & Roy Porter,
Medicine and the Five Senses, Cambridge 1993 pp. 29 ff.
110. (Heinrich Cornelius Agrippa) Henrici Cornelii Agrippae ab Nettesheim Opera Leyden ND (ca 1600? The
dedication - presumably of the first printing -is dated 1531). Pp. 134 f ‘De quinario et eius scala’; on p. 289 he
also shows the human body in the pentacle.
111. Hieronymi Cardani Mediolanensis Medici, de Subtilitate Libri XXI, Lugduni (Lyon 1580 - the dedication is
dated Paris, 1552). Liber XIII starts, Aristotelianly, with a Demostratio quod non sint nisi quinque sensus, pp. 490
ff.
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La nature produit l’enfançon foible et tendre . . .
Jusques au seizieme an, comme il est incliné
Si nature y default, Dieu perfaict le peut render
and so through life, finishing in old age with gnarled Tuscan - but Vredeman added a sixth age
to the canonic five, though not another order, nor another garden (decrepitude was a
Breughelesque ruin in a wilderness) 112. It was as an appendix to the German printing of the
order collection, Architectura/ Die köstliche und Weitberumbte Khunst . . . in fünfferley
. . . Art der Edifitien . . . that Hondius engraved emblem drawings of the orders as five senses
by Paul Vredeman, son of the more famous Hans: from Tuscan sight, to Composite touch 113.
Suites of paintings depicting the five senses had become popular at this time. The French
painter-engraver, Abraham Bosse, did a particularly opulent series of them which he also
engraved 114. Yet Paul Vredeman’s may well be the first such ‘emblem’ suite of the five orders
and the five senses, as Luciano Migliaccio has pointed out in his essay, and Justus Sadeler, a
member of another engraving family, emulated them in turn.
By the later years of the sixteenth century there was already a growing number of order-books,
though two stood out as most authoritative. They were both produced by prolific and
powerful architects who had intimate contact with antique ruins. Quite why it is that Palladio’s
orders became the standard for the English-speaking world, while Vignola dominated most
Latin countries, especially France, is not evident, nor why the two books enjoyed similar
authority in Italy and in Germany 115. Dutch and French printings of them in any case seem to
have been as common as Italian ones, and although their formulae were even memorized, the
appetite for the printed versions never flagged; indeed a Bolognese publisher of Vignola’s
book thinks to justify his reprint by saying that he is working for posterity, since ‘more
architects of his time have its contents by heart than on paper’ 116. And Vignola’s book went
112.
Theatrum Vitae Humanae Aeneis Tabulis per Ioan. Phrys. Exaratum: Antwerpen, 1577.
This collection was first published in Dutch in 1606 and is based on Vredeman’s previous printings of single
‘orders’ (Das erst Buch Doric & Ionic, 1565, Das ander Buech Corinthian and Composite 1578 (perhaps also
1565). Tuschana separately also in1578. See Eric Forssman, Säule und Ornament, Stockholm 1956, pp. 156 ff.
114. On the prevalence of such series - which went on into the nineteenth century, see Sander Gilman, ‘Touch,
sexuality and disease’ W.F. Bynum & Roy Porter (1993, op.cit.), pp 198 ff.
115. Though Vignola’s authority in Latin countries did not go unchallenged: in 1650 Roland Fréart, Sieur de
Chambray published his very popular Parallèle de l’Architecture Antique avec la Moderne, which is in fact a
comparative order-book in which ancient examples are indeed compared with those of Palladio, Scamozzi,
Vignola, Serlio, Alberti and some others. It was taken up in England by the great diarist John Evelyn, who
provided a translation to which he added various other short works such Alberti’s de Statua, or Henry Wotton’s
Elements of Architecture. Chambray is explicit about Vignola’s status: Palladio is ‘without doubt the first of the
moderns’ and Scamozzi (though a bit dry and clumsy) open the series; Vignola and Serlio come second. Serlio
seems to have written, according to Fréart, for master-builders (pour les Maistres), Vignola for the young (pour
les jeuns gens) and so on. It is fair to say that Fréart’s book had more circulation in the English version than in
the original French.
116. ‘I presenti Architetti l’hanno piu impressa nella mente che nelle carte’, Gioseppo Longhi (later spelt Gioseffo),
Bologna 1635. This, like many other editions, is re-engraved; it adds the Michelangelo designs ( engraved by
Francesco Villamena, whose name seems omitted in later printings) first printed in the Roman edition of 1610. As
time went on and many more editions were made, the plates were always re-engraved.
113.
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through many translations - beside the Dutch, French, Spanish, Portuguese, there also one in
Russian. The original 32 plates were augmented in the second edition of 1572. By 1610 the
book was further enlarged by a suite of Michelangelo designs; and in 1617 another edition
carried Francesco Villamena’s collection of Vignola’s projects. With time, other engravings
were added or omitted and often yet others were just bound in with the original.
A neglected confirmation of Vignola’s overwhelming authority, even at the setting of the
Classical tradition, is shown by a minute appeal to him in what may be considered the last
summation, Jacques-François Blondel’s course of lectures delivered and published in the
second half of the eighteenth century. In discussing the proper proportioning of cornice
mouldings, he takes up the analogy of the Tuscan cornice section with the human profile - an
analogy which the sixteenth-century Spanish theorist Diego de Sagredo had based on the
intuition of the great quattrocento Sienese painter-engineer, Francesco di Giorgio 117. Unlike
his predecessors, Blondel used the analogy critically to demonstrate the superiority of Vignola’s
rule over those of his fellow-theorists. Palladio’s mouldings seemed discordant to Blondel : the
low rise of the drip-mould (larmier) is like the nose of a twelve-year old child, but it is
supported by an eighty-year-old ancient’s chin, while the cyma above has the forehead of a
fifty-year old; as for Scamozzi’s mouldings, it is easy to note that the lower part of this head is
clumsy and heavy, while the upper parts are too narrow. Only Vignola shows an agreeable
relation between forehead, nose and chin which gives the moulding a unified character quite
different from the two previous examples. And although Blondel allows that Palladio and
Scamozzi may be consulted for other parts of the column, it is Vignola who is asserted as the
unrivalled model. Nevertheless, Blondel warns his readers and listeners against a too literal
application of this example, and hints that the crowning cyma could be heightened to give the
whole cornice a heroic character, or else the drip might be lowered to suggest an aquiline nose
- all of which will determine the expression of such Doric mouldings.
Whoever bound together the plates that make up the Sao Paulo Vignola to offer a whole
variety of examples for emulation beside the quintessential orders must have been aware - as
were most of his contemporaries - of the power of number analogies; the lively association of
the five orders with the five senses restored the sensory body appeal to what may seem the
most abstract summary of all the order-books 118.
117. J.-F. Blondel, Cours d’Architecture . . . Vol. I, (Paris 1771) plates X,XI, XII and pp. 258 ff. J. Rykwert, The
Dancing Column, Cambridge Mass., 1996, pp. 56 ff.
118. On the recent interest in the five senses, see W.F.Bynum & Roy Porter (1993, op.cit.) and Michel Serres, Les
Cinque Sens, Paris 1998.
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